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Hidrogênio verde pode competir com óleo no Brasil (e sem subsídios), diz presidente da Fortescue

“A indústria de óleo e gás começou cerca de 200 anos atrás e consumiu bilhões de dólares de subsídios”, diz Andrew Forrest

Hidrogênio verde pode ter custo competitivo com petróleo no Brasil (e sem subsídios), diz Presidente global da Fortescue, Andrew Forrest, em conversa com jornalistas em Brasília (Foto: Divulgação)
Presidente global da Fortescue, Andrew Forrest, conversa com jornalistas em Brasília (Foto: Divulgação)

BRASÍLIA – Com uma das matrizes elétricas mais renováveis do planeta, o Brasil tem condições de produzir e fornecer hidrogênio a partir da eletrólise (verde) a um custo competitivo com petróleo e gás natural, avalia o presidente global da Fortescue, Andrew Forrest.

Em conversa com a imprensa em visita ao Brasil, defendeu ser justa a expectativa em torno de um energético com menor impacto ambiental que não onere o consumidor.

O executivo da companhia australiana esteve em Brasília (DF), nesta quinta (9/11), para um encontro com o presidente Lula (PT) e o ministro da Casa Civil, Rui Costa.

“Espera-se que nós possamos competir imediatamente com o óleo e o gás, o que é justo, porque o custo de vida é muito importante. Mas também vamos lembrar a história. A indústria de óleo e gás começou cerca de 200 anos atrás e consumiu bilhões de dólares de subsídios. Hoje, o barril de petróleo custa menos de US$ 100, mas começou a US$ 1.600”.

Forrest observa, no entanto, que o caso do hidrogênio é diferente. Como a eletricidade representa a maior parte dos custos de produção do H2, a oferta de solar e eólica a preços baixos dá ao Brasil condições de competir com a indústria fóssil desde o começo.

“Se você combina um sol barato, um vento barato, com amônia verde e hidrogênio verde, o conjunto é significativamente mais barato do que queimar óleo e gás. Então, estou empolgado com a possibilidade de competir com o setor de combustíveis fósseis direto”, disse à agência epbr.

Além disso, o executivo acredita que o mercado será a principal influência sobre o preço e o tipo de hidrogênio que será consumido.

“Há as economias que demandam o hidrogênio verde. Coreia do Sul, Alemanha, Japão, a maior parte da Europa, América do Norte. Há demanda, só precisa de alguém para fazer”.

Subsidiária da mineradora australiana Fortescue Metals Group, a Fortescue Future Industries (FFI) está construindo um portfólio global de projetos de hidrogênio e amônia verde para produzir 15 milhões de toneladas por ano até 2030, aumentando para 50 milhões de toneladas por ano na década seguinte.

No Brasil, o primeiro projeto está em fase de pré-contrato no Porto do Pecém, no Ceará. Com investimentos de US$ 5 bilhões, o empreendimento terá capacidade de produzir 837 toneladas de hidrogênio verde por dia a partir do consumo de 2.100 MW de energia renovável.

Na semana passada, o grupo recebeu a aprovação do seu Estudo de Impacto Ambiental (EIA), o que permite o avanço do projeto para as próximas fases.

“Não precisamos de subsídios”

Questionado, durante a coletiva de imprensa, sobre a necessidade de subsídios, Forrest disse que o governo pode ajudar de outras maneiras, como apoio à infraestrutura, entendendo que a indústria do hidrogênio pode ser um multiplicador na economia.

“Não precisamos de subsídios [diretos], mas é preciso infraestrutura disponível para que essa indústria avance”, comentou.

Segundo o chairman da Fortescue, o projeto de hidrogênio verde da companhia no Ceará mobilizará um grande investimento nos primeiros anos do projeto e representará um aumento da arrecadação tributária, ajudando o Brasil em sua busca por um superávit fiscal.*

“Porém, o desenvolvimento da indústria do hidrogênio verde requer uma regulamentação que preveja um marco regulatório e condições financeiras que favoreçam o investimento, assim como foi feito com as demais energias renováveis, como a eólica e a solar, para que o hidrogênio verde possa ser competitivo”.

Ele cita também o exemplo da Lei de Redução da Inflação (IRA, em inglês) aprovada nos EUA, no ano passado, pelo governo de Joe Biden.

“Nos Estados Unidos, o IRA é considerado um pacote de subsídios. Eu fui parte do grupo que argumentou com o presidente Joe Biden que, se isso começasse a se pagar a cada 3 a 5 anos, não é mais um subsídio, é um investimento”.

No caso do Brasil, o executivo classificou a inclusão do hidrogênio verde na reforma tributária com um sinal positivo.

“Eu me sinto confiante que o governo consiga aprovar uma regulação para essa indústria. Eles são incentivados a fazer isso porque a indústria verde é considerada a maior indústria futurista do mundo”.

Na imagem: O presidente da Fortescue, Andrew Forrest, foi recebido pelo presidente Lula e pelo governador do Ceará, Elmano de Freitas, no Planalto, em 9/11/23 (Foto: Ricardo Stuckert/PR)
Andrew Forrest foi recebido pelo presidente Lula e pelo governador do Ceará, Elmano de Freitas, no Planalto (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

Descarbonização da indústria brasileira

Insumo para descarbonizar diferentes cadeias produtivas – agricultura (fertilizantes), mineração, produção de aço e fabricação de cimento – o hidrogênio verde é apontado como estratégico nos planos do governo brasileiro para a neoindustrialização.

Mas a abundância de recursos renováveis do país está atraindo, principalmente, investidores estrangeiros interessados na exportação de energia na forma de combustíveis, como amônia e metanol.

A estratégia da Fortescue é combinar as duas possibilidades. Os planos incluem a transformação em amônia para exportação, mas segundo Forrest, a prioridade será abastecer a indústria local.

“Vamos olhar para a indústria brasileira primeiro. Em seguida, a exportação. O Brasil queima centenas de bilhões de dólares por ano importando fertilizantes da Rússia. Nós podemos converter eletricidade excedente em hidrogênio e amônia e em fertilizantes”, afirma o executivo.

Transformação na indústria pesada

Para Forrest, a indústria pesada precisa assumir sua responsabilidade na emissão de gases de efeito estufa e impacto sobre o clima, e agir mais rápido para mudar a forma de produção baseada em combustíveis fósseis para alternativas mais amigáveis ao planeta.

“[A crise climática] não é culpa do público. Não é culpa das pessoas nas ruas. Isso é culpa da indústria pesada. Nós devemos entregar aço, ferro e energia sem fazer mal para o nosso planeta”.

Ele conta que, na Austrália, está trabalhando com a brasileira Vale para pressionar outras grandes mineradoras a abandonar os combustíveis fósseis.

As operações da Fortescue Metals na Austrália utilizam uma grande frota de veículos leves e pesados, e alguns dos maiores trens e navios do mundo para transportar minério e está fazendo a transição dessa malha para combustíveis renováveis, hidrogênio e eletrificação.

O objetivo é substituir toda a demanda por fósseis em cinco anos.

“Não é em 2050. É em cinco anos. Se nós podemos parar com os combustíveis fósseis, eles também podem”, defende Forrest.

*Atualizado em 13/11/2023 para incluir comentários do presidente da Fortescue sobre o projeto no Ceará e a necessidade de um marco regulatório para o hidrogênio