O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, acompanhou parecer técnico concluído em 20/4 e indeferiu nesta quarta-feira (17/05) licença solicitada pela Petrobras para Atividade de Perfuração Marítima no bloco FZA-M-59, na bacia da Foz do Amazonas.
Nessa etapa do licenciamento, a Petrobras havia solicitado a realização da APO (avaliação pré-operacional), uma simulação de uma emergência e não a licença propriamente dita.
Segundo o órgão, “a decisão, que ocorre em função do conjunto de inconsistências técnicas, segue recomendação de analistas da Diretoria de Licenciamento Ambiental do Ibama”.
“Não restam dúvidas de que foram oferecidas todas as oportunidades à Petrobras para sanar pontos críticos de seu projeto, mas que este ainda apresenta inconsistências preocupantes para a operação segura em nova fronteira exploratória de alta vulnerabilidade socioambiental”, aponta Agostinho no despacho em que nega a licença ambiental.
No despacho, o presidente do Ibama acompanha o entendimento da equipe técnica sobre a “necessidade de se retomar ações que competem à área ambiental para assegurar a realização de Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) para as bacias sedimentares que ainda não contam com tais estudos e que ainda não possuem exploração de petróleo, no prazo mais breve possível”.
AAAS foi proposta por Marina Silva
A exigência de AAAS para Foz do Amazonas foi proposta pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), que nomeou Agostinho presidente do Ibama, após a retornar nesse terceiro governo Lula. Marina declarou ser contra a licença há dois meses, mas afirmou que a decisão técnica cabe ao órgão ambiental.
Cabe ao governo federal determinar a contratação dos estudos, por decisão conjunta do Ministério de Minas e Energia (MME), responsável pela priorização das bacias; e do Ministério de Meio Ambiente (MMA). Tal iniciativa nunca foi tomada para a Foz do Amazonas.
“Apesar de regulamentada desde 2012, a AAAS jamais foi realizada na região da margem equatorial”, afirma nota do Ibama, desta quarta (17/5).
Segundo o órgão, “a bacia da foz do Amazonas é considerada uma região de extrema sensibilidade socioambiental”. Ela cita unidades de conservação, terras indígenas, mangues, “formações biogênicas de organismos como corais e esponjas, além de grande biodiversidade marinha com espécies ameaçadas de extinção, como boto-cinza, boto-vermelho, cachalote, baleia-fin, peixe-boi-marinho, peixe-boi-amazônico e tracajá”.
Durante o governo Bolsonaro (PL), ambientalistas chegaram a questionar a ausência de AAAS prévias aos leilões de petróleo, mas a tese foi vencida no Supremo Tribunal Federal (STF). O entendimento, posteriormente consolidado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), é que as AAAS não são pré-requisito da contratação de áreas.
Minas e Energia é favorável à campanha
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), é abertamente favorável à campanha de exploração na Margem Equatorial. Internamente, a pasta comandada por Silveira tem subsidiado outras áreas do governo com informações sobre o potencial econômico e questões operacionais da campanha na Foz do Amazonas.
Em abril, o ministro intercedeu junto ao presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, em favor de uma solução para a licença de perfuração na Foz do Amazonas, projeto da Petrobras em águas profundas do Amapá.
“Tomei a liberdade de ligar para o presidente do Ibama”, disse Silveira à epbr, na época. “Ele [presidente do Ibama] demonstrou muita parcimônia. Recebeu as minhas ponderações com muito bom grado”, disse. “E se comprometeu a se debruçar com os técnicos para ver se acha solução para o licenciamento.”
Naquele momento, as áreas técnicas do Ibama já haviam concluído o parecer contrário ao projeto.
Silveira não está sozinho e, além de apoio em outras áreas do governo federal, os governadores do Amapá, Clécio Luís (Solidariedade) e do Pará, Helder Barbalho (MDB), buscam apoio do Planalto na mediação com a área ambiental.
O que são as AAAS?
AAAS é uma análise estratégica que permite identificar áreas em que não seria possível realizar atividades de extração e produção de petróleo e gás em razão dos graves riscos e impactos ambientais associados.
“A ausência de AAAS dificulta expressivamente a manifestação a respeito da viabilidade ambiental da atividade, considerando que não foram realizados estudos que avaliassem a aptidão das áreas, bem como a adequabilidade da região, de notória sensibilidade socioambiental, para a instalação da cadeia produtiva do petróleo”, acrescenta o presidente do Ibama no despacho.
O processo de licenciamento ambiental do bloco FZA-M-59 foi iniciado em 4 de abril de 2014, a pedido da BP Energy do Brasil, empresa originalmente responsável pelo projeto. Em dezembro de 2020, os direitos de exploração de petróleo no bloco foram transferidos para a Petrobras, que teve o pedido de licença definitivamente negado nesta quarta-feira.
É a segunda negativa para atividades de perfuração na região – em 2018, o Ibama negou a emissão de licença para cinco blocos sob controle da empresa TotalEnergies, que também desistiu da Foz do Amazonas.
Petrobras aguardava decisão sobre simulação
Nessa etapa do licenciamento, a Petrobras havia solicitado a realização da APO (avaliação pré-operacional), uma simulação de uma emergência, que faz parte do desenvolvimento dos planos de resposta criados no licenciamento de atividades petrolíferas.
Rodrigo Agostinho concordou com o parecer de técnicos do Ibama, manifestado em 20 de abril, que a campanha da Petrobras na região é ambientalmente inviável e, portanto, nem sequer cabe realizar a simulação.
“(…) Realizar uma Avaliação Pré-Operacional (APO) em campo não se justifica do ponto de vista técnico, pois as estratégias apresentadas conceitualmente não são compatíveis com o nível de exigência necessário para operação em ambiente tão relevante”, diz o despacho do presidente do Ibama.
Agostinho, inclusive, registra que coube a Petrobras mobilizar equipamentos antes da aprovação do plano de emergência. “Ressalte-se que a opção de realizar a mobilização de equipamentos na área antes da aprovação do Plano de Emergência Individual foi decisão exclusiva da companhia”.
Além da instalação de um hospital veterinário – centro de despetrolização de fauna –, embarcações e equipe, a Petrobras contratou uma sonda para margem equatorial com custo estimado em centenas de milhares de dólares por dia.
O valor exato gasto pela companhia com a mobilização não foi divulgado pela companhia. Decisões tomadas na gestão anterior.
Ibama muda entendimento sobre simulação na Foz do Amazonas
As conclusões da equipe técnica do Ibama foram contestadas internamente pelo chefe da Diretoria de Licenciamento Ambiental (Dilic), Régis Fontana, que sugere que a APO seja feita antes da decisão derradeira sobre o avanço ou não do pedido de licença.
A APO faz parte do rito do pedido de licenciamento e tem sido discutida na Foz do Amazonas desde 2017, inicialmente pela BP, antes de a Petrobras assumir a empreitada pelo bloco FZA-M-59, em 2020.
Já no ano seguinte, a companhia começou a atender exigências feitas pelo Ibama para que a simulação saísse do papel, em linha com o calendário estabelecido. A previsão inicial era realizar a simulação em agosto de 2022, o cronograma chegou a ser aprovado pela autarquia ambiental, mas houve dificuldades logísticas e demandas por melhorias.
“A decisão do Ibama sobre a concessão da licença operacional deve ocorrer após a realização da APO. No momento, a Petrobras aguarda o agendamento do exercício pelo Ibama”, manifestou-se a empresa, em nota, na semana passada.
Em resposta à agência epbr, a Petrobras afirmou ainda que “está com todos os recursos operacionais e pessoais mobilizados para realização do exercício simulado de resposta a emergências, que é um requisito do processo de licenciamento ambiental”.
Com informações de Hanrrikson de Andrade e edição adicional de Gustavo Gaudarde