Guedes usará cessão onerosa como moeda de troca para reforma da previdência

Economista diz que acabou o "toma lá, dá cá", mas promete condicionar repasses a estados e municípios ao apoio no Congresso

O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, fala à imprensa após reunião com a Comissão Mista de Orçamento, na Câmara dos Deputados. / Foto: Agência Brasil
O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, fala à imprensa após reunião com a Comissão Mista de Orçamento, na Câmara dos Deputados. / Foto: Agência Brasil

Às vésperas de tomar posse como Ministro da Economia, Paulo Guedes fez hoje uma rápida apresentação de como deve funcionar a costura política do governo Bolsonaro com o Congresso nos primeiros meses de 2019. Em um almoço na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), o economista afirmou que vai usar o repasse de parte dos recursos da cessão onerosa como moeda de troca do apoio político à proposta da reforma da previdência no Parlamento.

Prometendo “voltar ao ataque no ano que vem” sobre a votação do PLC 78/2018, o texto da cessão onerosa que foi travado no Senado em novembro, Guedes deixou claro que espera que os governadores deem eles próprios a tão falada prensa em parlamentares para controlar os votos a favor do governo.

“Se não apoiar, vai lá pagar sua folha. Como ajudar quem não está me ajudando? Quero que dinheiro vá para Estados e municípios, mas me dê reforma primeiro”, disse o economista no encontro com industriais pouco depois de ter afirmado que “acabou o toma lá, dá cá” na relação de troca de favores entre o Executivo e o Legislativo.

Novo modelo de “Toma lá, dá cá”

A estratégia de Guedes é uma forma de contornar – com o esperado apoio de governadores – as dificuldades que o governo deve ter para votar – sem uma maioria segura – a pauta mais impopular no horizonte dos quatro anos do governo Bolsonaro: a reforma previdenciária.

Se tudo der certo no plano de Guedes, os governadores que encontrarão os caixas dos estados vazios a partir de janeiro e estarão sedentos por receber cerca de 10% a 15% dos ao menos R$ 100 bilhões estimados em receitas pelos leilões da cessão onerosa. Juntando a fome com a vontade de comer, os administradores dos 27 entes da federação devem pressionar os deputados federais e senadores de suas bases aliadas a votarem a favor da reforma da previdência, prolongando a lua de mel do mercado com o novo governo.

Com essa perspectiva, a decisão do TCU de não aprovar o leilão do excedente da cessão onerosa na semana passada foi música para os ouvidos do futuro ministro da Economia. Sem a chancela automática do tribunal, o governo volta ao plano inicial de aprovar o acordo para a venda das áreas pelo Senado.

Principal fonte de pressão a favor da cessão onerosa está na oposição

A estratégia de Guedes não é nova e se baseia em um antigo modelo de troca de favores do Congresso, onde o governo federal, sem segurança de sua capacidade de controle sobre os parlamentares, usa a promessa de favores a governadores para assegurar maioria em votações mais sensíveis.

Mas o quadro fiscal delicado de governadores em começo de mandato e a promessa de austeridade com os recursos federais – reforçada em quase todas as falas do próprio futuro ministro – devem reforçar a necessidade de diálogo dos gestores estaduais com o Planalto.

A visita há duas semanas de nove governadores do Nordeste e Note do país a Brasília serviu para demonstrar que os gestores dos estados estão de olho, sim, na expectativa de recursos extras criada com o impasse da cessão onerosa.

O irônico, porém, é que a caravana a Brasília contou sobretudo com políticos de partidos da oposição. Foi Wellington Dias, o governador reeleito do Piauí pelo PT, quem serviu de líder e porta-voz dos colegas.

Governadores dos estados mais pobres do país, onde partidos de esquerda saíram-se vencedores, estão preocupados com a perspectiva de a gestão do novo governo, tão direcionada à direita, fechar as portas de Brasília a seus estados e, claro, querem evitar o quadro de regressão das conquistas sociais e aumento das desigualdades apresentado pelo IBGE este mês.

Mas contra Guedes permanecem duas grandes dúvidas: Ainda é cedo para saber se esse quadro de penúria será suficiente para fazê-los apoiar a a reforma da previdência; e mais que isso, será preciso testar a capacidade de pressão de governadores sobre um Senado onde 85% das vagas em disputa foram renovadas em outubro, muitas delas com novos ocupantes que derrotaram velhos caciques da política nas urnas.

A partir de janeiro, 2/3 dos senadores que estarão em Brasília terão mandatos garantidos até 2026. Ao governo Bolsonaro e aos próprios governadores foi conferido um voto de confiança com a metade desse prazo. A forma como presidente, governadores e senadores estarão se relacionando ao final desse prazo dependerá também da capacidade do estreante Paulo Guedes de puxar a corda sem arrebentá-la.