Diálogos da Transição

Preço e emissões tiram competitividade de hidrogênio cinza; azul precisa de mercado de carbono, mostra EPE

Notas técnicas da EPE avaliam viabilidade da produção de hidrogênio cinza e azul no Brasil

Preço e emissões tiram competitividade de hidrogênio cinza; azul precisa de mercado de carbono, mostra EPE. Na imagem: Dutos de rede de distribuição de gás natural (Foto: Divulgação Generac)
Gás natural é principal componente de preço no hidrogênio cinza, entre 45% a 75% do custo médio com aquisição de energia (Foto: Divulgação Generac)

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Diálogos da Transição

eixos.com.br | 23/02/22
Apresentada por

Editada por Nayara Machado
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Usar o hidrogênio cinza, produzido a partir de gás natural, para substituir o gás como fonte de energia será desvantajoso economicamente e com benefícios ambientais limitados, mostra um estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) divulgado nesta quarta (23/2).

Já a adoção de tecnologias de captura, armazenamento e uso de carbono (CCUS, na sigla em inglês) ou a produção a partir de fontes renováveis (biomassa ou eletrólise) podem tornar sua utilização interessante para abastecimento através da malha de distribuição.

As conclusões fazem parte de duas notas técnicas produzidas pela EPE para avaliar aspectos técnicos, econômicos e logísticos, entre outros, da produção de hidrogênio cinza e azul (gás natural + CCUS) no Brasil.

As notas também trazem estudos de caso para as duas rotas e são subsídios para o Plano Nacional de Hidrogênio (PNH2) anunciado pelo governo federal.

No caso do hidrogênio cinza, o estudo de caso indica que não faz sentido trocar o gás natural pelo hidrogênio como fonte de energia.

Do ponto de vista econômico, o hidrogênio tem maior custo e menor densidade energética que o gás natural. E um eventual benefício ambiental seria limitado, uma vez que são liberadas grandes quantidades de CO2 durante a etapa de reforma do gás.

Por outro lado, a rota azul, que faz a reforma a vapor de metano com CCUS, poderia resultar em emissões muito menores e o custo mais elevado do processo poderia ser remunerado pela precificação do carbono.

“Economicamente, ao se precificar o carbono mitigado e/ou retirado da atmosfera, a receita do projeto de H2 poderia ser aumentada, reduzindo o preço final ao consumidor”, diz a EPE.

Segundo a EPE, a viabilidade desta estratégia dependerá da evolução dos mercados de carbono ao redor do mundo, que hoje se encontram em diferentes estágios de maturidade e com diferentes precificações, podendo variar de US$ 1 a US$ 50/kgCO2eq.

No Brasil, por exemplo, o RenovaBio criou o primeiro mercado regulado de carbono do país — especificamente para o setor de combustíveis. Hoje, o preço do crédito de descarbonização (CBIO) está na casa dos R$ 90.

Enquanto na Europa, o preço das licenças no mercado de carbono fechou em alta recorde acima de 96 euros (cerca de R$ 542,70) na primeira semana de fevereiro, com analistas esperando que o nível simbólico de 100 euros possa ser ultrapassado em breve.

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Gás natural é o principal componente de preço no hidrogênio cinza, quando comparado a outras variáveis, como escala e localização da planta, ficando na faixa de 45% a 75% do custo médio com aquisição de energia.

Em um dos cenários, uma mistura contendo 20% de H2 e 80% de gás natural resultaria em aumento de aproximadamente 10% no custo do combustível fornecido ao consumidor em relação ao cenário 100% de gás natural.

Já na hipótese com hidrogênio puro, o aumento seria da ordem de 133%. Também contribui para essa elevação a necessidade de adaptação da infraestrutura existente para distribuição.

“Existem avanços no desenvolvimento de tecnologias para a implantação de unidades de produção de hidrogênio cinza, porém uma quantidade considerável de patentes admite a possibilidade de acoplamento com instalações de CCUS adotando a estratégia do hidrogênio azul”, diz.

A EPE destaca que pelo menos 12 países consideram a utilização do hidrogênio cinza em suas estratégias nacionais até 2030, enquanto 8 deles ainda consideram a manutenção do uso dos combustíveis fósseis em período posterior, embora acoplada a CCUS.

“Apesar da grande variabilidade, a rota tecnológica de hidrogênio cinza tem menores custos quando comparada às outras opções, e deve satisfazer a demanda de hidrogênio de curto prazo, até que rotas tecnológicas alternativas de baixo ou zero carbono tornem-se economicamente competitivas”.

Preço do hidrogênio azul é mais sensível à capacidade instalada de sua cadeia de valor do que ao custo do gás natural, indica o segundo estudo de caso.

Independente do ambiente de produção ser onshore ou offshore, a influência do custo de CCUS no preço final do hidrogênio azul é maior quando há diferenças entre a capacidade instalada para transporte e armazenamento.

Esse custo poderia ser mitigado com o aproveitamento de infraestrutura para transporte e armazenamento existente, além da formação de clusters industriais de captura de CO2 e hubs para compartilhamento de estruturas.

“Enquanto o hidrogênio cinza utiliza uma tecnologia madura e já bem estabelecida no mercado, o hidrogênio azul utiliza unidades de CCUS que ainda apresentam custos elevados (devido à menor maturidade tecnológica) de modo que acabam tendo maior influência no custo final”, explica.

Os estudos de caso onshore e offshore também avaliam o impacto da venda dos créditos de carbono, considerando a negociação do CO2 capturado.

E, mais uma vez, a capacidade instalada tem grande influência no preço.

“Além da redução dos custos decorrente do ganho de escala, quanto maior a quantidade de CO2, maior é a renda resultante da comercialização do carbono armazenado”.

Ainda assim, diz a EPE, mesmo para um cenário de US$ 100 a tonelada de carbono em uma planta de 1.000 ton H2/dia, o preço do hidrogênio é estimado em aproximadamente duas vezes o do gás natural, seu principal concorrente.

“Isso explica o fato de a indústria do gás avaliar o hidrogênio azul como um bem complementar, que poderá ser comercializado em associação com o gás natural ou como um produto prêmio que permitirá uma transição mais rápida rumo à economia de baixo carbono”, completa.

Intensidade de carbono como fator de competitividade. GTI, National Energy Technology Laboratory (NETL) e S&P Global Platts lançaram este mês a Iniciativa Aberta de Hidrogênio (OHI, na sigla em inglês) para aumentar a transparência sobre o impacto ambiental da produção de hidrogênio.

O objetivo é medir e comparar a intensidade de carbono da produção de hidrogênio para ir além da rotulagem por cores (verde, azul, cinza etc).

A iniciativa vai se inspirar no Modelo OPGEE de Stanford, que se tornou o padrão da indústria adotado para medir a intensidade de carbono do petróleo.

Enquanto o governo brasileiro tenta alavancar a rota do gás, outras iniciativas estão apostando no hidrogênio verde — rota da eletrólise com energia renovável.

Para o gerente de inovação e sustentabilidade da Câmara de Comércio e Indústria Brasil Alemanha do Rio de Janeiro (AHK Rio), Ansgar Pinkowski, o Brasil se beneficiaria de um maior foco no planejamento de hidrogênio verde (H2V) no país.

“É importante para o governo brasileiro mostrar ao mundo que está debruçado no tema, e que considera o tema relevante”, disse em entrevista à epbr.

Segundo Ansgar,  ao contrário do Brasil, a Alemanha possui uma estratégia bem definida de descarbonização, baseada na adoção do hidrogênio verde, o que inclui até a realização de um leilão para a compra do combustível — previsto para o primeiro semestre de 2022.

“A Alemanha tem diretrizes bem concretas de descarbonização até 2050, com um roadmap de hidrogênio verde, um norte muito acertado, muito concreto. Já o governo brasileiro decidiu por uma outra estratégia, mais de observador, de vamos ver o mercado e criar condições do mercado”, diz.

Mesmo assim, Pinkowski diz que empresas alemãs irão fazer bons anúncios no Brasil em 2022. Leia na entrevista

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