Diálogos da Transição

IPCC: emissões precisam cair agora

Relatório síntese do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) afirma que o tempo é curto para 1,5°C, mas há um caminho

IPCC: emissões precisam cair agora. Na imagem: Vista aérea de emissões poluentes sendo lançadas na atmosfera em complexo industrial, em uma grande cidade (Foto: Marcin Jozwiak/Pixabay)
Mudança do clima está afetando regiões e populações inteiras, com mais de três bilhões de pessoas altamente vulneráveis (Foto: Marcin Jozwiak/Pixabay)

newsletter

Diálogos da Transição

APRESENTADA POR

Editada por Nayara Machado
[email protected]

Até 2035, o mundo — e isso quer dizer todo o mundo — deve reduzir as emissões de gases de efeito estufa para 60% abaixo dos níveis de 2019. Mas, por enquanto, as emissões continuam a aumentar, com alguns países e grupos contribuindo muito mais do que outros.

Nesta segunda (20/3), o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) lançou seu relatório síntese, quarta e última parte do Sexto Ciclo de Avaliação, com um alerta sobre a velocidade com que a mudança do clima está afetando regiões e populações inteiras, com mais de três bilhões de pessoas altamente vulneráveis.

  • É muita gente: a população mundial em setembro de 2022 era estimada em 7,9 bilhões, pela ONU.

Enquanto isso, o prazo vai ficando acirrado para cumprir a meta de limitar o aumento de temperatura global a 1,5°C até o final do século.

Só o carbono emitido pela infraestrutura de energia fóssil existente, mais o que virá das construções planejadas, já é suficiente para superar a quantidade de gases de efeito estufa que pode ser emitida até a atmosfera esquentar 1,5°C.

Em 2021, as concentrações de CO2 atingiram 415,7 partes por milhão (ppm), metano 1.908 ppm e óxido nitroso 334,5 ppm. Esses valores representam, respectivamente, 149%, 262% e 124% dos níveis pré-industriais.

Cerca de 79% das emissões globais desses gases vieram dos setores de energia, indústria e transporte e 22% da agricultura, silvicultura e de outras formas de uso da terra.

O tempo é curto, mas há um caminho

Ainda dá tempo de manter a temperatura em 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Serão necessárias reduções “profundas, rápidas e sustentadas” das emissões em todos os setores nesta década.

“As emissões precisam cair agora, e serem cortadas quase pela metade até 2030, se essa meta tiver alguma chance de ser alcançada”, diz a ONU.

A boa notícia é que já temos a tecnologia e o dinheiro necessários para isso. É uma questão de escolha política, comenta Mercedes Bustamante, presidente da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e uma das autoras do relatório.

A solução proposta pelo IPCC é o “desenvolvimento resiliente ao clima”, que envolve a integração de medidas de adaptação e mitigação.

Acesso à energia limpa, eletrificação com baixo teor de carbono, transporte com zero e baixo teor de carbono e melhoria da qualidade do ar são alguns exemplos.

“Essas opções existem, são viáveis e de baixo custo, podem nos ajudar a reduzir emissões e, ao mesmo tempo, contribuir para a adaptação à mudança climática”, observa a cientista.

“Hoje, é muito claro que a primeira ação importante à adaptação climática é investir fortemente nas ações de mitigação”.

Preenchendo lacunas

Uma lacuna crucial está no financiamento — tanto para adaptação quanto para mitigação.

“Um resultado importante do relatório é indicar que existe liquidez. O exemplo é que o investimento em combustíveis fósseis continua predominando”, completa Bustamante.

Outra, na governança para implementação.

“Não estamos mais no momento de saber quais são os problemas, já sabemos o tamanho da emergência climática. Agora, devemos olhar quais são as lacunas de implementação e como podemos acelerar a implementação”, defende a secretária Nacional de Mudanças do Clima do MMA, Ana Toni.

Em um evento online sobre o relatório nesta segunda, Toni disse ser fundamental incorporar o tema da mudança climática nos processos já existentes de governança política — seguindo uma abordagem que vem sendo repetida pelo novo governo brasileiro.

“O tema não pode mais ser um ‘anexo’, ou separado como um nicho. Tem que estar incorporado nas políticas econômicas, sociais e industriais”, completa.

Agenda 2040

O tom dramático do IPCC ecoa a comunicação de abril do ano passado. O documento publicado hoje resume a produção científica do grupo nos últimos cinco anos e a mensagem é a mesma: não dá para continuar queimando combustível fóssil como se não houvesse amanhã.

“Este relatório é um apelo para acelerar massivamente os esforços climáticos de todos os países e setores e em todos os prazos”, disse o secretário-geral da ONU, António Guterres, em comunicado.

Guterres anunciou uma Agenda de Aceleração, que envolve líderes de países ricos comprometendo-se a atingir o zero líquido o mais próximo possível de 2040 e os países em desenvolvimento o mais próximo possível de 2050.

Exige o fim do carvão, geração líquida zero de eletricidade até 2035 para todos os países ricos e 2040 para o resto do mundo, e a interrupção de todo licenciamento ou financiamento de novos petróleo e gás, e qualquer expansão do petróleo e reservas de gás.

Cobrimos por aqui:

Gostou? Compartilhe no WhatsApp!

Curtas

Insustentável

Uma operação de combate à escravidão, que terminou na sexta (17), resgatou 212 trabalhadores do plantio de cana-de-açúcar em Goiás. Eles estavam alojados em Itumbiara e Porteirão (GO) e Araporã (MG) e atuavam para a mesma prestadora de serviços que fornecia mão de obra a quatro fazendas e uma usina. Este é o maior resgate de 2023, batendo o recorde dos 207 “escravizados do vinho” de Bento Gonçalves (RS). UOL

A prestadora de serviços terceirizados SS Nascimento Serviços e Transporte e cinco tomadores — quatro fazendas de cana e a unidade de Edéia (GO) da usina BP Bunge Bioenergia (uma das maiores processadoras de cana do país) — assumiram a responsabilidade e se dividiram para pagar os trabalhadores.

Roteiro para 2030

A Colúmbia Britânica, no Canadá, aprimorou seus padrões para novos projetos de gás natural liquefeito (GNL), parte de uma nova estrutura de energia que exige que os operadores da província sejam livres de emissões até 2030.  O governo canadense também está avaliando os padrões ambientais mais rígidos para o país que é um grande produtor de combustíveis fósseis. Reuters

Diesel R

A Petrobras certificou a sustentabilidade do óleo de soja usado no seu diesel R, um combustível de petróleo coprocessado com conteúdo renovável. Em fevereiro, a petroleira recebeu o certificado da ISCC (International Sustainability Carbon & Certification) na unidade de coprocessamento da Repar (Araucária, PR).

Consumo de eletricidade em alta

Em fevereiro, o Brasil consumiu 69.522 megawatts médios de energia elétrica, volume 1,6% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado. Houve crescimento de 2,3% no mercado livre, ante 1,1% no ambiente.

De acordo com dados preliminares da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), no mercado regulado, a geração distribuída solar conseguiu atender a uma parte da demanda extra por eletricidade. O avanço no segmento, caso não houvesse a geração distribuída, seria de 4,1% frente ao mesmo mês de 2022, diz a CCEE.