Conteúdo local volta ao Congresso com proposta do governo

Setor naval e de engenharia quer mais conteúdo local e redução de ociosidade de estaleiros em retorno da discussão ao Congresso

Plataformas de petróleo, gás natural e refino vão aquecer estaleiros e indústria no Brasil. Na imagem: Dois trabalhadores serram vigas de ferro (com macacão azul, capacete amarelo, luvas e óculos de proteção), em canteiro de obra no Estaleiro Rio Grande, da Ecovix; ao fundo, grande estrutura metálica em construção (Foto: Stéferson Faria/Agência Petrobras)
Obra no Estaleiro Rio Grande, da Ecovix (Foto: Stéferson Faria/Agência Petrobras)

BRASÍLIA – A proposta de mudanças nas regras de conteúdo local encaminhada pelo governo Lula à Câmara dos Deputados agradou a indústria e o setor de engenharia naval. 

O PL 3337/2024 autoriza a transferência de excedentes entre contratos para a exploração e produção de petróleo e gás natural. E com isso, o tema volta para as mãos de deputados e senadores três meses após uma proposta entrar no Mover, programa para indústria automotiva. Na ocasião, o Senado aprovou o programa mas rejeitou a emenda sobre conteúdo local.

Organizações empresariais como a Abemi (engenharia industrial), Abimaq (indústria de máquinas e equipamentos) e Sinaval (estaleiros) vêm apresentando propostas aos ministérios e Minas e Energia (MME), Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e Casa Civil, pedindo previsibilidade da demanda com a realização de novos leilões.

Outro pleito defendido pelas entidades é que seja fixado, para plataformas de petróleo, o conteúdo local mínimo em três grandes grupos: engenharia, equipamentos e materiais.

A pauta das associações inclui a criação de um novo fundo garantidor para a construção naval offshore, além do estabelecimento de um novo modelo de contratação, com concorrências separadas para casco, topsides – parte da plataforma onde estão os equipamentos  – e integração.

O presidente da Abemi, Joaquim Maia, disse à eixos acreditar que esse mercado pode decolar se tiver um conteúdo local mínimo para dar segurança aos supridores de bens e serviços.

“Seja para onshore, seja para offshore, o conteúdo local tem que ser colocado em lei. Essa é a nossa posição: previsibilidade, segurança jurídica e possibilitar que os investidores invistam tanto na infraestrutura quanto na participação acionária dessa infraestrutura”, afirmou Maia.

No radar do setor está a possibilidade de contabilizar a contratação de bens e serviços para projetos de E&P no exterior.

“É um pleito nosso. Ninguém consegue exportar bens e serviços se não tiver uma demanda local para isso. A Noruega fez uso dessa obrigatoriedade no Mar do Norte e hoje são dominantes no desenvolvimento offshore no mundo inteiro”, comentou.

Ele citou as oportunidades na vizinha Guiana e no continente africano como possibilidades para expandir a colaboração brasileira no mercado global.

“Se fizer a engenharia básica e de detalhamento no Brasil, a gente especifica os equipamentos nacionais. É o que se faz quando encomenda um FPSO na Ásia. A Petrobras contratou cinco plataformas do mesmo grupo de Singapura, ao custo total de US$ 20 bilhões”, disse.

A opção pela produção nacional de módulos, segundo Maia, reduziria custos e prazos. “Hoje temos nove canteiros mapeados pela Petrobras com 80% de ociosidade”.

PL do governo privilegia flexibilidade

Uma das justificativas apresentadas pelo MME no envio do PL à Câmara é a necessidade de permitir a transferência de excedentes de conteúdo local entre contratos de concessão e partilha de produção vigentes. O argumento é que isso tem o potencial de conferir maior flexibilidade às decisões de investimentos e incentivar as companhias petrolíferas a realizarem investimentos em bens e serviços nacionais, ao invés de pagar multas pelo descumprimento de exigência contratual.

O governo quer urgência na aprovação, pois há expectativa de contratações iminentes para construção de plataformas de produção de petróleo e gás natural em campos explorados em contratos sem previsão de conteúdo local, a exemplo de Marlim Leste e Marlim Sul, na Bacia de Campos, cuja licitação está prevista para ocorrer em setembro.

De acordo com cálculos da Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (SNPGB) do MME, estima-se que a realização de 20% de conteúdo local no projeto-base de construção de cada plataforma de produção traria US$ 650 milhões de investimentos nos primeiros dois anos, gerando aproximadamente 13 mil empregos diretos e indiretos.

Setor naval fala em perdas bilionárias

O Sinaval alega que a redução dos índices nos últimos anos representam uma perda de R$ 32 bilhões anualmente à economia nacional.

Para o sindicato, o cenário de instabilidade jurídica, baixa previsibilidade e constantes mudanças nas regras trouxeram prejuízos para a indústria local.

A leitura da entidade é que a redução drástica dos percentuais de conteúdo local pelo CNPE em 2017 e a edição da resolução 726/2018 pela ANP – que permitiu o adiamento das cláusulas de conteúdo local – alteraram o cenário competitivo, prejudicando ainda mais os fornecedores nacionais.

Encomendas da Transpetro

A Câmara Setorial de Equipamentos Navais e Offshore (CSENO) acredita que o novo ciclo de encomendas da Transpetro pode representar uma revitalização significativa para a indústria naval brasileira.

O programa de renovação da frota da empresa prevê embarcações mais sustentáveis e com menos emissões de CO2. O edital das quatro primeiras – de 25 embarcações – estabeleceu especificações técnicas para incorporação de um pacote de equipamentos mais eficientes em termos de consumo, com a possibilidade de utilização de combustíveis alternativos.