PIPELINE. ANP revisa critérios para cálculo das tarifas de gasodutos em meio a questionamentos das transportadoras sobre aplicação das novas regras e pedidos de usuários para adiamento de revisão tarifária.
Novo Plano Nacional Integrado da EPE reúne 13 projetos prioritários. PetroReconcavo concluiu aquisição de 50% dos ativos de infraestrutura de gás da Brava em Guamaré e mais. Confira:
A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realiza na próxima quarta-feira (8/10) audiência pública sobre os novos critérios para cálculo das tarifas de transporte de gás natural.
A expectativa do regulador é que uma nova resolução seja publicada até o fim do ano e ajude a balizar, assim, a revisão tarifária das transportadoras, que corre em paralelo. (relembre os principais pontos da minuta)
“Os assuntos são imbricados… A nossa percepção é que esse processo de revisão de tarifa alimenta a resolução. E a resolução alimenta o processo de revisão de tarifa com os princípios”, afirmou a diretora da ANP, Symone Araújo, em audiência pública no Senado, em setembro.
A agenda, porém, tem sido questionada pelos agentes do mercado:
- o Conselho de Usuários (CdU) pede que a ANP conclua, primeiro, a discussão sobre a nova resolução e que, só depois disso (possivelmente em 2026), conclua a revisão tarifária – com o tempo necessário para passar o pente-fino sobre as propostas das transportadoras;
- e as transportadoras, com pareceres jurídicos em mãos, defendem que a revisão tarifária em curso siga as regras vigentes (a Resolução 15/2014, em revisão), sob o risco de judicialização em caso contrário.
A Transportadora Associada de Gás (TAG), por meio de parecer (na íntegra, em .pdf), propõe que a Resolução 15/2014 seja aplicada ao ciclo 2026-2030 como uma forma de regime de transição.
Sustenta que sua proposta tarifária foi baseada no arcabouço regulatório então existente, apresentada antes mesmo de a ANP colocar em consulta pública a minuta da nova resolução.
O desfecho dessa discussão promete ser quente. Transportadoras e usuários travam um debate acirrado sobre a metodologia da revisão da base de ativos regulatórios (BRA) – essa disputa bilionária já foi tema aqui na newsletter.
Mas não só. A seguir, a gas week se debruça sobre outras frentes de colisão – um saldo da consulta pública da revisão da Resolução 15/2014.
- Antes, aquele convite para você se conectar ao novo episódio do videocast gas week, com Erik Trench, diretor da Ultragaz. Conversamos sobre o início do mandato do biometano em 2026; mercado voluntário, descarbonização do transporte… Assista na íntegra
Transportadoras propõem blindar ativos
Uma das principais propostas das transportadoras na revisão tarifária deste ano é a blindagem da BRA. As companhias do setor pedem à ANP a incorporação do conceito também no novo regulamento.
- Em resumo, a blindagem consiste em assegurar que os ativos, uma vez reconhecidos pelo regulador como integrantes da BRA, não serão reavaliados ou terão suas metodologias de valoração alteradas – ainda que os ativos continuem sujeitos à depreciação e amortização.
A ATGás, como representante das transportadoras, defende que a blindagem garante que o retorno do investimento “não será comprometido por mudanças abruptas de regras ou interpretações que inviabilizem sua operação”.
A metodologia de valoração da BRA é, justamente, um dos pontos mais sensíveis — se não o mais — na revisão tarifária em curso.
A blindagem é um conceito presente no setor elétrico. O CdU pede cautela com a discussão, por entender que, neste momento, não há informações suficientes para uma decisão sobre o assunto.
Os usuários defendem que um processo de blindagem da base regulatória de ativos deve ocorrer somente após uma “contabilidade regulatória robusta e amplamente debatida com o mercado”, a fim de evitar o risco de dupla remuneração dos ativos.
Propõe, nesse sentido, que a ANP contrate empresa especializada independente para avaliar minuciosamente aspectos como o inventário físico; avaliação de vida útil e depreciação; metodologia de valoração; conformidade regulatória; e análise dos investimentos.
Como tratar os novos investimentos?
A Controladoria-Geral da União apontou algumas lacunas nos novos critérios da ANP para cálculo das tarifas de transporte de gás.
As contribuições da CGU à minuta de resolução se concentraram, em especial, nas incertezas sobre o tratamento de investimentos previstos, mas não realizados pelas transportadoras — ou aqueles que tenham se concretizado com mudanças na “forma e no valor inicialmente estimados”.
- Pelos termos propostos pela ANP, a transportadora começa a ser remunerada antes da operação dos ativos que estejam contemplados nos planos de investimentos para o ciclo tarifário vigente;
- Caso ocorra a reconsideração de valores, cronogramas ou desconsideração dos investimentos previstos, a receita do transportadora deverá ser revisada e a remuneração antecipada deve ser devolvida aos usuários por meio da Conta Regulatória.
A CGU entende, contudo, que a redação da minuta não cita expressamente a possibilidade de recuperação das receitas em excesso nos casos de ajustes de custos e investimentos projetados versus realizados.
E sugere, nesse ponto, que o texto deixe mais claro essa possibilidade, bem como inclua dispositivos que permitam comparar a previsão de investimentos com a sua efetiva realização.
O Conselho de Usuários, aliás, sugere um rito regulatório mais claro para tratamento dos novos investimentos:
- que qualquer novo investimento seja incorporado à Receita Máxima Permitida (RMP) somente após rito de avaliação da proposta de investimento — com consulta pública; sua vinculação ao Plano Nacional Integrado da EPE; aprovação pelo regulador etc.
Os usuários questionam alguns investimentos propostos pelas transportadoras na revisão tarifária e no Plano Coordenado das transportadoras.
As transportadoras, por sua vez, propõem que o texto da nova resolução explicite que aqueles investimentos que vierem a ser aprovados pela ANP posteriormente (e que não estão previstos no processo de revisão tarifária) poderão ensejar revisão extraordinária das receitas e das tarifas.
A ATGás alega que os critérios para revisão extraordinária devem prever situações imprevisíveis ou não gerenciáveis pelo transportador, e que impactem o equilíbrio econômico-financeiro da atividade.
WACC. As transportadoras também tentam emplacar na resolução uma nova metodologia para cálculo do custo médio ponderado de capital, usado como taxa de remuneração do capital no cálculo de suas receitas.
A minuta de resolução proposta pela ANP diz que a RMP das transportadoras considerará, dentre os componentes e premissas, o WACC – sem entrar no detalhe sobre sua metodologia. A ATGás tenta, então, delimitá-la no texto.
A metodologia atual é considerada defasada pelas transportadoras, que apresentaram na revisão tarifária uma proposta conjunta de 9,41% (real e depois de impostos) para novos investimentos no ciclo 2026-2030.
Não há, aí, uma oposição clara dos usuários ao debate sobre o WACC neste momento. Entidades como o IBP (produtores) e Fórum do Gás (em sua maior parte consumidores industriais) defendem, inclusive, a antecipação da discussão sobre a taxa de remuneração dos novos investimentos, descolando-se, assim, a definição do WACC da revisão tarifária – o que permitiria adiá-la.
Conta Regulatória e tarifaços
Outro ponto de atenção – tanto dos transportadores quanto dos usuários – diz respeito às novas regras para uso da Conta Regulatória.
O CdU prega mais transparência na apuração da conta e pede a publicidade mensal de seu saldo.
E que a nova resolução garanta, explicitamente, que os saldos sejam prioritariamente destinados à modicidade tarifária no ano seguinte ao ano de sua apuração, com restrição objetiva ao uso do saldo para investimentos – salvo quando houver justificativa clara de impacto na redução tarifária.
- Relembre: A minuta define que o saldo da conta poderá ser revertido, a critério da ANP, em investimentos na infraestrutura de transporte e nas tarifas de transporte – ou ser destinado a outros fins. Ou seja, deixa um campo aberto nesse sentido;
- a ANP também propõe que o saldo da conta regulatória de determinado ano do ciclo tarifário possa ser convertido, total ou parcialmente, em entrada para a receita em períodos subsequentes – na regra atual, o saldo deve ser reconciliado no intervalo de dois anos.
As transportadoras também defendem o uso do saldo no ano seguinte à apuração.
Mas sugerem que a conta também passe a compensar as diferenças entre valores projetados e realizados referentes às remunerações por investimentos e/ou aos gastos de operação e manutenção (O&M) e gastos gerais e administrativos (G&A).
A ATGás também propõe mudanças na regra proposta pela ANP para evitar novos tarifaços ocasionados por frustração de demanda.
- Relembre: pelos termos da minuta, a tarifa de referência (estimada no início da oferta de capacidade) não será mais recalculada (para cima), ao longo do processo, se a demanda projetada não se confirmar;
- Nesse caso, o transportador poderá recuperar suas receitas frustradas, até o limite da RMP, por meio dos produtos de curto prazo.
A ATGás defende que essa recomposição seja feita prioritariamente com o saldo da conta regulatória no mesmo ano.
As transportadoras também querem ampliar o rol das hipóteses de recuperação insuficiente de receita (suscetíveis à recomposição por meio da conta): como a inadimplência não coberta por garantias contratuais.
Usuários pedem multiplicadores mais baixos
As tarifas seguem uma lógica de incentivo à contratação firme e as transportadoras cobram pelos produtos de curto prazo um adicional (multiplicador) sobre a tarifa base. Hoje, esses multiplicadores são:
- de 1,6 vez para contratos diários;
- de 1,48 vez para a contratação mensal;
- e de 1,23 vez para a trimestral.
A minuta de resolução proposta pela ANP fixa um intervalo para os multiplicadores:
- de 1,5 a 1,75 vez para contratos diários;
- e de 1 a 1,5 vez para a contratação mensal, trimestral ou flexível
Ou seja, como os valores atualmente praticados estão dentro do intervalo proposto, a nova resolução dá margem tanto para reduções quanto para aumentos.
O CdU defende, nesse ponto, que as propostas tarifárias para os produtos de curto prazo fossem acompanhadas do racional de cálculo para os multiplicadores, bem como a homogeneidade entre as diferentes transportadoras.
Produtores como Shell, Galp e Equinor, além de grandes consumidores como Yara Fertilizantes, pedem a redução dos multiplicadores, enquanto a CSN sugere multiplicadores diferenciados por ponto e por nível de utilização da rede, com revisão periódica e transparência na metodologia.
Petrobras e Equinor, por sua vez, sugeriram a inclusão, em resolução, de novos produtos como o intradiário – de olho na demanda das termelétricas flexíveis. Uma modalidade de contratação firme da capacidade com início de vigência e fim dentro de um mesmo dia.
O pleito encontra eco entre as transportadoras, que também sugerem um produto bimestral.
A ATGás propõe que, para fins de atendimento ao perfil flexível de demanda dos usuários, outros limites possam ser adotados, desde que propostos pelo transportador e aprovados pelo regulador.
GÁS NA SEMANA
PNIIGB. O novo Plano Nacional Integrado das Infraestruturas de Gás Natural e Biometano, colocado em consulta pública pela EPE, reúne 13 projetos considerados prioritários para ampliar a oferta de gás natural e biometano, além de mitigar gargalos e expandir a malha integrada de gasodutos no país.
- Juntos, somam R$ 42 bilhões em investimentos. A lista inclui um novo gasoduto de escoamento para o pré-sal; a interiorização do gás para o Triângulo Mineiro; e a conclusão do projeto de integração com Argentina via Uruguaiana (RS). Conheça todos os projetos
Midstream. A PetroReconcavo concluiu a aquisição de 50% dos ativos de infraestrutura de gás natural da Brava Energia no complexo de Guamaré (RN).
UTE Brasília. O deputado federal, Reginaldo Veras (PV/DF), afirmou que a sigla está preparada para acionar o STF caso o projeto da térmica a gás da Termo Norte na capital do país obtenha a licença ambiental.
Biometano. A Cocal iniciou a operação de sua segunda planta. Localizada em Paraguaçu Paulista (SP), tem capacidade para produzir até 60 mil m³/dia.
Rota alternativa pelo Ártico. A Rússia está intensificando o uso da Rota Marítima do Norte como alternativa ao Canal de Suez e para driblar sanções ocidentais. O corredor acompanha a costa ártica russa e tem sido essencial para o escoamento de petróleo e GNL em direção à China e Europa.
Hub de hidrogênio. A UK Oil & Gas assinou um memorando de entendimento com a National Gas Transmission para desenvolver um gasoduto totalmente dedicado ao hidrogênio no Reino Unido.