RIO — A Petrobras anunciou na manhã desta terça-feira (16/5) uma nova política para os preços da gasolina e do diesel que aumenta a complexidade dos cálculos e garante à companhia maior poder na definição das cotações internas, segundo especialistas. De acordo com o presidente da companhia, Jean Paul Prates a nova fórmula consolida, de fato, o “abrasileiramento” dos preços, conforme defendido pelo presidente Lula.
Em seguida, a empresa já anunciou uma redução nas cotações do diesel e da gasolina. A gasolina terá uma queda de 12,5%, redução que será de 12,7% no diesel.
O anúncio, no entanto, deixou algumas dúvidas:
- Quais serão os critérios para composição dos preços?
- Como vai ser a atuação em cada mercado?
- Qual será o impacto para os importadores?
A epbr mostra abaixo o que já foi divulgado e o que falta ser esclarecido sobre a nova política de preços da Petrobras.
O que já foi divulgado
— Preço vai considerar novas variáveis
A Petrobras vai seguir levando em consideração os preços internacionais e o câmbio na definição dos preços, mas agora considera também novas variáveis nos cálculos. A empresa passar a levar em conta nos cálculos também as alternativas para o suprimento e o valor marginal da petroleira.
Assim, a companhia vai passar a considerar, por exemplo, o custo interno de produção dos combustíveis e o quanto ela ganha (ou perde) ao vender esses produtos no mercado nacional em vez de exportar. Também entram na conta os preços combustíveis vendidos pelas refinarias privadas e importadores, assim como os preços dos produtos substitutos, como o etanol hidratado, no caso da gasolina.
Os reajustes seguirão sem periodicidade definida e continuarão a ser impactados pela volatilidade no mercado externo. Na prática, a companhia vai buscar ter preços menores do que os concorrentes, mas sem cair em prejuízo.
“A Petrobras vai ter maior poder de arbitragem sobre os preços”, diz Bruno Cordeiro, analista de Inteligência de Mercado da StoneX.
Nesse sentido, é importante ressaltar que o presidente da Petrobras tem sinalizado que a empresa vai buscar ganhar mercado em relação aos concorrentes.
— Margem do refino deve ser preservada
Em entrevista coletiva na manhã desta terça, Prates ressaltou ainda que a empresa não vai ter intervenção do governo e nem vai praticar preços que não sejam rentáveis. É governo indicou, desse modo, que não vai voltar ao cenário do governo Dilma Rousseff, quando a Petrobras teve prejuízos para manter os preços abaixo do mercado externo. “Isso não é uma volta ao passado”, disse Prates.
Segundo o CEO, a nova política “preserva o resultado econômico ótimo para a empresa”, assim como garante a rentabilidade e a capacidade de financiabilidade da companhia.
A mudança foi apoiada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), que considera que pode haver menor volatilidade aos consumidores.
As margens de refino da Petrobras seguem em níveis saudáveis mesmo depois da mudança na política, segundo cálculos feitos depois da redução nos preços anunciada hoje, os analistas do Goldman Sachs, Bruno Amorim, João Frizo e Guilherme Martins. “Em suma, os preços dos novos combustíveis permanecem razoavelmente alinhados com os níveis de preços internacionais e ainda devem permitir margens de refino compatíveis com os níveis pré-pandemia”, afirmaram os analistas em relatório.
Eles ressaltam, no entanto, que o preço do diesel está 7% abaixo da média na costa do Golfo do México americano, umas principais regiões de refino do mundo. Já o preço da gasolina está 15% abaixo dessa referência.
— Preços serão definidos pelos mesmos executivos
Assim como antes, as decisões sobre preços seguirão sendo tomadas pelo grupo composto pelo CEO, o diretor executivo de Logística, Comercialização e Mercados e pelo diretor financeiro.
— Preços vão variar conforme o cliente
Outro ponto importante é o fato de que os preços não serão iguais para todos os clientes, pois as condições serão diferentes conforme o volume negociado. “A Petrobras fará seu preço de acordo com cada cliente, com o ambiente em que aquele cliente se insere e com questões de instalações e logística. Mas a empresa vai buscar sempre ser a melhor alternativa para cada cliente”, disse Prates.
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O que ainda falta saber
— Quais os critérios para composição dos preços?
A companhia não divulgou fórmulas ou referências específicas. Com isso, não se sabe qual das variáveis levadas em consideração vai ter maior ou menor impacto na definição dos preços finais. Também não está claro se esses pesos na composição vão variar conforme as condições do mercado. Cordeiro, da StoneX, acredita que a empresa pode dar mais detalhes a esse respeito nas próximas semanas.
Para o presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araújo, algumas das variáveis levadas em consideração na nova política tendem ser menos objetivas e mais vagas. Para ele, isso cria imprevisibilidade e insegurança não apenas para os importadores, mas também para outros produtores nacionais, que deixam de ter uma referência clara para definir os próprios preços.
“As alternativas de fornecimento, por exemplo, são questões mais abstratas. Com isso, a referência para a precificação fica perdida. A transparência na precificação do agente dominante do mercado brasileiro, que é a Petrobras, acaba”, diz.
O economista Eric Gil Dantas, do Observatório Social do Petróleo (OSP) e Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps), também acredita que a nova política tem critérios subjetivos. “Os parâmetros utilizados não são claros em relação à definição dos preços, critérios esses que seriam muito importantes para assegurar a ligação dos preços aos custos reais de produção (o ‘abrasileiramento’), e assim ofertar ao consumidor brasileiro valores menores do que a paridade de importação”, afirma.
— Como vai ser a atuação em cada mercado?
Também não está claro qual vai ser o impacto, na prática, para os consumidores de cada região, pois a companhia tem uma influência diferente sobre cada mercado. Em relatório, o Goldman Sachs aponta que os impactos da mudança na política de preços devem ser menores nas regiões mais dependentes de importações, como o Norte do país. Já nas regiões que são mais abastecidas pelas refinarias da Petrobras, caso do Sul e Sudeste, a empresa deve ter mais flexibilidade para baixar preços, acredita o banco.
— Qual será o impacto para os importadores?
Outro ponto em que falta clareza é no impacto que a nova política terá sobre os importadores independentes. Hoje, 30% do abastecimento de diesel do país é garantido pela importação.
“O equilíbrio da competição interna vai garantir naturalmente o abastecimento do povo brasileiro”, disse o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira em entrevista à GloboNews depois do anúncio, sem dar maiores detalhes.
Na visão de Amance Boutin, especialista em combustíveis da Argus, o papel da Petrobras no suprimento nacional é um dos pontos mais importantes da mudança para os outros players do mercado. “Durante o governo anterior, a Petrobras recuou na atividade de importação de diesel, deixando agentes privados cuidar do que o parque de refino nacional não podia suprir”, diz.
Boutin não vê, entretanto, risco de falta de suprimento no mercado, pois a possibilidade de importação dos derivados russos, que sofrem sanções na Europa, ajuda a garantir alternativas para o abastecimento.
Para Paulo Valois, sócio do Schmidt Valois Advogados, ainda é difícil de prever os impactos da nova política na dinâmica do mercado. “Se a Petrobras fixar um preço de importação muito menor do que o restante do mercado efetivamente consegue, o cenário se complica para os importadores”, afirma.