A produção de petróleo e gás por empresas multinacionais no pré-sal tem crescido continuamente. A ampliação da participação dessas empresas em consórcios com a Petrobras, os desinvestimentos realizados pela estatal e a frequência de leilões são fatores centrais nesse processo.
Apesar de contribuir com o aumento da produção, o desafio consiste em equilibrar as estratégias particulares dessas petroleiras com o desenvolvimento econômico e social do país, bem como com a segurança energética nacional.
Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a produção de óleo e gás do pré-sal no primeiro semestre de 2025 atingiu uma média de 3,7 milhões de barris de óleo equivalente por dia (MMboe/d), representando cerca de 79% da produção nacional nesse período.
A Petrobras, como concessionária, foi responsável por 2,5 MMboe/d (67%), enquanto as multinacionais, privadas e estatais, contribuíram com cerca de 33% da produção (1,2 MMboe/d).
A ascensão da produção do pré-sal está acompanhada de um crescimento sistemático da participação de multinacionais nessa produção e queda na participação da Petrobras.
Entre 2015 e 2025, a produção da estatal no pré-sal aumentou a uma taxa anual de 13,8%, enquanto as multinacionais tiveram um crescimento de 16,3% no mesmo período, como demonstrado no gráfico a seguir.
Oito multinacionais produzem atualmente no pré-sal, segundo a ANP, além disso Chevron, BP, Equinor entre outras, possuem ativos em fase exploratória ou em desenvolvimento.
Considerando somente os contratos de partilha, 15 petroleiras atuam no pré-sal, segundo a PPSA, sendo 14 multinacionais e somente a Petrobras como companhia brasileira. O grande número de companhias multinacionais demonstra a relevância da região no contexto energético internacional.
A Shell foi a maior produtora estrangeira no pré-sal, com 516,2 mil boe/d, representando aproximadamente 43% da produção das multinacionais na região no primeiro semestre de 2025. Logo após, aparece a TotalEnergies (240,2 mil boe/d), a CNOOC (134,5 mil boe/d) e a Petrogal (Galp) (122,7 mil boe/d). A produção no pré-sal é de grande importância para essas empresas.
Quase toda a produção da Galp atualmente provém de seus ativos no pré-sal. Em 2024, a produção na região representou pouco mais de 8% da produção da TotalEnergies. Logo, trata-se de ativos estratégicos para essas companhias.
O aumento da participação das multinacionais na produção está relacionado à expansão de sua atuação em consórcios com a Petrobras. Esse modelo de operação corresponde, atualmente, a aproximadamente metade dos campos em produção no pré-sal.
Essa dinâmica demonstra que toda a regulação desenvolvida para a região, visando maior atuação do Estado, não inviabilizou a participação de petroleiras multinacionais privadas e estatais.
- Nos campos em que a Petrobras não possui parceiros, predominam aqueles sob regime de cessão onerosa e os campos com produção no pós-sal. No entanto, é importante destacar que, nos campos de alta produtividade, observa-se a presença das multinacionais em consórcios com a estatal, como é o caso de Tupi, Mero, Sapinhoá, a parcela excedente da cessão onerosa de Búzios e Sépia, entre outros.
Os desinvestimentos da Petrobras também contribuíram para o aumento da produção das multinacionais.
Entre 2018 e 2021, a estatal vendeu sua participação de 45% no campo de Lapa para a TotalEnergies, tornando-o o primeiro campo do pré-sal não operado pela Petrobras. Em 2017, a brasileira vendeu, também para a TotalEnergies, 22,5% dos direitos do bloco BM-S-11A, onde foram desenvolvidos os campos Sururu, Berbigão e Oeste de Atapu.
Acrescenta-se o bloco BM-S-8, vendido para a Equinor em 2016, que se encontra em fase de desenvolvimento. Esses desinvestimentos representam uma reconfiguração do setor de exploração e produção que possibilitou às multinacionais expandirem suas operações no pré-sal.
A frequência dos leilões promovidos pela ANP e a mudança no regime de partilha em 2016 — que eliminou a obrigatoriedade da Petrobras atuar como operadora no pré-sal — também influenciaram o crescimento da participação das multinacionais no pré-sal. Entre 2017 e 2023, foram realizados nove leilões sob o regime de partilha no pré-sal.
Somente em 2017 e 2018, ocorreram quatro, nos quais 13 blocos foram arrematados, sendo que em apenas cinco deles a Petrobras não participou. O elevado interesse das multinacionais indica a possibilidade de aumento da produção por meio de avanços exploratórios e novas descobertas no médio e longo prazo.
Além disso, dois leilões relacionados aos volumes excedentes da cessão onerosa sob partilha resultaram na venda de quatro campos em fase de produção, dos quais três — Búzios, Sépia e Atapu — passaram a ter participação de multinacionais ao lado da Petrobras, levando a um aumento imediato na produção dessas empresas no pré-sal.
A expectativa é que a participação das multinacionais na produção aumente no curto prazo, impulsionada pelo desenvolvimento dos projetos de Gato do Mato, operado pela Shell, e Bacalhau operado pela Equinor.
No médio e longo prazo, os blocos exploratórios sob gestão de multinacionais e em consórcios com a Petrobras podem gerar novas descobertas, elevando ou mantendo os níveis da produção atual.
Além disso, em outubro, a ANP anunciou a oferta de 13 blocos no 3º Ciclo de Oferta Permanente sob partilha, ampliando a possibilidade de expansão das operações das multinacionais, inclusive na condição de operadoras, uma vez que a Petrobras manifestou interesse em apenas um dos blocos.
A alta produtividade, o petróleo leve e a baixa pegada de carbono em relação à média global consolidam o pré-sal como uma região de destaque tanto no cenário nacional quanto internacional.
Contudo, o aumento da produção pelas multinacionais na área não tem sido acompanhado de investimentos em outros setores estratégicos essenciais à autossuficiência, tais como refino e fertilizantes, o que limita os efeitos econômicos e sociais dessa atuação no país.
Tal dinâmica tende a direcionar grande parte da produção para o mercado externo, mantendo o Brasil dependente da importação de derivados. Essa dependência, por sua vez, torna o país vulnerável às tensões e instabilidades do cenário geopolítico global, podendo representar riscos ao abastecimento e à segurança energética nacional.
Francismar Ferreira é doutor em Geografia e pesquisador da área de Exploração e Produção do Instituto Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep).