O setor de energia na América Latina concentra uma das maiores disparidades de gênero: apenas 20% de toda força de trabalho são mulheres. Em cargos de alta gestão somos 17%. Em diretorias ou na presidência de empresas, a porcentagem cai para 7% – números pequenos para um mercado onde metade da população em idade adulta é feminina.
Dados do Banco Mundial mostram que precisaríamos de 79 anos para acabar com a desigualdade entre homens e mulheres na América Latina e no Caribe.
Pensando nisso, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) organizou, na última semana, evento voltado para discussão de gênero no setor de energia, que reuniu mais de 150 mulheres de toda América Latina e Caribe que debateram e dividiram experiências sobre como aumentar a presença feminina no setor.
É interessante ver como cada país está tratando o assunto, uns mais avançados do que os outros, inclusive com leis federais que determinam uma proporção mínima que as empresas e o governo tem que cumprir de mulheres em seus quadros.
A Costa Rica, por exemplo, criou a primeira lei de promoção da igualdade da mulher, proibindo a discriminação no trabalho, em 1990. Nos anos 2000 criou uma segunda lei afirmando que o quadro das diretorias do setor público e privado tinham que ter a mesma proporção entre homens e mulheres.
Pesquisas recentes mostram que a diversidade no ambiente de trabalho tem impacto nos negócios. Empresas com forças de trabalho diversas são 22% mais produtivas e alcançam rentabilidade 27% maior – isso sem falar no ganho reputacional. Alcançar a igualdade de gênero pode somar US$ 12 trilhões à economia global.
O BID tem uma ferramenta online de Análise de Lacuna de Gênero, o Women Empowerment Principles Gap Analysis tool (WEP) – 18 perguntas múltipla escolha que ajudam a empresa a avaliar seu desempenho em termos de igualdade de gênero. Há também o Fundo Mulher, que financia mulheres empreendedoras ou empresas que queiram valorizar as mulheres, além de certificados para empresas que priorizam a diversidade em seu ambiente de trabalho.
Apesar dos bons exemplos, a maior parte das presentes no evento compartilhou sentimento comum de que ainda há muitos obstáculos às mulheres no setor de energia: preconceito, disparidade salarial, menores oportunidades, falta de mentoria, poucos exemplos de liderança feminina a serem seguidos e a inexistência de uma rede global de cooperação, ou de networking, na linguagem corporativa.
Findo o seminário, uma coisa ficou clara: o Brasil tem muito que aprender e ouvir a partir da experiência dos países vizinhos. Por aqui, a conversa segue de maneira muito incipiente, e falta uma discussão mais transparente sobre a importância da diversidade em um ambiente de trabalho.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que apesar de serem a maior parte da população com ensino superior completo, as mulheres ainda ganham 25% menos que os homens. Se consideramos as mulheres negras, a disparidade salarial no Brasil aumenta para 40%.
Precisamos começar a tratar o assunto de forma objetiva e, para além do discurso, pensar: o que está sendo feito de forma prática para mudar a situação. As empresas pensam na proporcionalidade ao fazer um processo de recrutamento e seleção? O ambiente de trabalho é favorável para as mulheres que se dividem entre o trabalho e a vida familiar? O setor público pensa como incluir mulheres em seus quadros?
A discussão existe, e há muitos caminhos possíveis. Veremos no Brasil nos próximos anos uma grande expansão da matriz energética, com foco maior em renováveis e a ampliação do mercado gás natural, como combustível de transição. Temos a oportunidade de abraçar esta agenda e aumentar o debate se quisermos acompanhar esta onda de crescimento do setor e, quem sabe, deixarmos de ser estatística.