Biocombustíveis

O incentivo que faltava para a colheita do 'fruto fácil’ da descarbonização da navegação

Fretadores não se importam em pagar uma taxa maior desde que disponham de navios mais eficientes e econômicos a seu serviço, escreve Daniela Davila

O incentivo que faltava para a colheita do 'fruto fácil’ da descarbonização da navegação. Na imagem: Daniela Ribeiro Davila, sócia da área de Petróleo, Gás & Offshore do escritório Vieira Rezende Advogados (Foto: Divulgação)
Daniela Ribeiro Davila, sócia da área de Petróleo, Gás & Offshore do escritório Vieira Rezende Advogados (Foto: Divulgação)

Investir em tecnologias e equipamentos que geram maior eficiência energética e, portanto, menos emissões de CO2 tem sido visto como o “fruto fácil” (low hanging fruit, na expressão em inglês) na descarbonização do transporte e operações marítimas. Todavia, o obstáculo para a colheita desses frutos continua sendo a falta de incentivo para fazer tais investimentos.

Atualmente, os contratos de afretamento não levam em conta quaisquer economias de combustível geradas pelo uso de equipamentos e tecnologias – invariavelmente mais caros que os convencionais – e, pior, não necessariamente melhoram a classificação do Indicador de Intensidade de Carbono de um navio, nos países onde o índice já é utilizado.

No caso dos contratos de afretamento da indústria offshore brasileira, por exemplo, o custo do combustível é totalmente arcado pela empresa contratante (fretador), gerando ainda menos incentivo ao afretador para investir em tecnologias que gerem efetivamente maior eficiência energética e menor consumo de combustível. Enquanto for assim, é inevitável perguntar-se do porquê se preocupar agora.

Os proprietários, geralmente, são obrigados por garantias de desempenho de tolerância acima e abaixo dos níveis acordados em contratos de afretamento, mas há pouco incentivo para que superem essas tolerâncias quando o fretador é quem obtém todos os benefícios na economia de combustível.

Taxa de afretamento vinculada à performance

Tendo isso em mente, na Europa, já estão em andamento discussões para o primeiro contrato de afretamento vinculado à performance, no qual a taxa de contratação é determinada pelo desempenho técnico real de um navio.

As conversas são baseadas no chamado Índice Técnico da Embarcação (Vessel Technical Index – VTI), uma nova prática recomendada e apresentada pela sociedade de classificação DNV no final do mês de maio. A prática recomendada visa estabelecer um método preciso, baseado em dados e padronizado para medir o desempenho real do navio em atividade.

A ideia é disseminar a prática de fazer contratos de afretamento vinculados ao desempenho energético da embarcação, no modelo que já está sendo chamado de “Contrato de Afretamento Eficiente” ou “eCP” (Efficient Charter Party).

A lógica do eCP é que a taxa de afretamento seja ajustada a cada período de alguns meses, com base no desempenho real do período anterior. Assim, quanto melhor o índice VTI do navio, maior a taxa de afretamento.

A medição do VTI e sua utilização como parâmetro para aumento ou diminuição da taxa de afretamento já é visto como o incentivo que faltava para um fruto fácil, mas até hoje sem incentivo financeiro para redução das emissões de CO2 no transporte marítimo e operações offshore.

Ao se incentivar o proprietário a investir em diversos métodos de economia de energia durante todo o período de afretamento, gera-se uma colaboração entre fretadores e armadores, uma vez que os fretadores não se importam em pagar mais porque há uma economia gerada por navios mais eficientes a seu serviço.

Sem dúvida, trata-se de uma solução onde todos ganham: fretadores, armadores e meio ambiente. A única questão que está no ar é se a indústria naval internacional está preparada para o desenvolvimento e instalação de todas as soluções tecnológicas necessárias.

É questão de criar o incentivo e correr para criar as condições adequadas.

Daniela Davila é sócia da área de Petróleo, Gás & Offshore do escritório Vieira Rezende Advogados.

Este artigo expressa exclusivamente a posição da autora e não necessariamente da instituição para a qual trabalha ou está vinculada.