Acordo Mercosul-UE

Europa vê urgência em acordo com Mercosul para fornecimento de minerais críticos

União Europeia vê no acordo, e, em especial no Brasil, uma oportundiade para reduzir sua dependência por minerais da China

Lula (à esquerda) e Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (à direita), durante sessão de abertura do fórum empresarial União Europeia-América Latina, em Bruxelas, na Bélgica (Foto Ricardo Stuckert/PR)
Lula (PT) e Ursula von der Leyen na abertura do fórum empresarial UE-América Latina, em Bruxelas, na Bélgica (Foto Ricardo Stuckert/PR)

RIO — A União Europeia enxerga o acordo comercial com o Mercosul como uma peça-chave para garantir o acesso a minerais críticos indispensáveis à transição energética, às tecnologias digitais e à autonomia estratégica do bloco.

Representantes do Parlamento e da Comissão Europeia destacaram em webinar, na semana passada, que o tratado abre uma janela para reposicionar a relação entre as duas regiões, com o Brasil no centro da estratégia de fornecimento de matérias-primas estratégicas.

A eurodeputada Hana Jalloul Muro, vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores (AFET) do Parlamento Europeu, defendeu o acordo como “uma oportunidade única e muito importante”, em meio a um cenário de instabilidade das relações com os EUA e a dependência excessiva da China.

“Se quisermos falar de autonomia estratégica, este acordo é fundamental. Ele ajudará a manter a nossa autonomia estratégica na Europa e a reforçar nossa liderança”, disse. 

Segundo ela, a dependência europeia de mais de 90% das terras raras provenientes da China expõe o bloco a riscos significativos.

“Essas dependências deixam a Europa muito exposta a medidas unilaterais e tornam vulneráveis nossas cadeias de suprimento e nossas indústrias”.

Nesse contexto, o Brasil surge como parceiro central na avalição da eurodeputada.

“O Brasil é um parceiro-chave, especialmente considerando suas vastas reservas de nióbio, um material que a União Europeia considera crítico para nossas economias, dada sua importância essencial para semicondutores. O mesmo se aplica ao níquel e ao manganês, que estão amplamente presentes em seu território”. 

Para ela, o capítulo específico sobre matérias-primas no acordo é “extremamente positivo” e permitirá assegurar o fornecimento desses minerais de forma sustentável.

Europa precisa urgentemente de minerais críticos

Do lado da Comissão Europeia, a negociadora-chefe do acordo UE–Mercosul, Kristina Grutschreiber, reforçou que o tratado ganhou ainda mais relevância em um ambiente de “turbulência geopolítica”. 

“Acreditamos sinceramente que temos uma oportunidade histórica de concluir um acordo extremamente relevante. (…) este acordo é ainda mais importante do que seria em circunstâncias normais”, disse.

Em relação aos minerais críticos, Grutschreiber afirmou que a urgente necessidade europeia por essas matérias-primas se sobrepõe à resistência política na Europa, especialmente ligada ao setor agrícola da França, que até aqui impedia a implementação do acordo.

“Agora estamos falando de matérias-primas críticas, de que a Europa precisa desesperadamente (…). Essa não é uma questão sensível; ao contrário, é uma área em que temos necessidade de importações e na qual nos beneficiaríamos significativamente da diversificação e da possibilidade de importar mais da América Latina”, disse. 

Grutschreiber reforçou que a celeridade para o acordo pode ser mais vantajosa para a UE.

“Se não fizermos algo agora, acabaremos perdendo essa oportunidade. E, se eu fosse o Brasil, começaria a olhar para outros parceiros e deixaria de esperar pela União Europeia — o que seria bastante lamentável”.

A negociadora também lembrou que o texto incorporou elementos inéditos em sustentabilidade. 

“Foi especialmente importante que o Acordo de Paris sobre mudança climática tenha se tornado um elemento essencial do acordo”.

Além disso, “conseguimos chegar a um compromisso para interromper o desmatamento até 2030”, o que, segundo ela, agrega valor ao tratado.

Brasil não quer ser exportador de mineral bruto

Do lado brasileiro, Mario Bierkens, assessor da Secretaria Nacional de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia, detalhou como a política nacional de minerais críticos, prometida pelo governo há mais de dois anos, se conecta diretamente ao acordo Mercosul-UE.

“Nossa política entende os minerais críticos como fundamentais para o desenvolvimento sustentável, para as bases industriais e para a transição energética global”. 

Ele lembrou que o Brasil detém reservas relevantes de lítio, níquel, cobre, grafite, nióbio, terras raras e outros minerais essenciais para baterias e sistemas de energia limpa.

Segundo Bierkens, a estratégia brasileira se apoia em dois eixos principais: ampliar o conhecimento geológico e impulsionar a produção doméstica, e desenvolver a indústria de processamento e agregação de valor

“Estamos determinados a não permanecer apenas como exportadores de minério bruto”, afirmou. 

Para isso, o país busca parcerias internacionais que envolvam tecnologia, financiamento e acesso a mercados.

“A União Europeia traz tecnologia, inovação e financiamento sustentável. O Brasil traz ativos minerais, potencial industrial, uma matriz energética limpa — uma das mais limpas do mundo — e capital humano qualificado”. 

Para ele, o acordo pode destravar financiamento europeu, apoiar joint ventures e integrar o Brasil a cadeias de suprimento previsíveis e de baixo carbono.

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