Biocombustíveis

Novo governo deve olhar com cautela importação de biodiesel, diz secretária de Economia de Goiás

Abertura do mercado para importação de biodiesel de outros países em 2023 pode prejudicar indústrias do setor, que já apresentam cerca de 50% de capacidade ociosa

Novo governo deve olhar com cautela importação de biodiesel, diz secretária de Economia de Goiás, Cristiane Schmidt [na foto] (Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados)
Cristiane Schmidt, secretária de Economia do Governo de Goiás e ex-conselheira do Cade (Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados)

BRASÍLIA — De acordo com a secretária de Economia do Governo de Goiás e ex-conselheira do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Cristiane Schmidt, a abertura do mercado para importação de biodiesel — prevista para janeiro de 2023 — pode aumentar a capacidade ociosa nas indústrias do setor.

E o novo governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deverá olhar com cautela para questões que precisam ser resolvidas antes dessa abertura.

“Nós vemos hoje uma capacidade ociosa de aproximadamente 50% e uma falta total de previsibilidade”, disse a economista nesta terça (22/11), durante seminário da Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBio) na Câmara dos Deputados.

Segundo Schmidt, a indústria do biodiesel precisa de previsibilidade. No entanto, o atual cenário demonstra o contrário. “O Brasil não pode perder a oportunidade de ser um líder nesse setor”, declarou.

Desde o início da Programa Nacional de Produção de Biodiesel (PNPB), foram investidos mais de R$ 10 bilhões no programa. Hoje, o país conta com 57 usinas de Biodiesel, distribuídas em 15 unidades da federação, estão autorizadas pela ANP a produzir 13,3 bilhões de litros/ano.

Em 2022, com a redução da mistura obrigatória ao diesel de 14% para 10%, o consumo do renovável deve fechar o ano com cerca de 6,3 bilhões de litros/ano. Como o país não tem tradição exportadora de biodiesel, a ociosidade do parque industrial é calculada em 53% pelo setor.

Neste cenário, a economista vê com preocupação a abertura para entrada no mandato nacional de biodiesel de outros países de forma “rápida e inédita” em janeiro.

Importação depende de autorização da ANP

A abertura do mercado brasileiro para importar biodiesel e usá-lo para cumprir a mistura obrigatória no diesel é uma entre várias medidas da gestão de Jair Bolsonaro (PL) sobre o mercado de biodiesel com a justificativa de dar mais competitividade ao preço dos combustíveis.

A importação já está prevista em resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que extinguiu os leilões bimestrais para comercialização de biodiesel. Depende agora de uma autorização da Agência Nacional de Petróleo e Biocombustíveis (ANP), que precisa editar uma nova resolução regulamentando o tema.

As medidas têm apoio do refino, distribuidoras de combustíveis e segmentos do consumo, como algumas associações de transportadores.

Os produtores, por outro lado, são contra, já que a demanda está abaixo do que era previsto, e a ociosidade já alta pode ser ainda maior, podendo levar algumas usinas à falência.

No começo do mês, as associações do setor recorreram à ANP para adiar a importação do biocombustível. Os produtores pedem uma análise de impacto regulatório antes da autorização, ou a criação de um grupo de trabalho para analisar a questão, em uma tentativa de postergar a abertura do mercado, pelo menos até o novo governo ter tempo de avaliar a questão.

Também presente no evento desta terça, Arnoldo de Campos, um dos representantes da equipe de transição de Lula, reforçou que o governo eleito irá resgatar a previsibilidade e estabilidade do PNPB com mecanismos de transparência.

Campos também relembrou o comprometimento da gestão de Lula com o fortalecimento do programa e disse que “o biodiesel pode contribuir muito para a pauta ambiental, social e econômica”.

Risco de dumping e desemprego

Schmidt também alertou para o risco de dumping, que é comercialização de produtos a preços abaixo do custo de produção. “Se a gente quer abrir o mercado para ter o menor preço, temos que olhar para o que está acontecendo com as outras indústrias”, alertou.

A Argentina, por exemplo, é frequentemente questionada na Organização Mundial do Comércio (OMC) pela prática que privilegia a exportação de produtos processados, como o biodiesel.

Além disso, criticou a decisão de fixar o mandato de biodiesel em 10% até março de 2023, o que pode representar prejuízos para o setor quanto à geração de empregos, entre outros impactos na agricultura familiar.

“Nós deveríamos estar pensando em B20. Estamos falando de 55 usinas que podem quebrar e gerar desempregos em regiões do interior”, informou.

Nesta segunda, o CNPE decidiu manter o percentual de 10% do biocombustível na mistura obrigatória do diesel. Além disso, autorizou o uso de HBio, diesel coprocessado da Petrobras, o qual possui apenas 5% de conteúdo renovável.