Gás Natural

O interesse nacional versus local na classificação de gasodutos da ANP

Agência abre debate com os agentes do mercado sobre os critérios técnicos para classificação de gasodutos de transporte

Mercado brasileiro ganha opções de contratos de curto prazo em 2023. Na imagem: Trabalhadores em planta de gasodutos da Comgás; Um homem e uma mulher caminham com uniformes azuis com faixas de proteção amarelas fluorescente, capacetes e óculos de proteção e protetores auriculares (Foto: Divulgação)
(Foto: Divulgação Comgás)

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Editada por André Ramalho
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PIPELINE ANP abre debate sobre critérios técnicos para classificação de gasodutos, na tentativa de harmonizar conflitos federativos sobre o assunto. Agentes de mercado divergem, contudo, se o interesse nacional deve, de fato, prevalecer sobre o local.

Química e fertilizantes terão oferta prioritária de gás da União no Gás para Empregar. Forma como gas release será executado ainda não está clara para diretoria da ANP, que adia divulgação de estudos sobre a concentração de mercado. E mais. Confira:

Como classificar um gasoduto?

A ANP abriu esta semana o debate com os agentes do mercado sobre os critérios técnicos para classificação de gasodutos de transporte. Assunto recém-incluído na agenda regulatória da agência e alçado a uma das prioridades do regulador para 2023.

A ideia, de acordo com o diretor Cláudio Jorge, é acelerar a elaboração da Análise de Impacto Regulatório (AIR) e colocá-la em consulta pública – juntamente com a minuta de resolução que tratará do tema – em junho.

Por que o assunto importa? Ao definir critérios técnicos para a classificação de gasodutos, a expectativa da ANP é conseguir harmonizar os conflitos federativos entre as regulações e legislações estaduais e federais sobre o assunto – e que alimentam, hoje, um clima de insegurança para investidores.

Regras de estados como São Paulo, Rio Grande do Norte e Ceará, para classificação de redes de distribuição, entram em conflito, hoje, com a Nova Lei do Gás, federal.

O que está em jogo? Existe, hoje, um caso concreto e emblemático sobre esse conflito de competências: o gasoduto Subida da Serra, da Comgás, cuja classificação é alvo de um imbróglio entre a ANP e a Arsesp, agência estadual de São Paulo.

Um breve resumo: o projeto foi classificado como ativo de distribuição e incorporado pela Arsesp na concessão da Comgás em 2020 (antes da Nova Lei do Gás), sob protestos de transportadoras e consumidores.

Em 2021, a ANP entendeu que o Subida da Serra deveria ser um gasoduto de transporte, sujeito à regulação federal e, em tese, retirado da base da distribuidora. E decidiu judicializar o decreto editado pelo então governo de João Dória (PSDB) que tratava da classificação das redes de distribuição.

Em paralelo à regulamentação dos critérios para classificação dos gasodutos, a ANP tenta encerrar a disputa com a Arsesp – a proposta de acordo, contudo, ainda não foi votada pela diretoria do regulador federal.

O que diz a lei

Pela Nova Lei do Gás, são gasodutos de transporte:

  1. gasodutos de importação (ou exportação) de gás de outros países;
  2. gasodutos interestaduais;
  3. gasodutos que interliguem uma fonte de suprimento (UPGN, terminal de GNL ou instalação de estocagem subterrânea) a outro gasoduto de transporte;
  4. gasodutos que interliguem um gasoduto de transporte a outro do mesmo tipo;
  5. e gasoduto cujas características técnicas de diâmetro, pressão e extensão superem limites estabelecidos em regulação da ANP.

É sobre esse último ponto que a ANP está se debruçando.

A agência avalia, justamente, como traçar uma régua sobre os limites de diâmetro, pressão e extensão. A discussão, introduzida em workshop com os agentes do mercado na quarta-feira (26/4), promete ser quente.

O interesse local versus o interesse nacional

O decreto 10.712/21, que regulamenta a Nova Lei do Gás, abre espaço para que a ANP flexibilize a classificação de um determinado gasoduto de transporte desde que:

  • o projeto em questão não implique potencial impacto ou conflito com estudos de planejamento e com os planos coordenados de desenvolvimento do sistema de transporte, existentes ou em elaboração;
  • e que a influência do projeto esteja restrita exclusivamente ao interesse local.

E aí entra o pano de fundo da discussão toda: onde termina um interesse local e onde começa um interesse nacional?

A bandeira do sistema integrado

As transportadoras defendem um modelo de mercado que priorize um sistema integrado.

Criticam a criação de “ilhas de gás”, ou seja, o desenvolvimento de projetos desconectados da malha de transporte que atendam ao interesse somente local – ou de determinados agentes – e que “aprisionam” a molécula à fonte de suprimento de um único projeto, limitando a competição e alternativa de suprimento a outros agentes.

“É fundamental que todas as fontes de suprimento se conectem à rede de transporte. Isso traz maior segurança  e eficiência ao sistema”, afirmou a gerente Jurídico e Regulatório da ATGás, Marina Cyrino, durante o workshop da ANP.

Para os transportadores, o limite de pressão deveria ser o principal parâmetro técnico para caracterização de um gasoduto de transporte. Esse entendimento simplificaria o processo: dutos de alta pressão são de transporte, enquanto redes de distribuição se limitam a projetos de baixa e média pressão, por exemplo.

A ATGás ressalva, no entanto, que os parâmetros de pressão, diâmetro e extensão só devem ser considerados se os demais critérios definidos em lei não forem suficientes.

A visão das transportadoras, de que a regulação precisa privilegiar sempre um sistema integrado a mercados desconectados, é acompanhada por produtores.

Para a diretora de Gás do IBP, Sylvie D’Apote, mais importante do que definir atributos técnicos (como pressão, diâmetro e extensão) é que a classificação dos gasodutos seja orientada pelo desenho de mercado proposto pela Lei do Gás: um mercado amplo e aberto, amparado por uma rede de transporte nacional onde oferta e demanda se encontram e no qual a molécula, independente de sua origem, possa fluir por todo o território nacional.

Ela defende que a ANP assuma então a posição de “guardiã” desse modelo – e que este desenho (e o interesse do mercado nacional) “prevaleça sobre as particularidades que podem aparecer na regulação estadual”.

Dentro dessa mesma linha, o Fórum do Gás, grupo de 18 associações empresariais de diferentes elos da cadeia, também defende a ANP como árbitra das controvérsias.

Mesmo peso, mesma medida

 As distribuidoras alegam, por sua vez, que a visão de que interesses nacionais devem se sobrepor aos locais não cabe no debate.

Ancorada no artigo 25 da Constituição (cabe aos estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado), a Abegás argumenta que os estados têm, sim, competência para classificar gasodutos de distribuição – e que regulações federais e estaduais têm, portanto, o mesmo peso.

Uma das preocupações da Abegás é quanto à definição de limites de pressão para a classificação dos projetos. Argumenta que, não fossem os investimentos feitos pelas distribuidoras em redes de alta pressão, o mercado brasileiro não teria se desenvolvido no mesmo ritmo.

Segundo a Abegás, existem hoje cerca de 3 mil km de redes de distribuição de alta pressão já instaladas. “Que não se tenha discussão sobre essas redes”, defendeu o diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, Marcelo Mendonça.

A Abegás alega que determinados consumidores industriais, com consumos elevados, podem demandar redes de alta pressão. E atender aos clientes finais é uma prerrogativa das distribuidoras, lembra.

A Associação Brasileira de Agências de Regulação (Abar) acompanha essa visão. Prega que a classificação deve levar em consideração a função finalística do projeto (uma rede de distribuição é aquela que atende aos consumidores finais, por exemplo), e não limites técnicos de diâmetro, pressão e extensão.

A Abegás lembra ainda que alguns mercados, como o do Sul, convivem com gargalos de suprimento ainda não resolvidos integralmente pelas transportadoras e que o mercado brasileiro carece de investimentos na interiorização da malha de transporte.

“Gasoduto de transporte não pode ser gargalo para desenvolvimento do mercado”, afirmou Mendonça.

GÁS NA SEMANA

Química e fertilizantes terão oferta prioritária de gás da União. Secretário de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, Pietro Mendes, afirmou que os dois segmentos serão incluídos como setores prioritários no Gás para Empregar. O programa virá acompanhado por mudanças legislativas para permitir o swap (permuta) de óleo da União por volumes adicionais de gás natural a serem ofertados por meio da PPSA. (epbr)

Forma como gas release será executado ainda não está clara para a ANP. A escolha do mecanismo que a agência usará num eventual Programa de Redução de Concentração da oferta é o principal desafio a ser enfrentado na discussão sobre o gas release, na avaliação de diretores do regulador. A pedido do relator Cláudio Jorge, o diagnóstico da agência sobre a concentração do setor foi retirado da pauta da reunião de colegiado desta quinta. (epbr)

Petrobras adia entrada em operação de três plataformas. A data do início da produção de Búzios 7 foi postergada de 2024 para 2025; o projeto Integrado Parque das Baleias  passou de 2024 para 2025; e Búzios 10 de 2026 para 2027. (epbr)

Diamante Energia busca alternativas ao carvão e mira gás. Controladora do Complexo Termelétrico Jorge Lacerda (SC) terá de se preparar para o fim das operações a carvão após 2040 e aposta na captura e armazenagem de carbono (CCS) e na geração a gás natural como vetores de sua estratégia de transição. Companhia mira, ainda, oportunidades na indústria de fertilizantes nitrogenados. (epbr)

Gasmig inicia operação de posto em corredor de GNV. Distribuidora mineira inaugurou o 63º posto revendedor de gás veicular de seu projeto Corredores de GNV. Até 2025, a previsão é que mais 14 postos sejam inaugurados no estado. (epbr)

UE cria plataforma de compra conjunta de gás com 80 empresas. Objetivo é conseguir obter preços mais baixos para a importação do gás. Licitações começam em maio. (Valor)