Roteiro político

Plano Clima reconhece papel do hidrogênio, mas falta integração entre políticas setoriais, avalia setor

Documento menciona hidrogênio em ações de redução de emissões na energia, transportes, indústria, agropecuária e cidades

Estação de reabastecimento de hidrogênio da Shell, em Cobham, na Inglaterra (Foto Divulgação)
Estação de reabastecimento de hidrogênio da Shell, em Cobham, na Inglaterra (Foto Divulgação)

RIO — O lançamento da íntegra dos planos setoriais de mitigação da Estratégia Nacional de Mitigação (ENM) do Plano Clima foi recebido positivamente pelo setor de hidrogênio, que vê avanços no reconhecimento da importância do energético na transição.

O documento, que estava em consulta pública até 18 de agosto, indica como o país pretende reduzir emissões em setores como energia, transportes, indústria, agropecuária, resíduos e cidades, e traz menções ao hidrogênio em todos esses eixos.

Para Fernanda Delgado, diretora-executiva da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (Abihv), esse destaque é positivo, mas falta integrar os diferentes setores. 

“O Plano traz uma abordagem da importância do uso estratégico do hidrogênio e da necessidade de melhorias regulatórias e de infraestrutura”, disse Delgado à agência eixos

Mas acrescenta “a importância de maior segurança jurídica e de uma integração efetiva entre políticas setoriais, o Marco Legal do Hidrogênio, outros normativos relacionados e as metas nacionais de redução de emissões”. 

O Plano Clima aponta, por exemplo, a integração do hidrogênio de baixo carbono como vetor estratégico até 2035 no setor de energia, com a implementação de hubs industriais e a regulamentação do marco legal.

No transporte, prevê, até 2028, incentivos para substituição de frotas movidas a combustíveis fósseis por veículos com célula a combustível e hidrogênio, além de programas de infraestrutura de abastecimento. 

Na agropecuária, a amônia verde aparece como alternativa para fertilizantes de baixo carbono, porém sem ações concretas para este objetivo.

Já em cidades, o hidrogênio é mencionado como alternativa para frotas públicas e serviços essenciais, sendo necessárias ações como a criação de um programa para implementar infraestrutura abrangente de abastecimento, em um horizonte até 2035. 

Entre os desafios, Delgado lista a necessidade de melhoria da infraestrutura para conexão dos projetos à rede básica, adequação e expansão das redes de transporte, armazenamento e abastecimento em cidades e portos, além do apoio a projetos-piloto, programas de P&D e ao desenvolvimento de hubs.

Instrumento político

Giovani Machado, presidente do Conselho Consultivo da Associação Brasileira do Hidrogênio (ABH2), avalia que o Plano Clima deve ser entendido como um instrumento político e de coordenação, mais do que um roteiro fechado.

Segundo Machado, a função central do documento é oferecer uma base de informações que permita a construção de consensos.

“Na verdade, ali é a consolidação de um conjunto de discussões que ainda será levado ao Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM). Não podemos cobrar do Plano Clima mais do que ele é: um instrumento, não é o processo em si”, disse à agência eixos.

“Um instrumento que tenta refletir um processo que tem diversas virtudes e, sobretudo, a de estruturar as informações para o processo de tomada de decisão”, completou.

Para Machado, o documento também serve como guia para equilibrar paradoxos do processo de transição energética, como a coexistência do uso de óleo e gás no curto prazo com a expansão de tecnologias de baixo carbono, especialmente para garantir que a não haja impactos sociais negativos com adoção de tecnologias que ainda são caras e excludentes.

Pouca ambição

O documento foi recebido com certa frustração em setores como nuclear, hidrelétricas e baterias, recebendo críticas pela pouca ambição em relação à expansão de renováveis na matriz energética.

A meta do governo brasileiro para participação de fontes como solar, eólica, hídrica e biomassa na matriz elétrica é de 82,7% em 2030 e 82,7% a 86,1% em 2035, abaixo dos 88% registrados em 2024.
 
A explicação para o cálculo é que ele representa a média da última década (2015–2024), que oscilou entre 75% e 88% e que eventos climáticos extremos podem exigir maior despacho térmico.

O secretário nacional de Transição Energética e Planejamento do Ministério de Minas e Energia (MME), Gustavo Ataíde, chegou a reconhecer a dificuldade de sustentar o atual nível de renovabilidade diante do crescimento projetado da demanda.

“Chegamos até a ser criticados por sermos pouco ambiciosos, mas a manutenção desses níveis [de renovabilidade] é um desafio enorme diante do que a gente projeta e dos desafios futuros”, afirmou no Fórum de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Setor Elétrico, em Brasília.

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