Gás Natural

O ano do mercado de gás em 10 atos; e o que esperar de 2024

Mercado não ficou parado, mas definições mais concretas sobre o futuro da indústria vão ficar, de fato, para 2024

O ano de 2023 do mercado de gás no Brasil em 10 atos; e quais decisões esperar para 2024. Na imagem: Estação de entrega de gás natural do Gasbol (Foto: Divulgação TBG)
Estação de entrega de gás natural do Gasbol (Foto: Divulgação TBG)

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Editada por André Ramalho
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PIPELINE O ano de 2023 marca a entrada de novos agentes no processamento e distribuição; o reposicionamento da Petrobras; e promessas de uma nova política para o gás. Muitas das definições sobre o futuro da indústria, porém, ficarão para 2024.

Petrobras assina aditivo em contrato de importação da BolíviaÂmbar compra UTE Araucária. Novas regras para mercado livre em Sergipe e mais. Confira:

O ANO QUE NÃO TERMINOU

O ano de 2023 marca a passagem para um novo governo. E a indústria do gás, que viu a abertura do mercado se desenhar – e dar seus primeiros passos concretos – com Michel Temer e Jair Bolsonaro, entrou em compasso de espera.

O setor viu o governo Lula colocar o gás em pauta, na agenda da reindustrialização, ao lançar as diretrizes do programa Gás para Empregar; e viu a Petrobras redirecionar sua rota no mercado.

Muitas das definições mais concretas sobre o futuro da indústria do gás no Brasil, porém, vão ficar, de fato, para 2024.

É claro que o mercado não ficou parado: teve empresa nova entrando nos elos de processamento e na distribuição de gás canalizado; e uma corrida de investidores por uma posição no emergente mercado de biometano.

No ritmo de quem se despede de 2023, a gas week resume, a seguir, os principais marcos do ano (que você acompanhou por aqui) e os seus desdobramentos para 2024.

1) A PROMESSA DO GÁS COMPETITIVO

O governo Lula prometeu, logo no início do ano, aumentar a oferta de gás competitivo, para a reindustrialização do país. Criou, para isso, o Gás para Empregar.

Dentre as novidades nas diretrizes, o uso da PPSA como braço para execução de uma política pública. O plano é permitir o swap (permuta) do óleo da União, nos contratos da partilha, por mais gás – que poderia, então, ser comercializado via PPSA em leilões de longo prazo.

O governo chegou a sinalizar que esse gás seria destinado prioritariamente à indústria química e de fertilizantes.

Ampliou-se o escopo das discussões setoriais, com a criação de cinco comitês temáticos: disponibilidade de gás; acesso ao mercado; modelo de comercialização do gás da União; gás para o setor produtivo; e o papel do gás na transição energética.

As discussões se alongaram e fecham 2023 sem respostas mais objetivas sobre a nova política para o gás do atual governo. Fica para 2024.

2) FREIO NA VENDA DE ATIVOS

Sob a gestão de Jean Paul Prates, a Petrobras concluiu alguns desinvestimentos cujos contratos já estavam assinados pelas gestões passadas – caso, por exemplo, do Polo Potiguar, para a 3R Petroleum, que se tornou dona da infraestrutura de processamento de Guamaré (RN).

A estatal, contudo, revisou o seu planejamento estratégico e encerrou os processos de desinvestimento do Polo Bahia Terra (UTG Catu)Urucu e Manati, interrompendo um movimento de abertura de campos maduros.

A Petrobras desistiu também da venda da Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) – um compromisso assumido com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em 2019.

A petroleira pediu então a revisão dos termos de cessação de conduta (TCC) junto ao órgão antitruste e o assunto provavelmente terá repercussões em 2024.

Para o CEO da Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, como o Cade se posicionará será é o tópico mais relevante para o setor no ano que vem: “Isso vai dar a nota sobre o mercado que teremos para os próximos anos”, disse, em referência à continuidade ou não do movimento de abertura do setor.

Os novos indicados para o Tribunal do Cade, aliás, demonstraram preocupações com “abusos” da Petrobras no mercado de gás.

3) PETROBRAS MIRA MARKET SHARE

A mudança na gestão da petroleira marca também uma nova postura comercial. A estatal lançou este ano novos tipos de contratos de suprimento (incluindo opções mais flexíveis) e conseguiu garantir contratos de longo prazo prazo com ao menos 13 distribuidoras.

A estatal voltou a se posicionar como fornecedora relevante do mercado de gás no Nordeste – região que ficou em segundo plano em gestões passadas e onde a abertura do mercado, de fato, se concentrou.

Os novos contratos da Petrobras garantem, ainda que com volumes decrescentes, um mercado consumidor para a companhia até 2034.

Em meio à pressão da indústria por um gás mais competitivo, a petroleira melhorou as condições de preços, em relação as suas últimas levas de contratos, mas longe de um choque de preços baixos.

O impacto no mercado livre: os novos contratos de longo prazo da Petrobras com as distribuidoras, a preços pouco convidativos para a indústria, podem tornar atrativas oportunidades de migração para o ambiente livre no futuro. E trazem também impactos na precificação do gás dos concorrentes.

4) VEM MAIS GÁS AÍ

O ano de 2023 marca o avanço de um importante projeto estratégico para aumento da oferta de gás do país: a decisão final de investimento da Equinor – e de seus sócios Petrobras e Repsol Sinopec – no desenvolvimento dos campos de Raia Manta e Raia Pintada (o BM-C-33)

A expectativa é que o projeto comece a exportar gás para a costa em 2028. Representará a chegada de um volume de gás novo de 14 milhões de m³/dia.

A Petrobras, por outro lado, adiou de 2027 para 2029 a previsão de entrada em operação do gasoduto de Sergipe Águas Profundas (Seap).

Já o Rota 3 está confirmado para o fim de 2024. Para Rivaldo Neto, o gasoduto não deve trazer mudanças radicais no funcionamento do mercado. A expectativa, na avaliação dele, é que o projeto ajude a compensar o declínio da produção do pós-sal e a reduzir as importações – seja da Bolívia, com cada mais dificuldades de repor suas reservas, seja GNL.

Aliás… 2024 marca a entrada em operação os novos terminais de GNL da New Fortress em Barcarena (PA) e Santa Catarina. E a planta de regaseificação da Eneva em Sergipe passa a se conectar à malha nacional de gasodutos.

5) O NOVO DESENHO DA DISTRIBUIÇÃO

Ao comprar a ES Gás, por R$ 1,423 bilhão, a Energisa se tornou a 3ª operadora privada da distribuição de gás no Brasil – setor em sua maior parte composto por sociedades de economia mista controladas pelos estados.

O ano de 2023 foi marcado também por novos capítulos do rearranjo da distribuição pós-privatização da Gaspetro. A Compass tem acordo para venda de sua participação indireta em cinco concessionárias do Nordeste para a Infra Gás – empresa do grupo Infra SA, com histórico de atuação em obras públicas.

Mas… a Mitsui sinalizou a intenção de fazer uma nova investida no setor e exercer o direito de preferência pelos ativos: as ações da Compass, detidas por meio da Commit (ex-Gaspetro), na Algás (AL), Cegás (CE), Copergás (PE), Potigás (RN) e Sergas (SE).

A sinalização gerou reações: o governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), sancionou uma lei que impõe limites à participação de capital estrangeiro em empresas públicas.

A expectativa é que o desfecho desse emaranhado de direitos de preferências (dos estados, da Mitsui) fique para o ano que vem. Saberemos então se a Infra Gás conseguirá ficar com algum dos ativos em jogo.

O que também deve ficar para ano que vem é a venda do controle da Compagas, pela Copel.

6) UM ANO SEM NOVAS TÉRMICAS

O governo Lula deixou em suspenso, este ano, os leilões para contratação compulsória das termelétricas a gás natural previstas na lei de privatização da Eletrobras – herança do governo Bolsonaro. O governo Lula chegou a colocar em dúvida a continuidade das contratações, iniciadas no ano passado.

O Tribunal de Contas da União (TCU) recomendou, inclusive, que o Ministério de Minas e Energia avaliasse a possibilidade jurídica de não seguir com os leilões, sob o argumento de que a contrataçã dos 8 GW não tem respaldo técnico e fere princípios legais e constitucionais.

O assunto voltou à tona neste fim de ano, como um jabuti no marco legal das eólicas offshore, que tramita na Câmara. O relatório reduz para 4,25 GW a capacidade térmica que deve ser contratada, mas propõe mudanças na forma de cálculo do preço-teto das térmicas, para torná-las mais atrativas nos leilões – que, nos termos definidos originalmente, foram incapazes de contratar toda a capacidade prevista em 2021.

A expectativa é que ao menos parte dos jabutis das eólicas offshore seja incorporada na Medida Provisória que o governo prepara para reduzir tarifas de energia. Tema para ficar de olho no fim do ano e que pode respingar para 2024.

7) CORRIDA PELO BIOMETANO

As perspectivas de crescimento do setor movimentaram este ano investidores interessados em se posicionar no biometano.

Em 2023, algumas empresas fincaram os pés no setor, com destaque para grandes players como a Energisa e a Compass – que se aliou à Orizon, para a construção de uma planta no aterro de Paulínia, e assinou contrato com a São Martinho para compra do biometano da 1ª usina do grupo sucroalcooleiro.

O setor ainda aguarda uma política nacional para o biometano – que ficou de fora do projeto de lei do Combustível do Futuro, enviado pelo governo ao Congresso em setembro. Desde então, a indústria do biogás articula para que suas demandas sejam contempladas no PL.

O deputado Arnaldo Jardim (Cidadania/SP), relator do projeto na Câmara, já sinalizou a intenção de incluir o biometano em seu parecer. Mesmo que avance na Câmara nesta reta final de ano, é provável que a tramitação só seja concluída no Congresso, de fato, em 2024.

8) NOVELA SUBIDA DA SERRA SE ESTENDE

2023 marca também uma longa negociação entre ANP e Arsesp (o regulador paulista) sobre as divergências em relação à classificação do gasoduto Subida da Serra, da Comgás.

Entre idas e vindas, a nova minuta para o acordo está fora da pauta da última reunião do ano da diretoria da ANP, no próximo dia 21. E a discussão de um dos temas mais quentes na indústria este ano deve ficar, mesmo, para 2024.

E não para por aí… um novo conflito federativo sobre a regulação do gás começa a ganhar corpo entre a ANP e a Arsesp, dessa vez sobre as competências na fiscalização e autorização do comercializador de gás.

Fora a discussão sobre os gasodutos virtuais.

9) O FIM DAS CHAMADAS PÚBLICAS DOS GASODUTOS

A ANP aprovou, este ano, as novas regras de contratação de capacidade dos gasodutos de transporte. A grande novidade é a adoção de um procedimento simplificado para a capacidade existente, sem necessidade de chamadas públicas.

As CPs passam a ser obrigatórias somente para contratação de capacidade incremental – ampliação ou construção de um novo gasoduto.

A simplificação foi a principal entrega da agenda regulatória da ANP, que atrasou. O regulador espera concluir apenas em 2025 todas as regulamentações previstas na agenda regulatória (2022-2023) para o setor.

E por falar em capacidade incremental…

A TBG prepara para 2024 a oferta de capacidade do projeto de ampliação do Gasbol.

Este ano, a expansão da malha ficou limitada à conclusão da construção do gasoduto Itaboraí-Guapimirim (Gasig), de apenas 11 km, da NTS. Mesmo assim, o descasamento com a entrada em operação da UPGN do Polo Gaslub adiou para 2024 a previsão de entrada em operação comercial do ativo.

O ano marcou também a constituição do Conselho de Usuários, criado para monitorar as transportadoras e que mira o debate sobre contratos menos punitivos e transparência das tarifas, dentre outros tópicos.

10) ARGENTINA VOLTA AO MAPA

A chegada de Lula à presidência marcou uma reaproximação das relações com a Argentina ao longo de 2023 e de uma discussão sobre um projeto de integração energética entre os dois países.

No contexto da corrida eleitoral do país vizinho, o então presidente argentino Alberto Fernández buscou em Lula o apoio do BNDES para construção do 2º trecho do Gasoduto Nestor Kirchner – que pode abrir as portas para que o gás de Vaca Muerta seja exportado, no futuro, para o Brasil.

A mudança no governo argentino, neste fim de ano, contudo, levantou incertezas sobre a continuidade da reaproximação. O novo presidente, Javier Milei, será pragmático ao ponto de manter as relações com o governo brasileiro ou não? Mais um assunto no radar da indústria do gás para 2024.

GÁS NA SEMANA (PORQUE O ANO AINDA NÃO ACABOU)

Gás da Bolívia. Petrobras assina aditivo com YPFB para manutenção do volume máximo de 20 milhões de m³/dia nas entregas de gás ao Brasil, mas com “maior flexibilização dos compromissos firmes” de acordo com a sazonalidade e disponibilidade da oferta. Isso possibilitará à Bolívia vender volumes adicionais para outros importadores brasileiros, segundo a Petrobras.

Âmbar compra UEGA. Empresa do grupo J&F assinou contrato com a Copel, para aquisição de 81,2% da UTE Araucária por R$ 320,7 milhões. Ampliou seu portfólio de geração a gás, que já conta com as usinas Cuiabá (480 MW) e Uruguaiana (600 MW).

Aposta no gás em SC. Estreante em leilões de óleo e gás da ANP, a Blueshift arrematou o bloco PAR-T-335, na Bacia do Paraná, no 4º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão, de olho no potencial de descobertas de gás natural no bloco situado em Santa Catarina.

Custos de infraestrutura travam investimentos. Os custos de acesso ao escoamento e processamento inviabilizam, hoje, qualquer projeto gás-químico, como plantas de fertilizantes, afirmou o secretário de Petróleo, Gás e Biocombustíveis do MME, Pietro Mendes.

Bahiagás vai ao mercado. Distribuidora prepara, para 2024, uma nova chamada pública para aquisição de gás e mira condições mais flexíveis de compra da molécula, na renovação de seu portfólio.

Novas regras para mercado livre em Sergipe. Governo estadual homologou novo regulamento com mudanças que visam harmonizar as regras locais com o marco regulatório federal. As novas regras também adotam exigências mais brandas para a migração do usuário do mercado livre. Veja os detalhes

O saldo da COP28. Além dos compromissos de triplicar a capacidade renovável até 2030 e dobrar a eficiência energética, a COP de Dubai chegou a um meio termo entre a “eliminação gradual dos combustíveis fósseis” e “atacar as emissões, não a energia”.

– A Conferência convocou os países a uma “transição para longe dos combustíveis fósseis nos sistemas de energia, de maneira justa, ordenada e equitativa, acelerando ações nesta década crucial, a fim de atingir emissões líquidas zero até 2050, em conformidade com a ciência”.