Energia

Minerais críticos e hidrogênio do Brasil estão na lista de importações estratégicas da Itália

Política faz parte dos esforços do país para garantir matérias-primas essenciais para a segurança energética e industrial

Minerais críticos e hidrogênio do Brasil estão entre itens na lista de importações estratégicas da Itália. Na imagem: Michal Ron, diretora de Negócios Internacionais da Sace, a agência de fomento ao comércio exterior da Itália (Foto: Douglas Schinatto)
Michal Ron, diretora de Negócios Internacionais da Sace (Foto: Douglas Schinatto)

RIO – A agência de fomento ao comércio exterior do Ministério da Economia e Finanças da Itália (Sace) avalia apoiar a compra de minerais críticos e hidrogênio do Brasil, conta a diretora de Negócios Internacionais, Michal Ron.

Os bens integram a lista do programa de “garantia estratégica de importação” da agência, que cobre parte dos empréstimos a fornecedores estrangeiros de matérias-primas e produtos estratégicos para a segurança energética e industrial da Itália.

“Estamos analisando as importações do Brasil para a Itália (…) E isso é muito relevante para as empresas brasileiras, porque estamos olhando para matérias-primas críticas como terras raras, nióbio, lítio”, disse a executiva da Sace em entrevista à agência epbr.

“São matérias-primas que vêm do Brasil, do Chile, e outros países vizinhos, onde garantiremos esta importação para a Itália”.

A ideia do programa é garantir aos exportadores brasileiros desses materiais estratégicos contratos de compras futuros com clientes na Itália.

Em 2021, a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) obteve junto à Sace US$ 375 milhões para financiar embarques de minério de ferro da CSN Mineração, com o objetivo de promover negócios com empresas do país europeu.

De acordo com Ron, hoje, a prioridade é o GNL, devido à necessidade emergencial de substituir o gás da Rússia, segundo maior fornecedor do energético da Itália.

“Temos perto de 1 bilhão de euros em importações estratégicas. Em grande medida, não tudo, mas principalmente fontes de substituição para o gás russo. Portanto, temos muito GNL sendo importado com essa garantia”, destaca.

O Brasil não é um exportador de gás natural e também compra cargas de GNL para complementar o atendimento ao mercado doméstico. Contudo, no longo prazo, a executiva não descarta a possibilidade de uma parceria comercial no mercado de hidrogênio.

“Penso que o nosso país manifestou abertamente o seu interesse e a Sace está prontamente disponível para realizar este tipo de garantia”.

Estratégia italiana

A estratégia italiana para o hidrogênio prevê, até 2030, atingir uma participação de 2% do combustível de baixo carbono no consumo final de energia, incluindo aplicações em transporte de mercadorias de longa distância, indústria pesada, refinarias e mistura na rede de gás. Até 2050, a meta passa para 20%.

Para suprir essa demanda, está prevista a instalação de 5 GW de capacidade doméstica de eletrólise até o fim da década. O plano também considera que parte do hidrogênio verde poderia ser integrado com o importações, como de hidrogênio com baixo teor de carbono, a exemplo do hidrogênio azul.

O país também poderia funcionar como um hub de distribuição de hidrogênio para outros países da Europa, uma vez que já possui conexões de gasodutos com países do Norte da África – potenciais candidatos a grandes produtores de hidrogênio verde.

“Em termos de fornecimento de fontes de energia, poderia ser gás e outras formas do Brasil. Mas devo dizer que o hidrogênio está na nossa lista de importações estratégicas, por isso, não há absolutamente nada que nos impeça de fazer exatamente isso. E trabalharemos nessa frente também”, explica Michal Ron.

€ 1,1 bilhão para transição verde no Brasil

O país também vê no Brasil grandes oportunidades para vender tecnologia italiana. Recentemente, a Sace anunciou um investimento de € 1,1 bilhão em crédito para impulsionar a transição verde no Brasil, com a iniciativa Green Push.

O programa é um braço sustentável da Push Strategy, que já garantiu mais de € 7 bilhões em apoio a projetos envolvendo fornecedores italianos, parte deles no Brasil. A produtora de bioenergia Raízen, por exemplo, obteve um empréstimo verde de 300 milhões de euros com a garantia da Sace.

“Estamos convencidos de que o Brasil é um dos melhores candidatos para o Green Push. Vemos isso pelas pessoas com quem falamos, pelos bancos que atuam localmente no Brasil”, explica Ron.

Um dos motivos para o lançamento do programa aqui foi o posicionamento do governo Lula (PT) em relação aos investimentos monitorados no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Boa parte do portfólio de projetos está relacionado à transição ecológica e contempla tanto investimentos privados como de estatais – majoritariamente da Petrobras.

Entre os R$ 1,7 trilhão em projetos sob o PAC, R$ 41,5 bilhões são estimados para energia solar e R$ 22 bilhões para eólica. No setor de combustíveis, são R$ 26,1 bilhões para rotas de baixo carbono, além de R$ 8,9 bilhões para tecnologias de descarbonização do setor de óleo e gás.

Já as ferrovias e hidrovias, meios de transporte mais sustentáveis, ficaram com R$ 94,2 bilhões e R$ 4,1 bilhões, respectivamente.

Cobrimos por aqui:

“Estamos olhando para biocombustíveis. Estamos buscando baterias para carros híbridos e elétricos. E tudo isso somado ao agronegócio com novas metodologias sustentáveis”, conta a diretora da Sace.

De acordo com dados levantados pela agência, as exportações italianas para o Brasil, depois de atingirem um recorde de 5,1 bilhões de euros em 2022, devem alcançar um desempenho positivo em 2023 e em 2024, com as previsões de crescimento de 7,2% e 4,5%, respectivamente.

Transição do óleo e gás

Outro desafio da Itália é reduzir sua dependência dos combustíveis fósseis, que representam cerca de 80% do fornecimento total de energia primária, sendo gás natural e petróleo as principais fontes, 43% e 32% respectivamente.

“A Itália tem estado tradicionalmente muito exposta ao setor do petróleo e do gás. Então, para nós, é uma transição. É um processo gradual que estamos tentando acelerar, mas tudo isso anda de mãos dadas com novos produtos e com os planos de investimento específicos”.

A Sace decidiu manter seus investimentos em projetos de petróleo e gás no exterior até 2028. A política apoiará a exploração e produção de gás até 2026, a distribuição de petróleo até 2028 e o transporte de petróleo e refino até 2024.

No Brasil, a agência ainda considera o financiamento de navios offshore de processamento de petróleo e gás. Contudo, a executiva afirma que a Sace vem ajudando as companhias de óleo e gás a realizarem projetos que garantam a transição para atividades mais verdes.

“Estamos a reduzir de uma forma muito importante o nosso apoio aos projetos tradicionais de petróleo e gás, mas estamos também a incentivar o nosso apoio e, acima de tudo, os nossos exportadores a realizarem cada vez mais iniciativas ecológicas”.

Ela cita como exemplo, a possibilidade de apoio a projetos de transição da Petrobras, com participação de companhias italianas.

“Mesmo empresas como a Petrobras, por exemplo, seriam boas candidatas ao Green Push com o plano de transição”, comenta.

A Petrobras planeja investir US$ 11,5 bilhões em projetos de baixo carbono. O Plano estratégico da estatal para 2024-2028 prevê investimentos em eólica, solar, hidrogênio e captura, uso e armazenamento de carbono.

“Não é só no setor privado, por isso mencionei a Petrobras, mas também com o setor público. Achamos que vamos realmente avançar como parceiros dos principais players industriais do Brasil, porque o encaixe é muito bom. Não há elemento de competição. É muito complementar”, finaliza.