BRASÍLIA — A ONG Arayara pediu à Justiça Federal nesta terça (27/9) a concessão de medida cautelar para suspender o leilão das térmicas provenientes da lei de privatização da Eletrobras, marcado para sexta (30/9).
Caso o certame seja mantido, a organização pede um inventário de emissões de gases de efeito estufa de todas as termelétricas movidas a combustíveis fósseis do leilão, bem como o impacto das emissões no cumprimento das NDCs brasileiras.
A ação é de autoria da Arayara, mas a entidade espera que outras associações da Coalizão Gás e Energia entrem posteriormente como amicus curiae do processo.
Formada por ClimaInfo, Instituto Internacional Arayara, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) e Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a coalizão defende a exclusão do uso do gás como fonte na matriz energética brasileira até 2050.
A ação civil pública ajuizada hoje pede ainda o cancelamento do leilão organizado pela Aneel e a anulação dos seus efeitos — com determinação de que o governo não possa realizar um novo leilão de reserva de capacidade nos mesmos moldes para contratação de térmicas a gás.
A entidade argumenta, entre outros pontos, que a legislação proveniente da privatização da Eletrobras contém artigos inconstitucionais; que a realização do leilão poderá aumentar em até 10% as contas de luz; e que a contratação das térmicas pode diminuir a participação de fontes renováveis no sistema elétrico brasileiro.
Este é o primeiro leilão das termelétricas compulsórias previstas na lei de privatização da Eletrobras. Sancionada em julho, a legislação prevê a contratação de 8 GW de térmicas a gás, boa parte em regiões sem acesso ao combustível.
Ao todo, 37 projetos foram cadastrados na licitação, totalizando cerca de 12 GW. A licitação se dedicará a contratar 1 GW na região Norte, para início de suprimento em 31 de dezembro de 2026; e 300 MW no Maranhão e 700 MW no Piauí, para 31 de dezembro de 2027.
Adição de custos
Uma simulação feita pelo Idec aponta que o custo de operação e manutenção dessas usinas térmicas acrescentará R$111 bilhões às contas de energia entre 2022 e 2036, em comparação ao cenário de referência que consta do plano decenal de energia (PDE 2031) do governo federal.
Como consequência, o custo médio da energia subiria em 70%, de R$109/MWh em um cenário de referência para R$186/MWh em um cenário com as térmicas inflexíveis.
Outra consequência da obrigatoriedade da contratação de usinas termelétricas inflexíveis é a redução do espaço para fontes renováveis mais econômicas como solar e eólica, e até de operação do parque já instalado.
O próprio PDE 2031 traz esse alerta.
No cenário de referência elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), as políticas atuais levarão à “substituição de parte da expansão indicativa de eólicas e solares centralizadas por termelétricas com geração compulsória movidas a gás natural, carvão mineral e nuclear”.
“Essa mudança de composição da matriz resulta em um maior custo de operação para o sistema”, diz a EPE.
A estimativa da empresa estatal é que quase 60% do total de expansão da capacidade instalada em 2031 seja de usinas a gás natural, carvão mineral e nuclear.
Até 2027, o PDE não prevê expansão da geração solar e eólica. Em compensação, a geração térmica a gás natural flexível e inflexível projetada soma 14,3 GW de expansão no mesmo período.