RIO – A Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp) colocou em consulta pública um conjunto de propostas de mudanças nas regras do mercado livre de gás natural.
Em jogo, está a revisão da Deliberação Arsesp 1.061/2020. Dentre as novidades, estão a flexibilização de limites que visavam a impedir a concentração de mercado; novas regras para o consumidor parcialmente livre; e a simplificação de processos.
As propostas foram apresentadas pela agência após um período de consulta prévia ao mercado, entre agosto e setembro, por meio de tomada pública. Agora, as sugestões ficam abertas a contribuições até 14 de novembro.
Ao propor as mudanças, o regulador paulista justificou que o mercado livre não se desenvolveu como o esperado ante a escassez de ofertantes e dificuldades de acesso à infraestrutura.
Em São Paulo, segundo a Arsesp, há 30 outorgas de comercialização, mas apenas dois usuários livres e dois autoprodutores – e um deles usufrui de uma TUSD-E, a tarifa de uso do sistema de distribuição específica e dedicada.
O que muda
Sem limites para concentração de mercado
A agência sugere acabar com a regra atual que considera como infração à ordem econômica o exercício da atividade de comercialização por um agente – ou grupo econômico – que controle mais do que 20% do volume de gás vendido no mercado livre de São Paulo.
Com isso, será derrubada também a regra que prevê, nesses casos, que as comercializadoras devem se desfazer de sua participação adicional aos 20% fixados como teto.
A Arsesp alega que o mercado livre ainda é muito incipiente e qualquer comercializador poderá deter inicialmente uma parcela relevante do mercado. O regulador, contudo, destaca que a “exclusão não exime o enfretamento do problema da concentração pelas agências federais e estaduais”.
A proposta é preservar o trecho da regulação atual que dá à Arsesp o poder de aplicar a medida acautelatória de suspensão ou a decisão definitiva de cancelamento da autorização para a atividade de comercialização ao agente que eventualmente infringir a ordem econômica.
A Arsesp destaca ainda que a implementação de um programa de desconcentração de mercado (gas release) pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e a realização de chamadas públicas periódicas pelas distribuidoras, para compra de gás para seus respectivos mercados regulados, são fundamentais para fomentar a diversificação de ofertantes.
Durante a tomada pública de contribuições, houve reação de parte da indústria sobre essa flexibilização. A Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace) chegou a recomendar a manutenção dos limites – e sua redução para 10% – por entender que eles são saudáveis para se evitar a formação de oligopólios e garantir a livre concorrência.
Simplificação da outorga
A Arsesp propõe reduzir, de 12 para 4, o número de requisitos exigidos no processo de outorga de comercialização – além da autorização emitida pela ANP. O agente, por exemplo, deixará de ser obrigado a comprovar sede ou filial estabelecida em São Paulo.
A Arsesp manteve, contudo, a demonstração de capital social mínimo integralizado ou de patrimônio líquido mínimo no valor de R$ 1 milhão, sob a justificativa de que o limite, no atual grau de maturidade do mercado livre, “é razoável e adequado” por filtrar, em alguma medida, agentes sem capacidade financeira.
Usuário parcialmente livre por tempo indeterminado
O regulador sugere acabar com a regra atual que obriga o usuário parcialmente livre a migrar, até novembro de 2025, totalmente para o mercado livre.
A agência argumenta que a permanência da figura do usuário parcialmente livre, por tempo indeterminado, é importante para aumento da oferta de novos supridores – sobretudo biometano, já que pode não haver fornecedor para a quantidade total que o usuário necessita.
Fim de distorção nas tarifas
Além disso, o usuário parcialmente livre deverá remunerar a concessionária pelo serviço de distribuição do volume total que passa pelo gasoduto – e não apenas o volume contratado no mercado cativo.
A agência entende que, caso contrário, se criaria uma distorção que elevaria o custo médio da distribuição para o usuário parcialmente livre em questão. Isso porque a margem e a TUSD (a tarifa de uso do sistema) são decrescentes – ou seja, quanto maior o consumo, menor o valor médio.
“Dessa forma, se o volume consumido for divido em duas parcelas (livre e cativo) para alocação na estrutura tarifária, o custo médio de distribuição do consumidor parcialmente livre será maior quando comparado com o consumidor integralmente cativo ou totalmente livre, criando um desincentivo”, defende a Arsesp, na nota técnica.
Menos prazo para retorno ao ambiente regulado
A Arsesp sugere que a concessionária seja obrigada em até três meses – e não mais dois anos – a atender ao pedido do usuário livre para retorno ao mercado regulado – ressalvados os casos em que houver indisponibilidade técnica contratual de atendimento. O prazo anterior, segundo o regulador, foi considerado longo.
Fim de exigência de contratos de compra e venda
A Arsesp propôs acabar com a exigência de apresentação, ao regulador, dos contratos de compra e venda celebrados no mercado livre.
Alega, para isso, que os acordos já são submetidos à ANP e que se tratam de questões comerciais e concorrenciais definidas diretamente entre as partes envolvidas; e que as regras atuais não trazem, necessariamente, garantia de lastro – já que o comercializador pode firmar contratos para atendimento simultâneo em diversos estados não fiscalizados pela agência paulista.
Nova regra para qualidade do gás
A Arsesp permitirá que o certificado de qualidade do gás natural possa ser apresentado diretamente pelo transportador (ou pelo produtor, no caso do biometano) indicado pelo comercializador (ou consumidor livre). Pela regra atual, cabe ao comercializador apresentar à distribuidora, diariamente, o relatório certificado sobre as especificações do gás exigidas pela ANP.