diálogos da transição

Brasil deve avançar com navios verdes, apesar de atraso internacional

Na visão de especialistas consultados pela eixos, apesar de atraso na adoção de mecanismo net zero da IMO o país precisa estar preparado para uma transição “sem volta”

Brasil deve avançar com navios verdes, apesar de atraso internacional (Foto: IMO)
Reunião da IMO resultou em adiamento de mecanismo net zero da navegação (Foto: IMO)

NESTA EDIÇÃO. Brasil deve avançar com a definição de políticas para incentivar combustíveis sustentáveis na navegação, mesmo diante de ventos contrários no ambiente internacional. 

Na visão de especialistas consultados pela eixos, o país precisa estar preparado para uma transição “sem volta”, ainda que ocorram atrasos ao longo do caminho.


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Na última sexta (16/10), cedendo à pressão dos EUA e outros grandes produtores de petróleo, os Estados-membros da Organização Marítima Internacional (IMO, em inglês) decidiram adiar em um ano a votação na sobre a adoção do mecanismo net zero para o setor.
 
Além de frustrar expectativas de quem contava com a aprovação como um sinal de mercado, a postergação acrescenta desafios ao desenho de políticas nacionais, a exemplo do Brasil, que busca um alinhamento do seu marco legal para combustíveis marítimos com o mecanismo internacional.
 
Prometida pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para o primeiro semestre de 2025, a proposta para o marco legal do setor está atrasada e o GT que cuida do tema foi prorrogado por 90 dias esta semana. 
 
A pasta não respondeu a pedidos de comentários até o fechamento desta edição.
 
Flávio Mathuiy, assessor da Comissão Coordenadora do Brasil para os Assuntos da IMO, avalia que independente das negociações internacionais, o país precisa se antecipar, inclusive para posicionar seus biocombustíveis como uma alternativa para abastecer os navios.
 
“É importante que tenhamos capacidade de produção e estejamos organizados como País”, defende em entrevista à eixos.
 
“Não adianta ter o combustível sustentável em uma usina afastada dos portos e que precisa de transporte terrestre emissivo para chegar até o porto, porque o ganho ambiental da produção se perde no caminho”, exemplifica.
 
Ele afirma que o grupo de trabalho criado pelo CNPE para a definição da política nacional está olhando para isso, e que o adiamento da IMO dá mais tempo para o país se preparar, inclusive em relação aos derivados de hidrogênio, como e-metanol
 
“A postergação na IMO gera insegurança, mas, de qualquer forma, a transição no transporte marítimo já começou. Muitas empresas de navegação já estão trabalhando neste sentido. É um caminho que pode demorar, mas é sem volta”, completa Mathuiy.



Responsável por cerca de 3% das emissões globais de gases de efeito estufa, o transporte marítimo avalia a aplicação de uma taxa que pode variar de US$ 100 a tonelada de CO2 a US$ 380/tCO2
 
É válida apenas para grandes navios e as receitas irão compor um fundo para incentivar combustíveis sustentáveis.
 
O mecanismo recebeu apoio, em abril deste ano, de 63 membros da IMO, incluindo China, Brasil e países da União Europeia.
 
Os Estados Unidos se retiraram das negociações e, meses depois, secretários de Estado da gestão de Donald Trump rejeitaram formalmente o mecanismo, prometendo retaliação.
 
A pressão surtiu efeito e ganhou apoio de produtores de petróleo, como Arábia Saudita.
 
“A decisão frustra um trabalho de mais de dois anos, conduzido com base metodológica e científica. Porém, não se pode dizer que tenha havido surpresa, diante de vários sinais emitidos às vésperas da reunião por diferentes países produtores de petróleo”, comenta Camilo Adas, diretor de Transição Energética da Be8.
 
Ele aponta que o placar da última sexta demonstra como o tema divide interesses: 57 votos a favor do adiamento, 49 contra, 21 abstenções e 8 ausências. 
 
“A proposta partiu de Singapura e foi levada à votação por países produtores de petróleo, com forte apoio dos EUA. O Brasil exerceu protagonismo na defesa da aprovação das medidas, em alinhamento com parceiros estratégicos, mas isso não foi suficiente para superar a pressão dos países produtores de petróleo”.
 
Para o executivo, o resultado da semana passada pode retardar investimentos, já que projetos de hidrogênio verde dependem da garantia de demanda para serem viáveis.
 
No caso específico da definição de uma política nacional pelo Brasil, ele avalia que esperar seria um erro estratégico, mas no contexto do frete mundial, não há como avançar de forma isolada sem comprometer a competitividade e a integração com padrões internacionais.
 
“O Brasil tem condições únicas — matriz energética limpa, disponibilidade de biomassa e experiência com biocombustíveis — para liderar essa agenda, mas precisa fazê-lo de forma coordenada com outros países que compartilham objetivos semelhantes”, diz em entrevista.

Estudo da Rystad Energy revela uma disparidade entre a disponibilidade projetada de combustíveis limpos e a demanda global prevista, agravada por restrições de infraestrutura. Pontos que levantam dúvidas sobre o cronograma de transição previsto pela IMO originalmente. 
 
Apesar de abalar a previsibilidade, o atraso do mecanismo significa maior prazo para os trabalhos em torno das diretrizes internacionais para descarbonizar a navegação até 2050.
 
“Se a medida fosse adotada como estava prevista agora, teríamos pouco tempo para desenvolver as diretrizes das regras previstas para entrar em vigor em 2027”, explica Mathuiy.
 
Segundo o assessor brasileiro na IMO, há mais de uma dezena de diretrizes para serem resolvidas, e algumas complexas como o estabelecimento de um fundo e a distribuição de recursos, além da definição da recompensa dos combustíveis de baixa emissão.
 
“Essa postergação vai permitir que façamos o trabalho com mais tranquilidade, com mais discussão”, conclui.


Decreto do hidrogênio pronto. Representantes do MME e Fazenda disseram nesta quarta (22/10) que o decreto que regulamentará as leis do hidrogênio no Brasil (Leis nº 14.948 e 14.990) está pronto e depende agora do aval da Casa Civil. 

  • O texto é aguardado pelo mercado para decisões finais de investimentos na produção industrial do gás de transição energética no Brasil. 
  • O governo também planeja lançar “nos próximos dias” uma tomada de subsídios sobre o leilão do PHBC. Leia na eixos

Por falar em hidrogênio, a Aneel aprovou quatro projetos-pilotos com recursos do PDI, somando R$ 196,2 milhões. O escopo foi reduzido: no início da discussão em 2024, eram 13 projetos, com a perspectiva de R$ 1,49 bilhão de investimentos para aplicação em segmentos industriais como siderurgia, fertilizantes, alimentos, mobilidade e petroquímica.
 
PEC das agências. A CCJ aprovou nesta terça (22/10) o relatório de admissibilidade da proposta que dá mais poderes aos deputados sobre as decisões das agências reguladoras. A PEC 42/2024 passou com 33 votos favoráveis e 13 contra.
 
Mudança de marca. A Eletrobras anunciou nesta quarta-feira (22/10) que passará a se chamar Axia Energia. A mudança do nome ocorre após a conclusão da venda dos últimos ativos termelétricos da Eletrobras para a Âmbar, braço do setor de energia do grupo J&F, dos irmãos Batista.
 
Compensação climática. A diretora da Aneel Agnes da Costa esclareceu, na terça-feira (21/10), que haverá prazo máximo de 180 dias para que as distribuidoras ajustem os sistemas para a devida apuração do indicador chamado de Duração da Interrupção Individual em Situação de Emergência (Dise). O dispositivo permitirá a compensação por interrupções no serviço de energia após eventos climáticos extremos.

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