Mercado de gás

Indústria vê oportunidade para revisão de concessões de gás; Abegás fala em quebra de contratos

Agência de Sergipe marca audiência para rediscutir contrato da Sergás, assinado em 1994 – e judicializa operação que levou à venda de participação na distribuidora

Setor indústrial vê oportunidade para revisão de concessões de gás natural; Abegás fala em risco de quebra de contratos. Na imagem: Trabalhador em forno de alta temperatura em siderúrgica (Foto: Divulgação Vika Controls)
Indústria siderúrgica é uma das candidatas naturais à migração para mercado livre de gás (Foto: Divulgação Vika Controls)

RIO – O Fórum do Gás, entidade que reúne associações empresariais ligadas sobretudo ao setor industrial, espera que a discussão sobre a revisão do contrato de concessão da Sergas, em Sergipe, abra as portas para debates na mesma direção em outros estados.

A Agrese, a agência reguladora de Sergipe, marcou para 22 de julho uma audiência pública para rediscutir, dentre outros pontos, a taxa de retorno de investimentos da concessionária sergipana – de 20%, considerada alta pela indústria.

O debate opõe grandes consumidores e as distribuidoras de gás natural, representadas por sua vez pela Abegás – que vê na iniciativa um risco de quebra de contrato, justamente num momento em que a Energisa está entrando no capital da Sergas e de outras quatro distribuidoras nordestinas com o mesmo modelo de contrato.

Essa semana, o governo de Sergipe entrou com uma ação, com pedido liminar para suspender o negócio. Argumenta que teve seu direito de preferência desrespeitado pela Compass, na operação subsequente à privatização da Gaspetro.

Ao justificar a abertura da audiência, o regulador estadual pontuou que o atual contrato de concessão da Sergas, assinado em 1994, está defasado. Ele vence em 2044.

Diagnóstico semelhante ao da FGV Energia, que recomendou ao governo sergipano, em estudo recente (ler na íntegra, em .pdf), que o contrato da distribuidora fosse aditado para refletir a atual conjuntura jurídica e econômica do país.

A sugestão partiu de uma série de entrevistas do instituto de pesquisa com agentes do setor de gás.

A regulação estadual, em Sergipe, estabelece uma taxa de retorno de 20% ao ano sobre o investimento, o que, na visão da FGV, “gera um custo relativamente alto para o grande consumidor” e é anacrônica –- criada num período de alta inflação nos anos 1990.

“A concessão atual do serviço de gás canalizado em Sergipe foi citada como um possível inibidor para a entrada de uma indústria nova com interesse em fazer uma rede dedicada de gás, devido ao custo de capital atrelado ao projeto”, cita o estudo da FGV Energia.

Fórum do Gás diz que Sergipe pode servir de referência

O Fórum do Gás emitiu uma nota de apoio à iniciativa da Agrese. Cita que o modelo de contrato de Sergipe é similar ao adotado em muitos outros estados.

E que uma discussão aprofundada sobre o assunto “certamente chamará a atenção além das fronteiras de Sergipe, podendo servir de referência regulatória do país”.

A entidade argumenta que o modelo do contrato de concessão da Sergas não atende mais às necessidades atuais do mercado.

E que, embora o debate sobre a competitividade do gás natural e a expansão do mercado consumidor seja mais amplo e passe também por questões como o preço da molécula e custos de escoamento, processamento e transporte, a revisão do contrato de concessão das distribuidoras é bem-vindo.

Para Abegás, discussão está fora do tempo

O diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, Marcelo Mendonça, questiona o movimento de Sergipe. Alega que discussões desse porte deveriam ser feitas em momentos de renovação dos contratos de concessão – no caso da Sergas, o atual contrato vence apenas em 2044.

“Há um contrato em vigor. Vejo um risco para a segurança jurídica. Para um estado que tem uma perspectiva de aumento de oferta de gás e que tem como objetivo atrair novas indústrias e desenvolver o mercado local de gás, é um sinal ruim. É uma discussão fora do tempo”, comentou.

Mendonça lembra que a revisão do contrato de concessão precisaria da concordância das partes e que, se ela provocar um desequilíbrio na concessão, pode ensejar pedidos de ressarcimento por parte da concessionária.

“Nada do que está previsto no atual contrato tem impedido o desenvolvimento do mercado hoje. O grande problema para desenvolvimento do mercado de gás no Brasil continua sendo a quantidade de ofertantes. A fábrica de fertilizantes de Sergipe não está fechada por falta de regulação, é por falta de suprimento de gás competitivo”.

Em maio, ao ser questionado por analistas e investidores sobre os riscos de uma eventual revisão dos contratos de concessão das distribuidoras adquiridas, o diretor financeiro da Energisa, Maurício Botelho, disse que o atual modelo regulatório é “muito adequado” para a realidade da concessão da distribuição de gás no Nordeste, de baixa interiorização e inserção do gás na matriz energética local.

O CEO do grupo, Ricardo Botelho, destacou, na mesma ocasião, que qualquer mudança no contrato atual precisa “contar com interesse unânime dos três sócios” – no caso o estado, a Mitsui e, no futuro, a Energisa.

Discussão em Sergipe

A Agrese informou que, na audiência do dia 22 de julho, serão discutidos diversos pontos da concessão, para além da coerência da taxa de retorno de investimentos de 20%.

A agência avalia uma possível compatibilização com outras metodologias – a exemplo do WACC, o custo médio ponderado de capital, usado como taxa de remuneração do capital no cálculo da margem máxima das distribuidoras.

Outros temas que serão discutidos incluem mecanismos de Conta Gráfica (compensação pelas diferenças entre o preço da molécula de gás incluído nas tarifas e o efetivamente pago pela concessionária ao supridor); e os critérios de cálculo da tarifa.