Energia

Meteorologia se torna mais estratégica para o setor elétrico com reforço da IA

E ganha destaque na gestão de negócios e decisões do setor elétrico para prevenir danos frente a extremos climáticos, escreve Guilherme Martins

Meteorologia se torna mais estratégica gestão de negócios e decisões do setor elétrico com reforço da inteligência artificial (IA). Na imagem: Guilherme Martins, meteorologista da Nottus (Foto: Divulgação)
Guilherme Martins é meteorologista da Nottus (Foto: Divulgação)

Em tempos de mudanças climáticas, com suas manifestações na forma de eventos extremos, a meteorologia tem ganhado posição de destaque na vida das pessoas e nas decisões de negócios. Para o setor elétrico, segmento da economia brasileira afetado diretamente pelo clima, a meteorologia ganha cada vez mais relevância entre as ferramentas de planejamento e suporte das atividades e serve quase que como um guia de sobrevivência para as companhias em toda a cadeia da produção de eletricidade.

Os moradores da capital paulista vivenciaram, no final do ano passado, as dificuldades impostas pelos eventos climáticos extremos. Uma forte tempestade, acompanhada de ventos de intensidade incomum, deixou milhares de consumidores sem energia elétrica em novembro de 2023, causando dificuldades para a população e provocando prejuízos para o comércio e a indústria.

Em dezembro, foi a vez de Salvador, na Bahia, ter vários bairros às escuras e com pontos de alagamento decorrentes de intensas precipitações. Chuvas fortes e rajadas de ventos provocaram, em janeiro, a interrupção do fornecimento de energia em várias cidades do Rio de Janeiro, entre os muitos transtornos causados à população em meio a uma intensa onda de calor.

Os impactos dos eventos climáticos extremos sobre a área de distribuição de energia foram computados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A agência reguladora do setor elétrico calcula que, sob a ação de tempestades, ciclones extratropicais e outros eventos climáticos extremos, ocorreram cortes no fornecimento de energia em todo país, em 2023 e no início deste ano, que deixaram cerca de 6,2 milhões de unidades consumidoras sem energia.

A percepção entre técnicos do setor elétrico ressalta a maior frequência de eventos climáticos bem como o aumento da sua intensidade. 

Transmissão também é afetada

Os problemas também afetam a área de transmissão de energia. Acompanhando a maior gravidade dos eventos climáticos extremos, as transmissoras vêm reforçando os requisitos para a construção das torres de transmissão, ampliando a sua resistência para ventos de até 150 quilômetros por hora. A iniciativa, contudo, não tem evitado a queda de torres sob a ação de tempestades mais fortes.

Na ponta da geração, que por muito tempo foi o segmento mais exposto às variações agudas do clima, adversidades voltaram a ocorrer. A ação combinada das mudanças climáticas e do fenômeno El Niño causou forte seca na região Norte do país, no segundo semestre de 2023, obrigando a usina hidrelétrica de Santo Antônio, localizada no rio Madeira, a interromper sua operação. A seca reduziu a vazão do rio em mais de 50%.

Em reuniões com os representantes do setor, a Aneel tem discutido medidas com o objetivo de permitir que as empresas consigam enfrentar a maior intensidade das complicações impostas pelo clima. A preocupação em tornar mais eficiente a previsão de ocorrência de eventos climáticos extremos está no rol de iniciativas em discussão.

A ideia seria ampliar a instalação de radares meteorológicos para se ter eficiência e rapidez na previsão meteorológica. O monitoramento das condições do tempo pode permitir a mobilização de recursos para reduzir ou evitar os impactos de eventos climáticos nas redes de eletricidade. 

Eficácia tecnológica

Paramentada com recursos tecnológicos de última geração, a meteorologia está pronta para encarar esse desafio. A Inteligência Artificial (IA) foi incorporada ao ferramental dessa ciência, transformando-se em uma das maiores contribuições para o seu desenvolvimento. Modelos meteorológicos elaborados com o suporte da IA conseguem obter uma assertividade acentuada na previsão do tempo.

Com a tecnologia a bordo, as agências meteorológicas identificam com grande eficácia regiões que serão afetadas pelos eventos climáticos extremos. No Brasil, as previsões do tempo têm contribuído tanto para prevenir a ocorrência de tragédias em decorrência de situações como tempestades e ciclones, quanto para evitar e reduzir perdas nos negócios.

Além do setor elétrico, o agronegócio e o comércio, por exemplo, são setores que recorrem cada vez mais a estudos meteorológicos como ferramenta no planejamento e na gestão de suas atividades. 

Com base no histórico e em estudos que apontam que os eventos climáticos extremos se tornarão mais frequentes, a evolução tecnológica da meteorologia soa como excelente notícia. Quanto mais tecnologia agregada à ciência, mais eficiente ela se tornará. E, com isso, poupará as pessoas e os negócios de impactos devastadores causados por chuvas torrenciais, ondas de calor, rajadas de vento e toda sorte de mudanças no tempo e no clima.

Guilherme Martins é meteorologista da Nottus. Ele é especializado em inovação e tecnologia. Desenvolve modelos de análise e soluções para processamento e visualização de dados ambientais que facilitam a compreensão de informações em prol da tomada de decisão. Em sua carreira, passou pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), por empresas de consultoria e exerceu carreira acadêmica, como cientista e professor universitário convidado. É bacharel em Meteorologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA), com mestrado em Meteorologia pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), doutorado em Ciência do Sistema Terrestre pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e MBA em Data Science e Analytics pela USP/Esalq.