O desenvolvimento do mercado livre de gás natural exigirá das distribuidoras soluções mais flexíveis, seja na contratação de molécula, seja na oferta dos serviços de movimentação na rede, na avaliação do CEO da ES Gás, Fábio Bertollo.
Hoje, cerca de um terço do volume de gás que passa pela rede da concessionária capixaba tem como destino usuários livres.
De acordo com dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a lista de indústrias presentes no mercado livre incluem ArcelorMittal, Biancogres, Samarco, Suzano e Vale e suas unidades no Espírito Santo
Sem citar os clientes, Bertollo conta que quatro dos cinco maiores consumidores industriais de gás do estado são usuários parcialmente livres – o que traz uma complexidade maior na gestão da concessão.
Bertollo conta que, nesse sentido, a distribuidora tem mantido conversas com a ARSP, a agência reguladora estadual, para revisão do atual modelo do CUSD – o contrato entre usuários livres e ES Gás pelo uso da rede. O objetivo é dar mais flexibilidade à contratação do sistema de distribuição.
Regulador avalia novo modelo de contrato
A ARSP pretende propor no segundo semestre a revisão do modelo do CUSD no estado. A agência avalia, dentre outras possibilidades, permitir a contratação de capacidade spot (curto prazo). O tema está em fase de análise de impacto regulatório – estudo que apontará as alternativas, de fato. O modelo atual de CUSD é de 2021 e viabilizou uma primeira onda de migrações para o mercado livre no estado.
Hoje, conta Bertollo, a ES Gás já tem negociado bilateralmente com clientes as condições de movimentação na rede dos usuários livres que acessam oportunidades de curto prazo, mas falta definir um modelo. Ele cita que, no ano passado, teve cliente da companhia que chegou a operar 230 dias em base spot.
“O processo de regulação é um processo que a gente tem que ter consciência de que ele sempre tem que estar evoluindo. E quando você pega situações muito novas como essa do mercado livre, tem um pouco de tentativa e erro. Então, um dos trabalhos que a gente tem feito com os consumidores é justamente flexibilizar até onde a gente pode. Para quê? Para conseguir testar. Para depois fazer uma regulação adequada nesse sentido”, disse o CEO em entrevista à agência eixos.
ES Gás busca portfólio mais flexível
Do lado da gestão de portfólio de suprimento, o executivo conta que a ES Gás criou uma mesa de comercialização própria para acompanhar as movimentações do mercado.
“A conversa é todo dia com o supridor, com o cliente. Os usuários têm demandas muito específicas. Grande parte do processo produtivo dos grandes clientes do Espírito Santo é o processo de pelotização, de siderurgia. E é um processo que não é tão estável. Então isso exigiu muita conversa, evidentemente, um alinhamento com os produtores para descontratação, recontratação e ajustes das quantidades”, disse.
Ele acredita que haverá uma tendência crescente por contratos flexíveis e destacou que, nesse contexto, passa a fazer sentido para as distribuidoras buscar contratos MSA (do inglês Master Sale Agreement) – tipo de acordo que define as bases que permitem às partes serem mais ágeis em potencias negociações futuras.
“Isso tende a virar um desenho”, afirmou.
Cláusulas que permitem a redução dos volumes contratados em caso de migração de usuários para o mercado livre serão itens obrigatórios nos contratos de suprimento. A ES Gás reduziu nos últimos meses, por exemplo, volumes contratados com a Petrobras, devido a essas migrações.
Revisão tarifária à vista
A ES Gás é operada desde 2023 pela Energisa. Desde a privatização, a concessionária, sob nova administração, tem ampliado os investimentos na expansão da rede e se prepara para a sua primeira revisão tarifária em 2025.
Este mês, a ES Gás selou um compromisso com o governo do estado, no lançamento do programa ES Mais+Gás, para impulsionar a descarbonização da economia capixaba a partir do gás natural e do biometano.
A iniciativa almeja instalar 1.560 km de rede até 2034 – cerca de 1 mil km a mais que a infraestrutura atual – e dobrar, para 26, o número de cidades atendidas. Este ano, a companhia inaugura o sistema de distribuição de Guarapari.
A expectativa é que, na revisão tarifária de 2025, sejam definidos os investimentos para os próximos cinco anos.
Bertollo destaca que há espaço para expandir o consumo de gás em todos os segmentos.
A previsão é que o consumo diário de gás no estado suba dos atuais 2,3 milhões de m3/dia para 7 milhões a 15 milhões de m3/dia em 2034.
“É um estado que é geograficamente menos desafiador… Ele tem uma interiorização que é relativamente simples de fazer, é um ambiente muito propício. Tem uma concentração [de volume por km de rede] boa”, comentou.
No segmento industrial, a ES Gás mira com atenção o aquecimento do setor na região Norte, em especial da indústria de alimentos, e as oportunidades de substituição de carvão na siderurgia – o que depende, claro, do aumento da competitividade do gás e do cenário do mercado internacional.
“Ainda tem muito carvão que é parte do processo siderúrgico, metalúrgico, que pode ser um elemento de substituição”, disse.
ES Gás mira oportunidades em CCUS
A presença da indústria siderúrgica, setor industrial de difícil abatimento de emissões, traz oportunidades, na visão da ES Gás, para desenvolvimento do negócio de Captura, Uso e Armazenamento de Carbono (CCUS).
A concessionária assinou este mês um Memorando de Entendimentos com produtores de gás do Espírito Santo (EnP, Imetame, Grupo Ubuntu e Seacrest) para estudar projetos de CCUS na porção terrestre da Bacia do Espírito Santo.
A Energisa, controladora da ES Gás, vê as distribuidoras de gás canalizado como prestadoras de soluções de infraestrutura mais amplas no futuro.
As produtoras avaliarão as possibilidades do armazenamento do CO2 em seus campos, bem como a possibilidade de reinjeção de CO2 para recuperação avançada de petróleo. Já a ES Gás e o Grupo Energisa viabilizariam a rede de transporte desse CO2 capturado até os campos de armazenamento.
“A distribuidora tem uma expertise de construir rede e distribuir gás. Por que a gente não pode usar essa expertise? Eu acho que a gente tem sinergia. Existe uma necessidade do Santo de captura desse carbono. Então, vamos tentar encontrar alternativas”, comentou Bertollo.