NESTA EDIÇÃO. BloombergNEF aponta que há mais de mais de US$ 200 bilhões em empréstimos não desembolsados sob risco de serem redirecionados de tecnologias de baixo carbono para combustíveis fósseis.
Volta de Trump à presidência dos EUA chega embalada em campanha pró-exploração de petróleo e ataque a renováveis.
Ao mesmo tempo, analistas enxergam que será difícil conseguir apoio, mesmo entre os Republicanos, para desmantelar subsídios do governo Biden à transição energética.
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O retorno, a partir de 20 de janeiro de 2025, do republicano Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, segundo maior emissor global de gases de efeito estufa, é mais um fator de alerta para quem está preocupado com a crise climática – apesar de ter deixado o mercado financeiro animado com a notícia.
Durante a campanha para o novo mandato de quatro anos, Trump resgatou o slogan “Drill, baby, drill”, para deixar claro que sua política será de incentivo à exploração de combustíveis fósseis, ao mesmo tempo em que passou a prometer redirecionar recursos destinados à indústria de baixo carbono por políticas como a IRA (alcunhadas de “new green scam” pelo novo presidente eleito).
Mapeamento da BloombergNEF (BNEF) aponta que há mais de US$ 200 bilhões sob risco no Escritório de Programas de Empréstimos do Departamento de Energia (DoE). São recursos para tecnologias de redução de carbono que ainda não foram comprometidos e que poderão ir para os fósseis com a mudança de gestão.
Indícios inquietantes para um mundo que já está fora do caminho para limitar aumentos de temperatura catastróficos e enfrenta enormes desafios na hora de fazer com que o dinheiro chegue aos projetos de mitigação.
É também um momento delicado para as negociações de acordos internacionais relacionados à mudança do clima: basta lembrar que em 2020, em meio à corrida pela reeleição, Trump retirou os EUA do Acordo de Paris.
O republicano também tem prometido reduzir regulações ambientais para permitir maior produção e menores preços de energia.
No entanto, mesmo durante a gestão de Joe Biden – que ajudou a garantir o primeiro acordo global para a transição para longe dos combustíveis fósseis na COP28, em Dubai – a produção de petróleo esteve em alta.
Ainda de acordo com a BNEF, a produção de óleo dos EUA saltou 24% nos últimos quatro anos e aumentará outros 6% para 14,1 milhões de barris por dia até 2026. Isso é mais do que a produção diária do Iraque, Irã, Kuwait, Nigéria e Venezuela — combinados.
Além disso, o DoE projeta dobrar as exportações de gás natural liquefeito até 2030.
Como fica a IRA?
Sancionada em 2022, a Lei de Redução da Inflação (IRA, em inglês) proposta pelo governo Biden e aprovada pelo Congresso dos EUA, com apoio de Democratas e Republicanos, prevê mais de US$ 300 bilhões em incentivos para a indústria de baixo carbono.
Vale para renováveis, como solar e eólica, mas também para eficiência energética, veículos elétricos, baterias, e projetos de hidrogênio e captura de carbono – inclusive de petroleiras.
A intenção era atrair investimentos na cadeia produtiva estadunidense e tem mostrado resultados. Até agosto de 2024, a Casa Branca calculava US$ 900 bilhões em anúncios de investimentos do setor privado em energia limpa e manufatura desde a eleição de Biden, dos quais US$ 265 bilhões aproximadamente foram pós-sanção da IRA.
É um volume de recursos e postos de trabalho (estimados em 330 mil) que será difícil de ignorar, mesmo por uma gestão que negue a crise climática e a necessidade de fontes mais limpas de energia.
Ainda assim, uma análise publicada pela DNV em setembro observava que o resultado das eleições teria efeitos significativos e mensuráveis na trajetória da transição energética.
“Não é realista acreditar que, independentemente do resultado da eleição, o progresso feito por meio de iniciativas como o Inflation Reduction Act (IRA) e os avanços no clima e na tecnologia limpa permanecerão intocados”.
Não significa, porém, que ela será revogada ou reduzida, até porque tem impactos positivos em regiões republicanas. O que se espera é uma transformação.
Na visão dos analistas, é possível que veículos elétricos percam tração – já que são impopulares entre os Republicanos. Mas tecnologias como hidrogênio a partir da reforma do gás natural com captura de carbono podem ganhar força, por serem de interesse das petroleiras.
Copo meio cheio
Os temores dos investidores de uma reversão sob Trump fizeram as ações de energia limpa caírem acentuadamente na quarta-feira. O índice MAC Global Solar Energy (.SUNIDX) caiu 10%, enquanto as ações da principal desenvolvedora e proprietária de projetos renováveis NextEra Energy (NEE.N) caiu 6,2%. (Reuters)
As ações de grupos europeus de energia limpa também despencaram nesta quarta, em meio a preocupações com o desmantelamento de políticas climáticas. Trump prometeu, por exemplo, abandonar projetos eólicos offshore por meio de uma ordem executiva em seu primeiro dia no cargo.
Apesar dessa reação dos investidores, entre os analistas, prevalece a leitura de que uma lei que oferece uma década de subsídios lucrativos para novos projetos de energia renovável é quase impossível de revogar, graças ao apoio dos estados republicanos, enquanto outras promessas de campanha de Trump teriam impacto marginal em termos de atração de novo capital.
“Os estados liderados por republicanos e democratas estão vendo os benefícios da fabricação e implantação de energia eólica, solar e de baterias graças aos bilhões de dólares em investimentos liberados pela Lei de Infraestrutura Bipartidária e pela Lei de Redução da Inflação”, comenta Dan Lashof, diretor dos EUA do World Resources Institute.
“Governadores e representantes no Congresso de ambos os lados do corredor reconheceram que a energia limpa é uma grande fonte de dinheiro e criadora de empregos. O presidente Trump enfrentará um muro bipartidário de oposição se tentar acabar com os incentivos de energia limpa agora”, completa.
Além disso, a demanda crescente por eletricidade e os compromissos corporativos com descarbonização indicam que o mercado de renováveis seguirá em expansão.
Segundo projeções da Wood Mackenzie, a demanda de eletricidade nos Estados Unidos deve aumentar pela primeira vez em décadas, com um crescimento de até 15% em algumas regiões nos próximos cinco anos.
Cobrimos por aqui
Curtas
P20. Começou nesta quarta (6) a 10ª Cúpula de Presidentes dos Parlamentos do G20 (P20), com encontros no Senado e na Câmara dos Deputados, em Brasília. Entre os temas e grupos de trabalho estão: combate às desigualdades de gênero e raça e a promoção da autonomia econômica das mulheres; ampliação da representatividade feminina em espaços decisórios; e a promoção da justiça climática e do desenvolvimento sustentável sob a perspectiva de gênero e raça. (Agência Senado)
9,3 GW de expansão. Com a implantação de 256 usinas no Brasil, nos últimos 10 meses, a expansão da matriz elétrica caminha para recorde em 2024, segundo a Aneel. As unidades geradoras que entraram em operação até 31 de outubro somaram 9.353,76 megawatts (MW) de potência fiscalizada, com o maior saldo registrado em outubro (1.533,88 MW, em 39 novas usinas). Mais de 90% da potência instalada é solar fotovoltaica (48,59%) e eólica (41,43%).
Geração distribuída. A EDP anunciou nesta quarta-feira (6/11) a aquisição de 16 usinas fotovoltaicas por R$ 218 milhões. As plantas pertencem ao grupo Tangipar e têm uma capacidade instalada de 44,3 megawatts pico (MWp). Os empreendimentos são voltados para a geração distribuída e estão localizadas nos estados da Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná.
Descarbonização da indústria. Entidades representativas da indústria e empresas têm até sexta-feira (8) para apresentar os temas que considerem prioritários de descarbonização para possível inclusão na Manifestação de Interesse do Brasil ao Climate Investment Funds (CIF), no programa de descarbonização da indústria. Os setores alvo são cimento e concreto; ferro e aço; transporte marítimo; produtos químicos; parques ecoindustriais; celulose e papel; vidro; cerâmica e materiais de construção; metais não ferrosos; têxteis e cadeias de suprimentos de tecnologia limpa.
Solar na iluminação pública. A Quantum Engenharia venceu a concorrência para PPP de iluminação pública em Garopaba (SC), em um contrato que inclui a implantação de um sistema de geração de energia fotovoltaica para o município. Além de substituir as lâmpadas tradicionais por LED, que consomem menos energia, serão instaladas usinas fotovoltaicas de geração distribuída para compensação de créditos de energia das unidades consumidoras de responsabilidade de Garopaba.