Opinião

A linha tênue das junior oils

A confirmação de uma reserva rica em hidrocarbonetos pode fazer com que o valor das ações de uma junior oil dispare, mas, ao contrário, um poço se revelando seco pode representar um golpe extremamente duro, escrevem os advogados do Campos Mello

Bombas cavalos-de-pau (pumpjacks) para exploração onshore de petróleo, com céu azul ao fundo (Foto Brigitte Werner/Pixabay)
Bombas cavalos-de-pau (pumpjacks) para exploração onshore de petróleo (Foto Brigitte Werner/Pixabay)

Estratégia firme, baixa alavancagem e uma gestão de riscos extremamente eficaz. Esses são requisitos para que junior oils — petroleiras independentes, de menor porte, especializadas na recuperação de poços — tracem um caminho de êxito no mercado brasileiro.

A operação dessas empresas requer custos baixos, o que se torna um desafio, sobretudo diante dos aumentos dos preços de equipamentos e insumos de fornecedores americanos por conta das tarifas impostas pelos Estados Unidos, assim como pelo encarecimento das operações causados pela SELIC a 15% ao ano, com possíveis acenos de aumento demonstrados pelo Copom na última reunião do dia 17 de setembro.

Despontadas no Brasil, principalmente, com o desinvestimento da Petrobras em campos maduros a partir de 2015, as junior oils foram bastante favorecidas pelos avanços regulatórios relacionados à exploração desses campos.

A Oferta Permanente, por exemplo, facilitou estudos e análises de novos projetos, enquanto as Resoluções 749/2018 e 853/2021 da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), reduziram os royalties.

Depois, a resolução ANP nº 877/ 2022 trouxe novos incentivos e a resolução ANP nº 785/2019 a possibilidade de as petroleiras utilizarem as reservas como garantia para empréstimos (Reserve Based Lending) — uma forma de as junior oils conseguirem financiamento para suas operações.

Com isso, as petroleiras independentes impactaram fortemente o setor. Em 2022, pagaram R$ 1 bilhão em royalties, geraram mais de 315 mil empregos e foram responsáveis por cerca de 4% da produção nacional (aproximadamente 160 mil barris por dia). Sem falar no fato de terem criado um ambiente de negócios diversificado e competitivo com incentivo às cadeias produtivas.

O entusiasmo das junior oils foi evidenciado em seus planos de investimento. Relatório da Wood Mackenzie, de 2023, apontava a intenção dessas empresas de investir US$ 10 bilhões e chegar a produzir 485 mil barris por dia em cinco anos.

Mas, com a decisão da Petrobras de encerrar o desinvestimento em campo maduros, os rumos mudaram e as operadoras independentes de petróleo precisaram recorrer a alternativas para manter seu crescimento. A partir de então, foi iniciado o movimento de fusões e aquisições, como a da Enauta com a 3R, que fez surgir, em 2024, a Brava Energia

A nova petroleira detém a qualificação de operadora “A” perante a ANP, um forte diferencial estratégico que habilita a empresa a operar campos de óleo e gás em áreas terrestres e em mar, inclusive em águas profundas e ultra profundas, como os do pré-sal.

A Brava detém 80% de participação e opera o campo de Atlanta, na Bacia de Campos, o primeiro em águas profundas a ser desenvolvido do início ao fim por uma empresa independente brasileira. 

Para dar conta desse desafio, a empresa tem conduzido um rigoroso processo de liability management — gestão de passivos que visa preservar a liquidez do negócio e facilitar a concessão de empréstimos mantendo, ao mesmo tempo, balanços patrimoniais saudáveis.

Recentemente, por exemplo, foram liquidados recebíveis no valor de US$ 260 milhões para o financiamento do projeto Atlanta. O objetivo da transação, segundo a empresa, foi otimizar a estrutura de capital por meio da redução da alavancagem e contribuir com a geração de caixa.

Redução de alavancagem, seja com a venda de ativos, recebimento de dívidas ou aumento do capital próprio, é um caminho a ser seguido pelas empresas que pretendem se manter nesse mercado de grande volatilidade.

A confirmação de uma reserva rica em hidrocarbonetos pode fazer com que o valor das ações de uma junior oil dispare, mas, ao contrário, um poço se revelando seco pode representar um golpe extremamente duro. 

Além da redução de alavancagem, a gestão de riscos nas junior oils passa por mecanismos como a diversificação de portfólio de ativos, a implementação de contratos de hedge para mitigar a volatilidade dos preços do barril, e o planejamento detalhado de Capex e Opex com margens de segurança.

Iniciativas de gestão financeira recomendáveis incluem a busca por linhas de financiamento atreladas a resultados operacionais, a securitização de recebíveis de longo prazo, e a adoção de práticas rígidas de compliance regulatório, que reduzem custos indiretos e ampliam a confiança de investidores e credores.

Outro caminho estratégico é a diversificação para o mercado de gás natural, especialmente diante da abertura regulatória e dos leilões previstos para 2026. O gás representa não apenas uma fonte estável de receita, mas uma ponte para a transição energética, o que fortalece a imagem institucional e abre novas oportunidades de parcerias comerciais.

No médio prazo, iniciativas como joint ventures em projetos de infraestrutura, acordos de partilha de risco e investimentos em tecnologia para aumentar o fator de recuperação dos campos maduros podem contribuir para elevar a resiliência das companhias.

Enfrentar o cenário de alta volatilidade do mercado de óleo e gás passa necessariamente por iniciativas de disciplina financeira, diversificação de ativos e foco em eficiência operacional, que, em conjunto, asseguram competitividade sustentável às petroleiras independentes no Brasil.

Em função da volatilidade do Brasil, todo cuidado é pouco para essas petroleiras independentes e de menor porte. Como disse Warren Buffett, lendário investidor e profundo conhecedor de petroleiras de longuíssima data, “você só descobre quem está nadando pelado quando a maré é baixa.” Ou seja, na linguagem financeira, quando a empresa está super alavancada e o castelo de cartas desaba, é possível perceber nitidamente quem sobreviverá à variação das marés.


Guilherme Guerra D’ Arriaga Schmidt é sócio da área de Energia e Recursos Naturais do Campos Mello Advogados.

Theo de Miranda é associado do Campos Mello Advogados na área de Energia e Recursos Naturais.

Endrick Martins é estagiário na área de Energia e Recursos Naturais do Campos Mello Advogados.

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