Paulo César Ribeiro Lima, PhD
Em 2010, o Poder Executivo Federal e o Congresso Nacional optaram por ceder onerosamente para a Petrobras muitas áreas da União na melhor região da província petrolífera do Pré-Sal, localizada na Bacia de Santos. O ônus a ser pago pela Petrobras retornaria ao caixa da estatal pela subscrição de ações pela União, com vistas à necessária capitalização da companhia.
Nesse contexto, foi promulgada a Lei nº 12.276/2010, que autorizou a União a ceder onerosamente à Petrobrás o exercício das atividades de pesquisa e lavra de cinco bilhões de barris equivalentes de petróleo. Essa cessão atendeu aos interesses da Petrobrás, não à maximização das receitas do Estado brasileiro para investimentos, por exemplo, nas áreas de educação e saúde.
Em decorrência dessa Lei, foi assinado o Contrato de Cessão Onerosa no valor de R$ 74,8 bilhões, valor esse determinado a partir de uma taxa de desconto de 8,83% e de fluxos de caixa descontados a partir de curvas de produção e de preços não disponíveis. O Capítulo III desse contrato trata da sua revisão.
Nos termos desse capítulo, a revisão será feita com fundamento em laudos técnicos elaborados por entidades certificadoras independentes, a serem contratadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e pela Petrobras, que deverão considerar as melhores práticas da indústria do petróleo, incluindo, mas não se limitando às informações constantes do Relatório Final do Programa de Exploração Obrigatório, aos preços de mercado do petróleo e gás natural e à especificação do produto da Lavra.
Como a União e outros entes federais subscreveram ações no valor de R$ 74,8 bilhões, os acionistas não controladores também tiveram direito de subscrever ações na proporção de suas participações no capital social da Petrobrás. Foi essa subscrição de “acionistas privados” que gerou a entrada de recursos no caixa da Petrobrás, que totalizaram R$ 45,45 bilhões.
O Contrato de Cessão Onerosa e a operação de capitalização proporcionaram importantes benefícios à Petrobrás. O endividamento líquido foi reduzido de R$ 94,2 bilhões para apenas R$ 57,1 bilhões e a relação entre a dívida líquida e o EBITDA reduziu-se de 1,52 para apenas 0,94. A redução da alavancagem e a entrada de recursos dos “acionistas privados” no caixa da Petrobrás aumentaram, de fato, a capacidade de investimento da estatal.
A sociedade brasileira teve, no entanto, um alto custo ao retornar à empresa o valor de R$ 74,8 bilhões em razão da subscrição de ações pela União e entes federais. A Petrobrás, entretanto, considera ser credora da União (sociedade brasileira) na Revisão do Contrato de Cessão Onerosa.
De acordo com notícia veiculada na imprensa especializada, o governo federal teria concordado em pagar US$ 9 bilhões para a Petrobrás na revisão do contrato[1]. Com esse pagamento adicional de cerca de R$ 34 bilhões, a capitalização da Petrobrás custará à sociedade brasileira mais de R$ 100 bilhões.
Nos termos do Contrato de Cessão Onerosa, o valor revisto será a soma dos valores presentes líquidos dos fluxos de caixa anual descontados de projetos determinísticos para cada bloco.
Utilizando-se a mesma taxa de desconto do contrato, de 8,83%, e uma curva de produção construída a partir de estimativas do Plano Decenal de Expansão de Energia 2026, chega-se a um valor presente líquido das potenciais receitas dos volumes do Contrato de Cessão Onerosa de R$ 173,3 bilhões, valor muito superior ao ônus “pago” pela Petrobrás de R$ 74,8 bilhões.
Na realidade, os volumes recuperáveis e as produtividades dos poços do Pré-Sal superaram todas as expectativas. Assim, os custos da Petrobras por barril produzido serão muito menores que os previstos em 2010. Além disso, o “pagamento” foi em Reais, mas as receitas decorrentes do Contrato são em Dólares.
Em Reais, o preço do petróleo Brent teve uma elevação de R$ 129,66 por barril, em 3 de setembro de 2010, para R$ 245,22 por barril, em 15 de fevereiro de 2019. Se o preço do petróleo Brent fosse corrigido pela taxa Selic, ele seria de R$ 213,58 por barril. Dessa forma, em Reais, o preço do petróleo aumentou desde a assinatura do Contrato de Cessão Onerosa, em 3 de setembro de 2010, até 15 de fevereiro de 2019.
Em suma, o regime de cessão onerosa teve como objetivo capitalizar a Petrobrás e não há nenhuma justificativa técnica para que a estatal seja credora na revisão do contrato decorrente desse regime, que prevê apenas o pagamento de royalties de 10%, é intransferível e trará grande geração de caixa livre para a estatal.
[1] Disponível em https://eixos.com.br/cessao-