BRASÍLIA — Um conjunto de entidades do setor elétrico, formado por geradores, distribuidores e consumidores, enviou uma carta conjunta (.pdf) ao Congresso Nacional na qual pedem a contribuição da mini e micro geração distribuída (MMGD) nos custos da rede.
Dentre esses custos, o principal deles é o curtailment (cortes na geração), prática que atinge majoritariamente os geradores de energia renovável no Nordeste.
O pedido aos parlamentares é que a MP 1304, da reforma do setor elétrico, inclua a MMGD de forma proporcional para o “equilíbrio técnico e econômico do setor”, participando dos custos que decorrem de seu uso da rede e da necessidade de suporte sistêmico.
A comissão mista da MP 1304, relatada pelo senador Eduardo Braga (MDB/AM) e presidida pelo deputado Fernando Filho (União/PE), se reúne nesta terça-feira (28/10) para a apresentação do relatório.
O documento assinado por Abradee, Abeeólica, Abrage e Abrace, entre outras, sustenta que o setor elétrico brasileiro vive um momento decisivo, que combina a rápida expansão da geração distribuída, os desafios de coordenação do sistema e a ausência de instrumentos adequados de compensação aos geradores.
Este cenário impõe ao país, na visão das entidades, um dever de correções urgentes, sob pena de comprometer a previsibilidade dos investimentos e a estabilidade do Sistema Interligado Nacional (SIN).
“Nesse contexto, a micro e minigeração distribuída (MMGD), embora relevante como vetor de diversificação tecnológica e de engajamento social, não é autônoma, pois utiliza a mesma infraestrutura física e os mesmos mecanismos de coordenação e custeio que sustentam o funcionamento do sistema”, diz a carta.
E completa defendendo a “adequada valoração” dos custos sistêmicos da MMGD como essencial para uma expansão equilibrada, “sem transferir encargos indevidos aos consumidores”.
A MMGD ultrapassa os 43 GW de potência instalada e deve alcançar os 58 GW até 2029.
Esse crescimento acelerado tem alterado o balanço carga-geração e contribuído para situações de sobreoferta diurna nas quais o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) precisa reduzir a geração centralizada para preservar a estabilidade do sistema.
As associações mencionam dados do ONS que indicam que o SIN se aproxima de um limiar crítico de segurança operativa, com cortes de geração que já ultrapassam os 20 GW em determinados períodos do dia e risco crescente de instabilidade de frequência e colapso de tensão.
“Quando o crescimento da geração distribuída não é acompanhado de mecanismos adequados de coordenação e sinalização econômica, os ganhos locais se convertem em distorções tarifárias e operacionais, com impactos crescentes sobre a base remanescente de consumidores e sobre encargos setoriais”, diz a carta enviada aos senadores.
O grupo avalia que os benefícios tradicionalmente associados à MMGD, como a redução de perdas, alívio da rede, postergação de investimentos e mitigação ambiental tendem a reduzir à medida que o segmento ganha proporção na matriz elétrica.
Prazo curto para tratar de cortes de geração
A MP perde a validade no dia 7 de novembro, prazo considerado curto para tratar do problema dos cortes de geração por algumas organizações do setor elétrico.
Na sexta (24/10), o Fórum das Associações do Setor Elétrico (FASE) entregou ao gabinete de Braga um documento com 28 propostas com apoio superior a 60% entre as 30 entidades que compõem o grupo — embora nem todas assinem o relatório (.pdf).
O curtailment é um tema que o grupo indica que precisa de mais tempo para discussão, inclusive considerando debates em andamento na Aneel.
“O tema ‘Curtailment’ teve as propostas apresentadas rejeitadas em bloco, sobretudo
pela necessidade de amadurecimento e fundamentação técnica das redações
legislativas sugeridas”, diz o documento.
“O FASE defende que seja buscada uma solução regulatória célere e consistente, dada a urgência e a relevância do tema. Todavia, reconhece e confia na atuação das instâncias competentes, notadamente Aneel e CMSE, que já conduzem grupos de trabalho e consultas públicas específicas voltadas à consolidação de um tratamento técnico e normativo adequado”, completa.
Ainda assim, o grupo indica que qualquer que seja a proposta normativa sobre o tema, deve ter como princípios a transparência na classificação e motivação dos cortes de geração; definição criteriosa das fontes incluídas em eventual rateio dos custos e mecanismos adequados de ressarcimento aos agentes afetados.
Fazenda defende revisão de benefícios
Uma nota informativa (.pdf) do Ministério da Fazenda sobre as MPs 1300 e 1304 defende a revisão de incentivos ao desenvolvimento das tecnologias de geração centralizada e distribuída, entre eles a antecipação do fim do desconto no fio da MMGD.
A pasta manifesta apoio a emendas que propõem antecipar o cronograma da lei 14.300/2022, sob a justificativa de justiça tarifária.
“Subsídios cruzados e transferências de renda injustificáveis devem ser revistos (…) de modo que ‘os moradores da cobertura passem a contribuir com o condomínio’ e os mais pobres não arquem sozinhos com os custos de rede de distribuição que atende a todos”, diz a nota.
Uma das emendas que a Fazenda defende avançar é a do relator para equiparar MMGD1 e 2 à MMGD3 a partir de 2026, quando esses geradores passam a pagar por 60% dos custos de rede.
Ou então, alternativamente, a emenda 114 do deputado Reinhold Stephanes (PSD/PR), que altera o marco legal da Micro e Mini Geração Distribuída para isentar a MMGD1 dos custos de rede até 2030 (atualmente a isenção vai até 2045) e antecipar o cronograma de isenção de MMGD3 em um ano.
Neste caso, a MMGD3 contribuiria com 75% dos custos em 2026 e 100% em 2028.
