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Diálogos da Transição
APRESENTADA POR
Editada por Nayara Machado
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Depois de duas longas semanas – ou três, se considerarmos os dias de alvoroço que antecederam o evento – a 28° Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28) chegou ao fim nesta quarta (13/12), com um dia de atraso e algumas notícias positivas para quem está apostando em um novo sistema energético.
Além dos compromissos de triplicar a capacidade renovável até 2030 e dobrar a eficiência energética, COP de Dubai foi a primeira a conseguir algum avanço em relação ao apelo para a transição de combustíveis fósseis para fontes com menor impacto sobre o clima global – apesar dos temores de que a cúpula fosse dominada pela agenda do petróleo.
Entre “eliminação gradual (phase out, em inglês) dos combustíveis fósseis” e “atacar as emissões, não a energia”, os negociadores conseguiram um meio termo, com a “transição para longe” (transitioning away from).
É menos ambicioso do que eliminar, mas um pouco mais incisivo do que a versão divulgada na segunda (11).
Já o trecho que trata de subsídios, foi enfraquecido pela palavra “ineficiente”: o GST convoca as partes a “eliminar subsídios ineficientes para combustíveis fósseis que não enderecem pobreza energética ou transição justa, o mais rápido possível”.
Isso significa, por exemplo, que subsídios às termelétricas fósseis podem ser considerados eficientes, sob a justificativa de que elas levam energia a regiões que, de outra forma, estariam excluídas do sistema energético.
A linguagem para o carvão também recuou em relação ao acordado na COP27, e voltou para o estágio da COP26, de 2021. Agora, o compromisso é “reduzir a produção de carvão não mitigada”.
O encontro começou em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, no dia 30 de novembro, sob forte pressão para abordagens mais robustas em relação aos combustíveis no documento final, o Global Stocktake (GST).
GST é um balanço do que foi feito desde o Acordo de Paris até agora para frear o aquecimento do planeta. O texto (.pdf) aprovado pela COP28 reconhece a insuficiência das ações e indica o que deve ser feito para ser suficiente.
Um dos pontos celebrados entre os negociadores e observadores é o alinhamento com 1,5°C até 2100 – limite defendido por cientistas.
Artigo 6
Por outro lado, a regulamentação do trecho do Acordo de Paris que trata dos mercados de carbono não conseguiu avançar. Os meses de preparação e as duas semanas de negociações resultaram em zero acordo.
Aqui, a divisão é entre países que exigem que os mercados de carbono estejam disponíveis sem restrições e países que insistem em manter transparência, direitos humanos e ambição climática. Para os analistas da Carbon Market Watch (CMW), não ter acordo, neste caso, evitou o pior.
“A falta de um acordo sobre o Artigo 6 evita replicar os erros do mercado voluntário de carbono e enviar o sinal errado para empresas e países que procuram contornar suas responsabilidades climáticas”, comenta Gilles Dufrasne, líder de políticas em mercados de carbono globais na CMW.
A COP26 em Glasgow, em 2021, estabeleceu os princípios gerais para dois tipos de mercados de carbono: Artigo 6.2, que trata de acordos bilaterais ou multilaterais de comércio de emissões entre países, e Artigo 6.4, prevendo a criação de um mercado global de carbono supervisionado por uma entidade das Nações Unidas.
Jonathan Crook, especialista em políticas na CMW, explica que o texto proposto em Dubai para o Artigo 6.2 falhava em impor limites à quantidade de informações que os países poderiam designar como “confidenciais”.
Além do direito ao sigilo completo, o acordo proposto deixava aberta a porta para que os países pudessem ignorar certas regras do Artigo 6 sem enfrentar consequências.
No caso do Artigo 6.4, a COP28 deveria fornecer clareza sobre três tópicos: autorização de unidades, interconexão entre os registros 6.2 e 6.4, e elegibilidade para evitar emissões e aumento da conservação.
Além disso, este ano foi a segunda tentativa de tornar as metodologias e orientações sobre remoções de carbono operacionais. Também não aconteceu.
A falta de acordo significa que a operacionalização do mercado do Artigo 6.4 provavelmente será adiada por pelo menos mais um ano, até a COP29.
- Opinião: Como fica o mercado de carbono depois da COP28? Brasil continua ocupando uma posição muito privilegiada no presente e futuro mercados de comercialização de carbono, escreve Tatiana Cymbalista
Rumo à COP30
As próximas duas COPs serão decisivas em vários aspectos. A COP29, marcada para novembro de 2024 no Azerbaijão, terá como missão definir os meios de implementação do que foi indicado no GST.
A COP30 no Brasil, por sua vez, será o momento de atualização das NDCs (contribuições climáticas definidas individualmente por cada país) para refletir o que vem sendo acordado até então.
“Os resultados da COP28 deixam mais claros o tamanho do desafio desta corrida de dois anos até a COP30”, afirma Maria Netto, diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade (iCS).
“A construção de agenda demandará colaboração e participação ampla domesticamente, e também demandará um amadurecimento das relações do Brasil com outros países do Sul Global – não só pelo governo, mas pela sociedade civil, academia e setor empresarial”, avalia.
O iCS destaca três desafios que o Brasil terá de enfrentar para que a COP30, em Belém (PA), entregue resultados alinhados com 1,5°C: mensagem clara, organização e agenda que atenda a urgência de países vulneráveis.
Para o instituto, o país enviou mensagens contraditórias na agenda climática ao longo das últimas semanas em Dubai.
Por um lado, fez anúncios positivos, como a proposta de um fundo global para financiar a conservação de florestas tropicais e o plano de transformação ecológica. Por outro, causou um incômodo com a decisão de ingressar na Opep+.
“Mesmo atuando pelo consenso e deixando claro o seu compromisso com o Acordo de Paris, ao abrir mão de liderar propostas mais concretas para desafios de negociação caros aos países em desenvolvimento, como adaptação à mudança do clima, o país pareceu estar isolado na conferência de Dubai”, observa Netto.
No desafio de organização, um ponto sensível é a participação da sociedade civil. A COP28, em Dubai, recebeu críticas por não permitir maior espaço para manifestações, uma forma de aliviar a pressão sobre as negociações por uma maior ambição.
“O governo brasileiro deve criar estruturas claras para participação ativa da sociedade civil desde já, considerando a diversidade dos movimentos no Brasil, mas também no mundo – especialmente com o envolvimento dos países da América Latina”, completa a diretora do iCS.
Cobrimos por aqui:
- COP28 aprova transição para longe dos fósseis no mesmo dia em que Brasil amplia exploração
- COP28: Mundo está próximo do ponto de não retorno?
- COP28 começa com acordo para remediar perdas e danos em países pobres
- Brasil vai à COP28 apegado ao controle do desmatamento, mas distante do Acordo de Paris
Curtas
COP29 x G20
Mais de 60 organizações da sociedade civil e Grupos de Engajamento do G20 enviaram uma carta ao governo brasileiro demonstrando “profunda preocupação” com a potencial sobreposição de datas entre a COP29 e a Cúpula de Líderes do G20 em novembro de 2024.
O documento, que também teve adesão da cidade de São Paulo, aponta que a ocorrência simultânea dos eventos limita a participação da sociedade. A cúpula do G20, presidida pelo Brasil, está marcada para 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro.
Homens, jovens, ricos e otimistas
Os homens são mais otimistas sobre o surgimento de novas tecnologias em uma economia de baixo carbono do que as mulheres, de acordo com uma pesquisa da CNI. Apenas 12% delas concordam muito com esse possível impacto, abaixo dos 22% na opinião deles.
Entre os brasileiros de 16 a 24 anos, 21% concordam muito com essa perspectiva. O percentual cai para 16% entre 25 e 40 anos e 15% entre 41 e 59 anos. Acima de 60 anos, 17% concordam muito com a afirmação. Além disso, aponta que as COPs são desconhecidas por 76% dos brasileiros.