Em um dos maiores best-sellers sobre finanças e investimentos, Robert Kiyosaki, mostra como foi viver sob a orientação de dois pais: o seu pai biológico, que ele considera o “Pai Pobre”, apesar de ele não ser de fato pobre, e o pai do seu amigo Mike, o qual ele denomina de “Pai Rico”, um homem bem-sucedido nos negócios.
Pai Rico orientava Robert a investir em ativos que trouxessem retorno financeiro para ele, enquanto o Pai Pobre o orientava a investir naquilo que ele considerava “passivos”, que demandam dinheiro para serem mantidos. O livro é um clássico sobre educação financeira, com ótimas reflexões sobre o tema.
Trazendo os insights da obra para os preços dos combustíveis no Brasil, pode-se identificar os “pais ricos” e “pobres” a frente das pautas do setor.
A principal ideia ao estilo “Pai pobre” é a que envolve a discussão de embutir direta ou indiretamente subsídios aos combustíveis, discussão esta que sempre volta aos holofotes quando os preços do petróleo ou a desvalorização do câmbio disparam no mercado.
A narrativa mais comum neste sentido é de que a Petrobras, como empresa integrada do poço ao posto, deveria oferecer combustíveis mais baratos para a população brasileira.
Em resumo, a ideia parte do princípio de que uma fração do lucro obtido pela produção de petróleo da companhia estatal poderia ser repassado ao mercado, ofertando preços mais baixos, o que representaria um subsídio no preço dos combustíveis.
Segundo Kiyosaki explica no seu livro, este é “o início da corrida dos ratos”.
A expressão faz alusão aos ratos de laboratório, que ficam presos dentro de gaiolas correndo em pequenas rodas: uma ação viciosa e que não apresenta resultados efetivos, a não ser a de consumir energia do rato.
Financeiramente, de forma resumida, essa expressão cunhada pelo autor indica a entrada em um ciclo vicioso de trabalho em busca de dinheiro para pagar dívidas, ao invés de fazer o dinheiro trabalhar para você, é você que se torna escravo dele.
No caso do petróleo e combustíveis, isso se traduz em usar dinheiro da produção de óleo e gás (“trabalho”) para bancar descontos (“dívida”) nos combustíveis.
Combustível barato vicia, gera um aumento de demanda que vai exigir mais recursos. A corrida começa. Recursos que deveriam ir para novos investimentos, geradores de mais riqueza, são usados para fazer subsídio e, assim, a produção de petróleo não sobe, mas a demanda sim.
A roda dos subsídios
Fomentar subsídios aos combustíveis consome recursos importantes, reduz a capacidade de investimentos e costuma elevar o endividamento estatal.
Venezuela e México experimentam isso de forma contundente com suas companhias de petróleo, a PDVSA e a Pemex.
O que se observou nestes dois países na história recente foi consumo crescente por combustíveis artificialmente baratos, que exigiram parte considerável do caixa das empresas, e redução dos investimentos, que afetou a produção de petróleo, colocando-a em declínio.
A ampliação da oferta de derivados, inclusive, ficou comprometida. A corrida dos ratos dos combustíveis foi trilhada.
No Brasil, dados retirados dos Releases de Resultados da Petrobras demonstram que o lucro líquido da empresa com a produção de óleo e gás em 2018 e 2019 foram, respectivamente, 44,2 e 49,8 bilhões de Reais. Assim, o lucro líquido médio do E&P da empresa nos referidos anos foi de R$ 47 bilhões/ano.
Considere agora que o volume somado de gasolina A, diesel A e GLP consumidos no país em 2019 foi de aproximadamente 90,5 bilhões de litros.
Caso a Petrobras adotasse R$ 0,30 de subsídio por litro em cada um destes combustíveis, isso consumiria R$ 27,1 bilhões de reais do lucro do E&P da empresa, ou seja, 58% do lucro médio do segmento realizado em 2018-2019. Isso com subsídio de somente trinta centavos.
A visão do pai de Mike
Na visão do “Pai Rico”, os R$ 27,1 bilhões, calculados anteriormente, que seriam consumidos pelo desconto dado aos principais combustíveis no país, permitiriam, por exemplo, a aquisição de dois FPSOs para alocação no pré-sal. Novos sistemas de produção possibilitariam um aumento da curva de oferta de O&G, com maior geração de royalties e outras participações governamentais, que são encaminhadas para Estados, Municípios e União.
Ou ainda, poder-se-ia ter investido tal cifra na melhoria logística, na construção de novas rotas internas de escoamento de derivados, que gerariam maior eficiência e competitividade no segmento, beneficiando o consumidor e o país.
Adicionalmente, a pluralidade de combustíveis (gasolina, GNV, etanol, diesel, GNL, biogás, biodiesel, etc), concorrendo a preços de mercado, possibilita a ampliação da oferta deles de forma econômica. A disputa entre as alternativas empurra o mercado a perseguir maior eficiência e a oferecer novos serviços.
Os investimentos são rateados entre os diversos agentes de mercado, maximizando os resultados do setor. O risco é diluído e a atratividade aumentada. Todos ganham.
Fugindo da corrida dos ratos
A história está repleta de exemplos que corroboram, demonstram, que a artificialidade nos preços dos combustíveis acaba por gerar distorções e ineficiências em toda cadeia energética envolvida. A falsa sensação imediata de combustíveis mais “baratos” tem consequências e custos muito altos no médio e longo prazos.
A adoção de preços à realidade de mercado é a forma mais justa e transparente para o consumidor. É a ferramenta que fomenta a oferta e a busca por alternativas.
É necessário que se utilize os recursos naturais com inteligência, para que eles sejam multiplicadores de oportunidades, investimentos, emprego, renda e aumento do bem-estar social.
A Petrobras tem um papel importante neste sentido, investindo no crescimento da produção de petróleo, gás e derivados, junto a outros players. Não há prosperidade na interferência de preços ou subsídios aos combustíveis.
Ao passo que é sabidamente dramática a situação de vulnerabilidade econômica a que muitos brasileiros estão submetidos, não será pela redução artificial de preços que isso será corrigido. É preciso construir uma sociedade que tenha condições de consumir os bens produzidos, através da melhor distribuição e elevação da renda da população.
Neste sentido, é salutar e urgente que se avalie a raiz do problema, as questões estruturais que estão refletidas nos altos preços dos combustíveis, que geram o elevado custo-Brasil, tais como a alta e emaranhada carga tributária e a burocracia (que favorecem a sonegação), o câmbio, o endividamento público, a taxa de juros, entre outros.
É preciso fugir do subterfúgio e da tentação do subsídio, pois ele coloca o país na corrida dos ratos, consome divisas importantes, prolonga e, muitas vezes, agrava os problemas estruturais. É preciso ouvir mais os conselhos do Pai do Mike.