Energia

Indústria nuclear busca espaço na transição do carvão no Brasil

Associação defende inserção de reatores modulares em termelétricas para preservar infraestrutura existente no Sul do país

Indústria nuclear busca espaço na transição do carvão no Brasil e defende inserção de reatores modulares (SMRs) em termelétricas. Na imagem: Governo define conselho para transição justa do carvão de SC. Na imagem: Complexo térmico Jorge Lacerda (SC), 857 MW. Composto por três usinas, a primeira em operação desde 1965 (Foto: Divulgação)
Complexo térmico Jorge Lacerda (SC) é composto por três usinas, a primeira em operação desde 1965 (Foto: Divulgação)

RIO – De olho na transição energética, a indústria nuclear brasileira quer aproveitar parte da infraestrutura existente nas usinas a carvão no Sul do Brasil para gerar energia com menos emissões de carbono a partir de pequenos reatores modulares (SMRs, na sigla em inglês).

Em setembro de 2023, a Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares (Abdan) organizou uma visita ao complexo termelétrico Jorge Lacerda, em Santa Catarina, um dos potenciais parceiros para o projeto. O encontro contou com a participação de representantes da Andrade & Gutierrez, OEC Engenharia, Grupo MPE Engenharia, Tractebel Engie, EDF Brasil, Holtec, Westinghouse, Atech e Rosatom.

Segundo o presidente da Abdan, Celso Cunha, o objetivo é aproveitar as instalações para gerar uma energia considerada mais limpa.

Ele afirma que as SMRs são menores e mais seguras do que as usinas nucleares de grande porte, e que é possível desenvolver o projeto em parceria com empresas internacionais, que já têm experiência nesse tipo de empreendimento no exterior.

Hoje, existem 102 projetos de instalação de SMRs no mundo e outros 97 em fase de licenciamento, mas nenhum está no Brasil. Apenas China e Rússia operam SMRs, segundo a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

No caso da substituição de usinas termelétricas a carvão por pequenos reatores nucleares, a Polônia tem um projeto para construir 24 SMRs, além de duas grandes centrais, como estratégia de transição.

Cunha destaca que as usinas nucleares de menor porte podem ajudar a evitar crises econômicas em regiões que dependem de térmicas a combustíveis fósseis. É o caso da região Sul do Brasil, onde estão concentradas as reservas e as usinas a carvão.

Em janeiro de 2022, Santa Catarina aprovou seu plano de transição energética justa com diversas ações voltadas à redução de emissões na cadeia produtiva do carvão.

No Rio Grande do Sul, o governo estadual está contratando uma consultoria para subsidiar a transição das comunidades que dependem da atividade carbonífera, partindo do princípio que a demanda por combustíveis fósseis vai cair.

“É muito melhor essa substituição [por SMRs] do que perder todo o empreendimento e deixar de gerar energia. Com o tempo, é possível treinar a mão de obra existente para trabalhar na nova térmica e minimizar o desemprego”, defende Cunha. Ele observa que o Brasil tem a sexta maior reserva de urânio do mundo, o que pode ajudar a viabilizar projetos do tipo.

Transição com gás natural e CCUS

Dona do complexo termelétrico Jorge Lacerda (740 MW), a Diamante Energia não se posicionou sobre a adoção das SMRs até o fechamento desta reportagem.

Em abril de 2023, a empresa anunciou a criação de uma joint venture com o grupo Nebras Power, subsidiária da Qatar Electricity & Water Company (QEWC), para investir R$ 5 bilhões em dois projetos de termelétricas a gás, em Santa Catarina. Em paralelo, a companhia investe em projetos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em captura de carbono.

Com o fim das operações do ativo programado para a década de 2040, o grupo está apostando na captura, armazenagem e uso de carbono (CCUS) e no gás natural como vetores de sua transição. Outros projetos incluem a indústria de fertilizantes nitrogenados – também inserida na cadeia de valor do gás.

O CCUS é defendido por representantes da indústria do carvão como a melhor alternativa para descarbonizar os complexos termelétricos, junto com a substituição das máquinas atuais por novas, mais eficientes.

O mercado de CCUS ainda está em regulamentação no país, mas Santa Catarina já tem um projeto piloto de captura de CO2 e desenvolvimento de materiais sintéticos a partir de cinzas de carvão.

O projeto é desenvolvido pela Associação Beneficente da Indústria de Carvão de Santa Catarina (SATC), com apoio da Eneva, empresa de energia e gás natural que também atua com o combustível em usinas termelétricas.