Diálogos da Transição

Fundos climáticos não combatem crise

Foco da COP29, novo objetivo coletivo de financiamento climático (NCQG) está cercado de divergências

Fundos climáticos não conseguem combater a crise, diz embaixador (Foto: agência eixos)
Embaixador André Correa do Lago (MRE) e secretária de Mudança do Clima, Ana Toni (MMA) | Foto: agência eixos

NESTA EDIÇÃO. Brasil levará à COP29 posição defendida no G20 de que é preciso incorporar o clima à agenda econômica global.

“Não vai ser com fundos de clima que se vai conseguir combater a mudança do clima”, diz embaixador.

País também está alinhado com grupo das 134 economias emergentes em temas como necessidade de revisão das metodologias de monitoramento do financiamento climático e quem deve contribuir.


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Como presidente do G20 em 2024, o Brasil conseguiu fortalecer a percepção entre as principais economias globais de que os fundos climáticos, sozinhos, não serão suficientes para o enfrentamento à mudança climática, disse nesta quinta (17/10) o embaixador André Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores.

“O Brasil, no G20, conseguiu, eu acho, fortalecer a percepção de que não vai ser com fundos de clima que se vai conseguir combater a mudança do clima. Nós temos que conseguir que o clima entre dentro da lógica de todas as atividades econômicas”.

Segundo o secretário, a expectativa é alcançar resultados mais efetivos na Força Tarefa de Clima, que encerra na próxima semana em Washington, durante a reunião dos ministros da Fazenda, Meio Ambiente e presidentes de Bancos Centrais.

O objetivo é construir consensos em relação aos recursos que precisam ser destinados, na forma de concessão, a países que enfrentam mais obstáculos para atrair investimentos e desenvolver projetos ambientais e energéticos.

“Estamos trabalhando, sobretudo, pelos recursos concessionais para os países mais pobres. Mas acaba que os países médios, como o Brasil, Indonésia, Índia, também precisam de uma quantidade imensa de investimentos. Precisamos reduzir o custo do capital”, explica Corrêa do Lago.

Definições neste sentido serão importantes porque, em novembro, o Azerbaijão sediará a 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29). O foco será estabelecer o novo objetivo coletivo de financiamento climático (NCQG), por enquanto, cercado de divergências.

Uma delas é o quanto. A meta atual é de US$ 100 bilhões que países de alta renda precisam mobilizar para os demais poderem investir em ações de enfrentamento à mudança do clima. A COP29 pretende atualizar esse número.

“A definição do que é financiamento climático já é um grande debate em si, [porque] dentro desses US$ 100 bilhões ficam contabilizadas atividades que teoricamente não têm um impacto direto sobre a redução de emissões de combate à mudança do clima”.

Segundo o embaixador, o Brasil, como membro da coalizão G77+China (grupo de 134 países emergentes), considera que esses recursos precisam vir como concessão dos países ricos para os de renda média e baixa.

“Ou seja, investimentos e outros tipos de atividades naturais do desenvolvimento não entrariam nisso”.

Essa visão enfrenta resistência entre os países de renda mais alta, completa Corrêa do Lago.



Em 2009, países considerados desenvolvidos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) concordaram com uma meta de disponibilizar US$ 100 bilhões por ano, a partir de 2020, para economias menos desenvolvidas aplicarem em medidas de mitigação e adaptação às mudanças do clima.

De acordo com a própria OCDE, somente nos últimos dois anos a meta foi cumprida. Ainda assim, pouco se sabe sobre a metodologia que é usada para mapear esse fluxo de capital, observa Ana Toni, secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

“Não é uma metodologia que foi acordada na UNFCCC [agência da ONU que coordena as COPs]. Então, esse é um dos tópicos de debate: já que vamos pensar em uma nova meta, vamos também acordar que metodologia se usa?”.

Toni explica que alguns países consideram nos cálculos recursos usados para lidar com imigrantes, entre outras áreas que não estão diretamente ligadas ao propósito do financiamento.

“Isso tem que ficar mais transparente”, defende.

Além de quanto dinheiro é preciso, como calcular se está sendo entregue e os prazos, outro ponto que promete aquecer o debate da COP29 é quem paga a conta.

Segundo a secretária do MMA, existe uma pressão por parte dos países que hoje são obrigados a mobilizar os US$ 100 bilhões anuais para que novos contribuintes (China e Emirados Árabes, por exemplo) engrossem a base de doações.

Mas o Brasil está alinhado com a coalizão G77+China na defesa de que os doadores obrigatórios permaneçam os países ricos.

“Nesse do quem paga obrigatoriamente, os países desenvolvidos [devem pagar] 100%. Está todo mundo fechado nisso. E tem aí um movimento de alguns países emergentes que queiram, talvez, um dia, voluntariamente, contribuir com outro país Sul-Sul, como muitos já fazem”, disse Toni a jornalistas nesta quinta.

“Mas eles [países ricos] querem transformar o que é voluntário em obrigatório, e isso não é aceitável de jeito nenhum”, completou. 


Sem recursos para resiliência. O presidente da Enel São Paulo, Guilherme Lencastre, disse nesta quinta-feira (17/10) que os contratos de distribuição atuais não preveem incentivos para investimentos em resiliência das redes.

Após seis dias dos temporais, há 36 mil clientes sem energia na região metropolitana de São Paulo. “Operação muito próxima da normalidade”, afirmou Lencastre.

Brasil na rota marítima verde. A criação de uma demanda interna para biocombustíveis para o transporte marítimo é uma das principais recomendações endereçadas ao governo brasileiro pelo relatório divulgado em setembro pelo Grupo de Trabalho de Negócios Oceânicos (GTNO) do Pacto Global da ONU – Rede Brasil. 

“É necessário criar condições para mobilizar a procura por biocombustíveis de baixo carbono ou carbono neutro para o transporte marítimo”, afirma relatório do GT coordenado pelo Porto do Açu.

Biometano na reforma tributária. Concentrar no produtor de biometano o regime monofásico dos combustíveis, como previsto na reforma tributária, pode ter efeitos contrários ao desejado, de coibir a sonegação fiscal, defende a presidente da Associação Brasileira do Biogás e do Biometano (ABiogás), Renata Isfer.

Entidades do setor de gás natural tentam convencer a Câmara dos Deputados a rever pontos da regulamentação da reforma tributária, sobretudo a aplicação do imposto seletivo e a monofasia.

O retorno do horário de verão foi descartado pelo governo depois que o Ministério de Minas e Energia (MME) e o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) considerarem que o custo-benefício não justificaria a adoção da medida.

ministro Alexandre Silveira afirmou que o adiantamento dos relógios não foi considerado imprescindível para a segurança energética do país no atual momento. A discussão sobre o retorno do horário de verão ocorreu em meio à crise hídrica, que vem afetando os reservatórios das hidrelétricas.