PIPELINE. Alexandre Silveira sobe o tom nas críticas aos agentes das infraestruturas de gás e cobra mais regulação da ANP. Mercado responde. Um giro pelo que rolou na gas week 2025.
MME espera lançar novo edital do LRCAP em até 60 dias. ONS habilita 12 térmicas para regime de operação diferenciada. Edge de olho no mercado de GNL para transporte marítimo. A agenda regulatória do biometano pós-Combustível do Futuro e mais. Confira:
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O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), endureceu o recado aos agentes das infraestruturas, em meio à tentativa de avançar com a agenda da competitividade do gás natural para a indústria.
No discurso de abertura do encontro presencial da gas week 2025, na terça-feira (8/4), o ministro cobrou também senso de urgência da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) no avanço da agenda regulatória do gás. (assista ao discurso na íntegra)
E que o regulador “faça sua parte” para acabar com os “privilégios” dos transportadores e da Petrobras (e sócios privados) nos sistemas de escoamento (SIE) e processamento (SIP).
Para situar, as mensagens de Silveira têm endereço(s) e timing.
No transporte, direcionou as críticas às “privatizações levianas” da Transportadora Associada de Gás (TAG) e Nova Transportadora do Sudeste (NTS), nos governos passados, ao criticar as tarifas elevadas no setor.
As falas vêm num momento em que o MME se debruça sobre um emaranhado de pautas que se misturam entre si (revisão tarifária, vencimento dos primeiros contratos legados, leilão de reserva de capacidade etc) na tentativa de endereçar o primeiro pacote de entregas da regulamentação do Gás para Empregar: destravar investimentos na malha de gasodutos e garantir uma solução (ou soluções) para reduzir as tarifas de transporte (detalhes abaixo).
No escoamento e processamento, citou não só a Petrobras, mas o “clubinho” do SIE e SIP – que, nas palavras do ministro, foi “arquitetado para que apenas algumas poucas empresas” se beneficiem. Uma referência implícita aos sócios da estatal nessas infraestruturas (Shell, Petrogal e Repsol Sinopec)
O governo corre contra o tempo para viabilizar o 1º leilão de gás da União em 2025. E Silveira pauta o debate sobre a “remuneração justa e adequada” do SIE e SIP num momento em que a PPSA trava uma negociação com a Petrobras pela redução desses custos de acesso aos ativos.
A seguir, fazemos um giro pelo que mais rolou na gas week 2025 e mostramos como os recados do ministro ressoaram entre diferentes agentes do mercado.
Espero que essa newsletter ajude você a se guiar no debate, entre tantos conteúdos. Mas fica o convite para que você mergulhe nos painéis, entrevistas e cobertura do evento no site e no canal da agência eixos. Aproveite.
Transportadoras respondem
O elo do transporte é a solução para a redução do preço final da molécula, e não o vilão da falta de competitividade do gás, defendeu o diretor Comercial e Regulatório da TAG, Ovídio Quintana.
Uma resposta às críticas de Silveira, que atribuiu à privatização da TAG e NTS — “sem a regulação adequada” — o alto patamar das tarifas de transporte no país.
Quintana citou que, desde 2019, quando a TAG foi privatizada, a tarifa de transporte não subiu, em termos nominais (sem considerar a inflação)
“A gente só vai ter bom preço do gás se a gente fomentar o máximo a competição. E o transporte [conexão de diferentes agentes na malha de gasodutos] é um instrumento para induzir a competição”, disse o executivo, ao participar do painel A Regulamentação do Gás para Empregar (o painel foi parte do Círculo de Líderes, segmento da gas week 2025 acessível apenas presencialmente aos participantes).
O presidente da NTS, Erick Portela, defendeu, por sua vez, que a saída da Petrobras das transportadoras foi benéfica para o mercado. A operação, citou, é mais do que uma privatização.
“É unbundling [desverticalização]. É um modelo que foi feito na Europa há uns 30 anos atrás, no qual se entendeu que no midstream o produtor não pode participar. Por quê? Porque ele possui uma tentação razoável de inserir barreiras à entrada [de concorrentes]”, disse. Veja a íntegra da entrevista de Portela ao estúdio eixos.
Pacote de medidas no forno
O diretor do Departamento de Gás Natural do MME, Marcello Weydt, anunciou na gas week 2025 que a pasta está estruturando “um grande bloco” de entregas relativas ao setor de transporte.
Citou, como exemplos, as regras transitórias de remuneração de novos investimentos na malha de gasodutos (um pleito das transportadoras); e a postalização das tarifas.
Além da adequação dos contratos legados ao modelo de entrada e saída (algo previsto na Lei do Gás, de 2021).
Na prática, esse debate pode se desdobrar para a uniformização das tarifas de transporte: a Petrobras trabalha hoje, nos contratos legados, com tarifas e flexibilidades na alocação de entrada e saída diferentes do restante do mercado e a ideia é dar isonomia a essa relação. Já falamos disso por aqui.
A tarefa tem sido tentar entender para onde vão as tarifas daqui para frente, no contexto das revisões tarifárias, vencimento dos primeiros contratos legados, novos investimentos e a integração com o setor elétrico (as incertezas sobre o futuro da demanda termelétrica e seus impactos sobre as tarifas).
E, dentro desse contexto todo, com o cancelamento do leilão de reserva de capacidade, volta à tona a discussão sobre o impacto das tarifas de transporte de gás sobre a competitividade das usinas — e, por consequência, do próprio resultado do certame sobre o futuro dessas tarifas.
“Então, isso é um esforço que todo o time técnico das transportadoras e do Ministério estão discutindo, exatamente para ver o que sai dessa equação”, disse Weydt.
Há uma percepção generalizada, entre os agentes do mercado, de que um dos grandes desafios da agenda do setor em 2025 será conciliar novos investimentos na malha de gasodutos com a pressão por redução do custo do gás natural, na revisão tarifária das transportadoras.
E, para isso, será preciso olhar com atenção para o lado da demanda, em especial para a (re) contratação das termelétricas no leilão de reserva de capacidade. Quer se aprofundar? Assista na íntegra ao painel Gás Natural e Biometano: qual o mercado que queremos?, na live de abertura da gas week.
Os contratos legados
E no meio dessa estrada… a recente abertura das planilhas dos contratos legados, pela ANP, esquentou o debate entre transportadoras e usuários sobre a remuneração dos gasodutos.
As críticas de Silveira às tarifas ecoam, sobretudo, entre os consumidores industriais – os membros do Fórum do Gás vêm manifestando apoio à agenda do MME.
A revisão tarifária das transportadoras deste ano deve ser encarada como uma oportunidade de uma “negociação geral” para revisão de todos os contratos legados, e não somente aqueles que vencem no fim do ano, defendeu o coordenador-geral do Fórum do Gás, André Passos, ao participar de live do estúdio eixos. Assista na íntegra aqui.
- Para complementar, um artigo de opinião: O dobro pela metade Lei do Gás completa quatro anos com avanços, consumidor industrial ainda paga caro, avaliam André Passos e Adrianno Lorenzon
Portela, da NTS, acrescentou que a revisão tarifária das transportadoras segue um rito regulatório que precisa ser respeitado. E que o debate sobre a remuneração das transportadoras deve tomar como premissa a segurança jurídica e regulatória.
As transportadoras defendem um perímetro de discussão: que a revisão da base de ativos seja gradual e se dê à medida que os contratos legados forem vencendo. No caso, este ano, vencem apenas dois deles: o Malha Nordeste (TAG) e o Malha Sudeste I (NTS).
A disputa no escoamento e processamento
Já o debate sobre a remuneração dos ativos de escoamento opôe, de um lado, MME e PPSA, e do outro, Petrobras e suas sócias nessas infraestruturas.
Em entrevista ao estúdio eixos, a diretora Técnica da PPSA, Tabita Loureiro, contou que a estatal abriu negociações com a Petrobras, para reduzir os atuais custos de acesso ao SIE e SIP — que, segundo ela, inviabilizam, o leilão de gás natural da União. (veja a entrevista na íntegra).
Tabita citou que, se as conversas não avançarem, a mediação da ANP — ou do Comitê de Monitoramento do Setor de Gás Natural (CMSGN) — será um caminho inevitável.
Ao participar do talk show C-Level 1×1: o olhar de quem define estratégias do setor (assista na íntegra), a diretora da PPSA afirmou que tem recebido relatos de agentes do mercado que também enfrentam dificuldades no acesso às infraestruturas, mas que “não têm coragem” de formalizar uma arbitragem.
A expectativa no governo é que a proposta de remuneração máxima das infraestruturas essenciais, apresentada em março pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ajude a amparar as negociações entre Petrobras e PPSA.
Multinacionais rebatem
Os sócios do Sistema Integrado de Escoamento rebatem. Em entrevista ao estúdio eixos, o gerente de Comercialização de Gás da Repsol Sinopec Brasil, Andrés Sannazzaro, defendeu que o SIE, que interliga as Rotas 1, 2 e 3 do pré-sal, não foi concebido como um ativo aberto a terceiros. E, portanto, o debate sobre a regulação da remuneração desses ativos não faz sentido.
Ele argumentou ainda que o SIE é uma infraestrutura de upstream, ou seja, associada a campos de óleo e gás; e cuja decisão de investimento foi tomada no contexto do desenvolvimento desses campos.
“Não é um ativo que foi pensado para oferecer um serviço. Por isso não tem sentido tentar tratá-lo como um ativo regulado”. “Essa questão de tentar regular, tentar entender e acessar todas as informações relativas, [sobre] como foi calculado o custo que tem e a tarifa que tem, às vezes, não faz muito sentido”, comentou (assista a entrevista na íntegra).
A via da negociação é o caminho para que empresas tenham convergência sobre a remuneração da infraestrutura de gás natural e, consequentemente, tenham segurança para investir no país, complementou o CEO da Shell Energy, Rodrigo Soares. (assista na íntegra)
A análise do vice-presidente de Mercado de Gás para América Latina da Rystad Energy, Vinícius Romano, vai na mesma linha (a da negociação). Ele acrescenta que essa discussão reforça a importância do planejamento integrado da infraestrutura.
“Porque aí você garante que os objetivos das diferentes empresas vão ser atendidos com informação, com o consenso do mercado”.
A agenda para a redução do custo do gás para o consumidor final, segundo ele, deveria concentrar o olhar sobre a dinâmica concorrencial da oferta:
“Existe essa interpretação de que o preço do Brasil hoje está caríssimo, que ele está errado porque cada um desses entes da infraestrutura estão colocando preços abusivos. Mas, mesmo ‘corrigindo’ ou mudando essa precificação, o que deveria definir o preço negociado no Brasil deveria ser esse ponto de concorrência”, disse, na live do estúdio eixos (assista na íntegra).
- E para complementar o debate, uma sugestão de artigo de opinião: O preço do gás no Brasil: o mito dos oligopólios e os desafios da regulação. Análise revela que 46% do valor pago pelo consumidor vem de escoamento e processamento, ainda controlado pela Petrobras; transporte responde por apenas 10% do custo final, escreve Alexandre B. Calmon
Para o CEO da PetroReconcavo, José Firmo, a queda nos custos do gás vai ocorrer conforme os agentes desenvolverem novas alternativas de projetos e de investimentos na infraestrutura (entrevista na íntegra).
GÁS NA SEMANA
LRCAP. Governo espera publicar em até 60 dias o edital do leilão de reserva de capacidade, com novas regras, a tempo de realizar o certame ainda este ano.
– Em entrevista ao estúdio eixos, o ministro Alexandre Silveira disse que, se necessário, o parque térmico será acionado para garantir a segurança energética diante do atraso do leilão. (assista na íntegra)
– Ao todo, o ONS já habilitou propostas de 12 térmicas no regime de operação diferenciada. As usinas a óleo diesel apresentaram propostas 60% menores para o mecanismo de contratação flexível.
– As incertezas sobre o LRCAP e o seu impacto sobre as tarifas de transporte foram temas de muito debate no estúdio eixos: o CEO da Eneva, Lino Cançado, disse que a contratação emergencial de termelétricas por meio do regime diferenciado vai ser necessária em 2025;
– a VP da Equinor Brasil, Cláudia Brun, destacou, por sua vez, que a revisão das regras do leilão deve ser encarada como uma oportunidade para se construir uma nova sistemática que dê mais segurança jurídica ao LRCAP.
– e o CEO da NTS, Erick Portela, defendeu que a integração das térmicas à malha de gasodutos é estratégica para a estabilidade do sistema elétrico.
Mercado livre. CEO da Edge, Demétrio Magalhães, estima que volume contratado no ambiente livre, no Brasil, hoje na faixa dos 9 milhões de m3/dia, tem potencial para atingir até 15 milhões de m3/dia este ano. (a entrevista na íntegra)
– Para aprofundar, assista à live do estúdio eixos sobre As perspectivas para o mercado livre em 2025, com Bruno Armbrust, sócio fundador da ARM Consultoria, e Lucas Tocchetto, diretor comercial da Infinity Energias.
Gás em navios. A Edge também está de olho no mercado de GNL para transporte marítimo e já tem conversas nesse sentido.
Corredores. Country manager da Naturgy no Brasil, Katia Repsold, fala sobre as perspectivas de ampliação dos corredores sustentáveis no Rio.
Regulação. Senador Laércio Oliveira (PP/SE) apresenta dois projetos de lei para fortalecer a autonomia das agências reguladoras, diante dos recorrentes cortes orçamentários sofridos pelas autarquias. O tema foi discutido no painel sobre a agenda legislativa para gás e energia, durante a gas week 2025.
Combustível do Futuro. Governo trabalha para regulamentar o mandato do biometano. Oferta e harmonização de certificados são questões que precisam de respostas ainda este ano para viabilizar mandato em janeiro de 2026. A agenda regulatória pós-Combustível do Futuro foi tema de mesa redonda promovida pela gas week
– Também no evento, o deputado federal, Arnaldo Jardim (Cidadania/SP), defendeu a derrubada do veto presidencial que impediu o acesso de projetos do Paten aos recursos do Fundo Clima. Segundo o parlamentar, a medida é fundamental para viabilizar iniciativas voltadas à descarbonização, incluindo o uso de gás e biometano.
- Opinião. A recepção da estocagem de gás pelo direito tributário brasileiro Modelo inspirado no mercado internacional busca reduzir volatilidade de preços, mas enfrenta desafios tributários e regulatórios, escrevem Paloma Rosa e Katiana Bilda
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