Luiz Eduardo Barata: transição para uma matriz elétrica de base renovável pode ocorrer na próxima década

Para Luiz Eduardo Barata, ex-diretor do ONS, tendência será utilização de hidrelétricas como base para expansão de renováveis intermitentes
Luiz Eduardo Barata, ex-diretor do ONS - Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

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Diálogos da Transição

eixos.com.br | 02/06/21
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Editada por Nayara Machado
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A geração de energia a partir de renováveis, como eólica e solar, pode assumir o protagonismo na matriz elétrica brasileira no Brasil pós-2030, com hidrelétricas ocupando o papel que hoje é desempenhado pelas térmicas.

A avaliação é do engenheiro Luiz Eduardo Barata, ex-diretor do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Ele ocupou o cargo entre 2016 e maio de 2020.

Em entrevista à Diálogos da Transição, Barata afirma que a tendência será a de utilização dos reservatórios das hidrelétricas como base para expansão das fontes renováveis intermitentes, papel hoje atribuído às fontes despacháveis termoelétricas.

Por este caminho, existe a possibilidade de o país alcançar um mix de energia mais diversificado e limpo.

“Não podemos perder de vista que no mercado de energia nenhum planejamento é para o momento presente, tudo precisa ser pensado a muito longo prazo”, adverte.

Para o ex-diretor do ONS, a combinação de mudanças do clima, causadas pelo progressivo aquecimento da atmosfera do planeta, com a destruição de biomas produtores de água, como a floresta Amazônica, provoca graves impactos às usinas hidrelétricas brasileiras.

“Eu faço uma correlação direta entre mudanças climáticas, desmatamento e crise hídrica; a questão do impacto no suprimento de energia com relação a essa questão climática e reservatórios das nossas usinas hidrelétricas”.

Mais: Demanda por renováveis cresce no primeiro ano de pandemia; Brasil estende acionamento de térmicas e aumenta consumo de diesel

Risco energético e mudanças climáticas. Há décadas os cientistas alertam que o agravamento das mudanças climáticas globais tende a reduzir o padrão de chuvas das regiões Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste.

Estiagens severas, como as ocorridas no começo do século, entre 1999 e 2002 e entre 2013 e 2015, seriam mais frequentes.

A chegada de uma nova seca prolongada em 2020 — apenas cinco anos depois do último evento semelhante — confirma as projeções.

E Barata adiciona um elemento a essa equação: o desmatamento.

“Os maiores agressores do clima no Brasil são o desmatamento, a mobilidade e as térmicas a carvão concentradas na região Sul, que usam carvão de má qualidade, geram excesso de poluição e dependem de altos subsídios que o país inteiro paga”.

O papel do gás na transição. Como desligar todas as térmicas no país ainda não é possível, Barata defende o uso do gás para substituir usinas a óleo e a carvão, em uma espécie de redução de danos climáticos.

O gás atenderia a essa etapa intermediária para o abandono  de fontes mais poluidoras, a exemplo do carvão – movimento visto em grandes mercados globais, como os EUA.

“É daí que vem a ideia de se considerar o gás como combustível de transição. O que não podemos é usar as térmicas para desenvolver o mercado de gás no país”, defende

Esse debate está colocado, novamente, na proposta de capitalização da Eletrobras.

Racionamento? “Não faz sentido falar em desabastecimento neste momento porque o Operador Nacional do Sistema acionará todas as térmicas e pode até importar energia do Uruguai e da Argentina”, diz.

O diagnóstico bate com o que vem sendo dito pelo governo: o suprimento está garantido. É preciso, contudo, racionalizar o uso de água e energia para minimizar o impacto dos preços.

Para explicar como o Brasil se tornou dependente das termelétricas, Barata recorda a crise de 2001, quando o país sofreu com apagões e racionamento de energia.

“A partir dali, ficou clara a necessidade de complementar a nossa matriz, que era quase exclusivamente hidrelétrica, mas o projeto inicial buscava termelétricas a gás, o que não ocorreu”.

Ao contrário, o que se observou entre 2001 e 2010 foi a expansão de usinas a óleo combustível, mais baratas de implantar, mais poluentes e que geram energia mais cara.

Essa escolha deu origem ao atual mix hidrotérmico em que a falta de chuvas faz o consumidor pagar mais caro na conta, explica.

Só a partir de 2011, alternativas renováveis como solar e eólica passaram a ganhar impulso.

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Época de chuva, época de vento. A maior parte das regiões Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste vive o período seco de maio a outubro, quando a capacidade hidrelétrica cai e a conta de luz sobe com o acionamento das termelétricas.

Os ventos podem acabar com essa tradicional gangorra de preços porque é exatamente nessa época do ano que as eólicas geram mais energia. Com um papel importante da escala trazida pelos parques offshore.

“O vento segue a mesma trajetória do petróleo. Começou na terra, onde o custo de exploração é menor, depois vai para o mar”, compara.

“Eu estava entre os que pensavam que eólica offshore não faria muito sentido no Brasil e que só seria realidade bem depois de 2030, mas já há projetos em curso, antecipando esse novo mercado para a década atual, muito antes do que todo mundo previa”.

Barata é a favor do fim dos subsídios tanto para eólica como para energia solar porque os setores já seriam maduros e competitivos.

Curtas

A diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu criar um “gabinete de situação” para monitorar as condições do sistema elétrico nacional em 2021 e 2022 e propor medidas para evitar a escassez de energia no Brasil. O grupo vai se reunir semanalmente. A data da primeira reunião não foi informada. G1

O Congresso Nacional derrubou nesta terça (1) os vetos ao projeto de lei 5028/2019, que barravam a instauração de incentivos fiscais para a Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA). Sem os vetos, os valores recebidos por provedores de serviços ambientais no PSA serão retirados da base de cálculo de tributos federais sobre a renda. epbr

Uma pesquisa da Universidade de Berna, na Suíça, mostra que 37% das mortes causadas pelo calor nos últimos 30 anos podem ser atribuídas ao aquecimento global causado pelo homem. Segundo o estudo, o aumento da mortalidade associada às mudanças climáticas é evidente em todos os continentes. Jornal da USP

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta quarta (2) que a concretização de uma crise energética no Brasil pode afetar a condução da política monetária. Segundo Campos, eventos climáticos têm também impactos na taxa de juros neutra, aquela que permite o máximo de crescimento da economia sem acelerar a inflação. Valor

A Vale se comprometeu a proteger e recuperar mais 500 mil hectares de florestas no Brasil até 2030. A meta florestal irá contribuir para o objetivo da companhia de se tornar carbono neutra em 2050. No ano passado, o Fundo Vale implementou seis pilotos com diferentes modelos de sistemas agroflorestais e silvipastoris. Broadcast

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou nesta terça (1) a atualização da política de sustentabilidade com implementação de um plano de compensação ambiental até 2030. Objetivo é reduzir, permanentemente, a emissão de gases de efeito estufa resultante do funcionamento dos órgãos do Judiciário. G1

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