Congresso

“Não faltou recurso para fiscalizar crimes ambientais; faltou vontade”, diz relatório do OC

Ibama liquidou em 2021 apenas 41% dos R$ 219 milhões disponíveis para combater o desmatamento

Ibama no combate ao desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, em Roraima/RO (foto: Ibama)
Ibama no combate ao desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, em Roraima/RO (foto: Ibama)

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Diálogos da Transição

eixos.com.br | 01/02/22

Editada por Nayara Machado
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O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) liquidou em 2021 apenas 41% dos R$ 219 milhões disponíveis para combater o desmatamento, mostra relatório do Observatório do Clima publicado nesta terça (1/2). Veja na íntegra (.pdf)

Segundo a organização, não foi por falta de recursos para a fiscalização ambiental que o governo Bolsonaro deixou o desmatamento subir pelo terceiro ano consecutivo em 2021 — apenas R$ 88 milhões foram gastos com fiscalização no ano passado.

A título de comparação, nos governos anteriores a Bolsonaro, o Ibama costumava liquidar entre 86% e 92% dos recursos para a fiscalização.

“Como a liquidação reflete serviço realizado, esse número baixo mostra que o governo não aproveitou a verba extra para a fiscalização que obteve do Congresso em 2021 para ampliar o número de operações de campo. Só deverá gastar grande parte dos recursos em 2022”, explica o OC.

Como consequência, o número de autos de infração por desmatamento foi o menor em duas décadas em 2021 — 40% abaixo da média da década anterior ao atual governo.

O número de embargos de propriedade caiu 70% em relação a 2018.

Considerado um dos instrumentos mais eficientes contra o desmate, ele impede que áreas embargadas vendam carne ou soja, ou tomem crédito rural em bancos públicos, por exemplo.

Jair Bolsonaro inclusive comemorou em janeiro que seu governo reduziu “em 80% o número de multagens (sic)”.

Não foi só o dinheiro do Ibama que ficou parado

O OC destaca que a política ambiental da atual gestão manteve congelados pelo terceiro ano mais de R$ 3 bilhões do Fundo Amazônia, que recebeu recursos da Noruega e da Alemanha por resultados obtidos no combate ao desmatamento dos governos anteriores.

Se considerados também os recursos do Fundo Clima e uma doação obtida pelo Brasil do fundo climático da ONU, o GCF, o governo mantém parados R$ 4,5 bilhões que poderiam ter sido usados em ações de preservação ambiental e redução de emissões.

O valor equivale a mais de 13 vezes a previsão de gastos da União com combate ao desmatamento em 2022.

A verba do GCF (Fundo Verde do Clima) — de US$ 96,5 milhões por reduções de desmatamento ocorridas na gestão de Dilma Rousseff — foi concedida no segundo mês do governo Bolsonaro. Está há três anos praticamente sem sair do papel.

O objetivo é pagar a quem conserva e recupera a vegetação para desestimular a derrubada da floresta. O Floresta+, concebido na gestão do antecessor de Bolsonaro, Michel Temer, tinha como público-alvo agricultores familiares, povos indígenas e comunidades tradicionais da Amazônia.

Mas só em dezembro de 2021 começou um “teste do mecanismo de pagamento” a seis beneficiáriossegundo nota publicada no site do Floresta+. Indígenas e comunidades tradicionais não foram contemplados.

Vale lembrar também que, em janeiro do ano passado, ao definir as metas do programa no Plano Operativo para Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa, que vai vigorar até 2023, o governo reduziu em um terço a área programada para preservação florestal.

São medidas e resultados que reforçam a desconfiança internacional em relação ao Brasil.

Esta semana, o governo da França sinalizou que condicionará o apoio à adesão do Brasil à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) a demonstrações de que o país irá reduzir o desmatamento e lutar contra a corrupção.

Mas os sinais vão em outra direção.

No Congresso, pelo menos oito projetos de lei ameaçam a agenda climática, em ano de corrida eleitoral, lista o Observatório do Clima:

  • PLs da Grilagem (2633/2020 e 510/2020);

  • Licenciamento ambiental (PL 3.729/2004), que tornaria o licenciamento ambiental uma exceção em vez de regra e abriria a possibilidade de uma “guerra antiambiental” entre os estados com o vazio de regramento, similar à guerra fiscal;

  • Demarcação de terras indígenas (PL 490/2007), que permite a retomada de “reservas indígenas” pela União a partir de critérios subjetivos, além de aplicar o “marco temporal” a todas as demarcações;

  • Mineração em terras indígenas (PL 191/2020);

  • Liberação de agrotóxicos (PL 6922/2002);

  • Liberação da caça esportiva no Brasil (PL 5.544/2020);

  • Infraestrutura hídrica (PL 4.546/2021), que retira a autonomia dos Comitês de Bacias na aprovação dos Planos de Bacias Hidrográficas e institui a outorga onerosa;

  • Atualização do Código de Mineração.

Enquanto isso… BNDES firmou um acordo com o Banco Mundial para para desenvolver uma agenda conjunta sobre clima, mercado de carbono e biodiversidade no país.

“Pretendemos identificar soluções financeiras, baseadas nas melhores práticas internacionais, para apoiar as agendas climática, de carbono e de biodiversidade”, afirma Bruno Aranha, diretor de Crédito Produtivo e Socioambiental do BNDES.

Também prevê a criação de um sistema para a avaliação de empresas, com base nas práticas ambientais, sociais e de governança (ESG, em inglês).

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