NESTA EDIÇÃO. Brasil pretende colocar em foco agenda do financiamento climático para economias médias durante presidência do Brics em 2025.
É preciso contabilizar os esforços que já estão sendo feitos por países como Brasil, China e Índia, diz embaixador.
Bloco reúne economias dependentes de carvão e grandes produtores de óleo e gás e tem grandes desafios pela frente.
EDIÇÃO APRESENTADA POR
Formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, além das recentes entradas de Egito, Etiópia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Irã, o Brics é um grupo de países que têm enormes problemas de transição energética, mas oferecem oportunidades de investimentos na nova economia, disse nesta terça (10/12) o Embaixador e secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores (MRE), André Corrêa do Lago.
Índia, China e África do Sul, por exemplo, são países que ainda têm uma alta dependência de carvão na geração de energia e processos industriais, apesar de estarem avançando em direção às renováveis.
Enquanto os novos entrantes, além da Rússia, são importantes players no mercado de óleo e gás – o bloco agora soma quase metade da produção mundial de petróleo, com cerca 42 milhões de boe/dia, segundo o Departamento de Energia dos EUA (EIA).
“A mudança do clima já se transformou no centro da discussão econômica, porque todos os países têm que mudar sua economia para se adaptar. Nesse esforço, o grupo do Brics é absolutamente essencial por serem países que têm desafios muito maiores que o Brasil, mas também têm circunstâncias de investimentos excepcionais”, diz o secretário do MRE.
Dados da BloombergNEF apontam que, pela primeira vez, mercados emergentes, sem a China, superam a marca de US$ 100 bilhões em investimentos renováveis, liderados por Brasil, Índia, Turquia, Vietnã e Taiwan.
Segundo Corrêa do Lago, o Brasil buscará um diálogo coerente com o Brics em busca de soluções de financiamento para a transição. Para o embaixador, é preciso contabilizar melhor o quanto essas nações já investem no combate à mudança do clima.
“Isso não é contabilizado da maneira como deveria. Por exemplo, quando pensamos no combate ao desmatamento no Brasil, 90% dos recursos vêm do orçamento da União. As pessoas de fora ficam achando que o dinheiro vem de ajuda internacional”.
Acompanha um histórico de negociações que buscam fortalecer a posição desses países na corrida verde.
Em outubro, a cúpula do Brics sob a presidência russa terminou com uma declaração reforçando a rejeição do bloco às barreiras que vêm sendo impostas pela União Europeia sob o selo “verde” e marcou posição de países com reservas de minerais críticos à transição energética e petróleo em relação aos conflitos armados (condena Israel e ignora Ucrânia) e guerras comerciais.
Já em 2023, primeiro ano do governo Lula III, o presidente brasileiro defendeu, na África do Sul, que os países Sul Global aproveitem sua posição estratégica como fornecedores de insumos para transição energética e se organizem para negociar em pé de igualdade com as nações industrializadas.
‘Investíveis’
Em janeiro de 2025, o Brasil assume a presidência rotativa do Brics, ao mesmo tempo em que sedia a COP30, em Belém, no Pará, com o desafio da implementação dos objetivos do Acordo de Paris.
Citando o exemplo da força-tarefa de Clima que a presidência brasileira do G20 criou este ano para unir bancos centrais, ministros da Fazenda e de Meio Ambiente para discutir financiamento, o Corrêa do Lago avalia que o Brasil conseguiu colocar em foco o desafio de trazer recursos para países de renda média, que estão crescendo à base de combustíveis fósseis, mas têm muitas oportunidades para investimentos em renováveis.
“Quando se fala em países em desenvolvimento, a preocupação maior é com os países mais pobres, que não só não contribuíram em nada para a mudança do clima, porque têm emissões mínimas, como também não têm recursos para desviar seu crescimento para uma direção mais sustentável. Acaba que a lógica do financiamento é voltada para esses países que não têm condições de atração de investimentos”, explica.
Algo que não se aplica aos membros do Brics. “Brasil, Índia, África do Sul, nós não precisamos de caridade internacional. Precisamos de investimentos porque nossos países muito ‘investíveis’, me perdoem o português estranho”.
O embaixador participou nesta tarde de um seminário na Comissão de Transição Energética da Câmara sobre a meta climática brasileira para 2035 (NDC, em inglês) – apresentada em novembro de 2024, na COP29.
E disse que a NDC brasileira está mais para uma plataforma de investimentos.
“É uma maneira de se apresentar ao mundo e dizer o que o Brasil pode fazer no combate à mudança do clima. Que modelo de desenvolvimento o Brasil pode e decidiu escolher, porque tem mais de 120 programas que já vão na direção certa”.
Na retrospectiva 2024:
Curtas
Futuro de Angra 3 adiado. A decisão sobre o destino da usina nuclear de Angra 3 ficou para janeiro de 2025. Estava na pauta da reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) desta terça (10/12), mas um pedido de vistas coletivo postergou a discussão para reunião extraordinária no fim de janeiro. Veja detalhes
Distribuidoras longe da meta. Distribuidoras de combustíveis aposentaram, até 9 de dezembro, cerca de 28 milhões de Créditos de Descarbonização (CBIOs), o que corresponde a 60,5% do total das metas individuais estabelecidas para 2024 na política do RenovaBio (46,3 milhões de títulos), de acordo com a ANP. O prazo para aposentadoria encerra em 31 de dezembro.
Das eólicas para o carvão. As alterações feitas por Weverton Rocha (PDT/MA) no projeto de lei das eólicas offshore no Senado Federal (PL 576/2021) abrem uma brecha para usinas a carvão mineral do Nordeste buscarem equiparação na emenda da renovação dos contratos. Ou “isonomia” com o benefício dado à região Sul, avalia o presidente da Energia Pecém, Carlos Baldi. Isso porque as emendas autorizam a renovação dos contratos de térmicas movidas a carvão nacional.
Créditos ilegais. A Polícia Federal apreendeu e bloqueou, na segunda (9), bens avaliados em quase R$ 1 bilhão pertencentes a uma organização criminosa suspeita de vender ilegalmente créditos de carbono de áreas da União. As ações mais recentes de investigação revelaram que servidores do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) que ocupavam cargos estratégicos e de direção facilitavam a emissão de licenças fraudulentas, a suspensão de multas e autorizações irregulares para desmatamento. (G1)
Combustão europeia. O maior grupo político do Parlamento Europeu, Partido Popular Europeu (PPE), de centro-direita, está montando uma campanha para flexibilizar as regras de banimento dos motores a combustão no bloco. Segundo a Reuters, o documento que será publicado na quarta (11) alega que a proibição de vendas de carros novos emissores de CO2 pela União Europeia até 2035 “deveria ser revertida”, para permitir motores que funcionam com biocombustíveis.
Destinação de resíduos. Apenas 58,5% dos resíduos sólidos urbanos gerados em 2023 foram encaminhados para destinação ambientalmente adequada, aponta levantamento da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema). Enquanto isso, 41,5% do que foi descartado pelos brasileiros e encaminhado para disposição final tiveram destinação inadequada, como os lixões, que receberam 35,5% dos resíduos gerados no país. (Agência Brasil)
Eletrificação para o carbono zero. O grupo de automação Schneider Electric alcançou o selo Zero CO2 para a sua fábrica em Blumenau (SC), após concluir, em novembro deste ano, a transição para processos 100% eletrificados em fornos, compressores e demais equipamentos industriais, eliminando o uso de combustíveis fósseis. Desde 2021, toda a eletricidade utilizada no local é proveniente de fontes 100% renováveis e investimentos em eficiência energética permitiram à fábrica reduzir em 20% o consumo de energia.