Hidrogênio em foco

Hidrogênio arco-íris: diversificar para ganhar escala

Quando se pensa em desenvolver uma economia global do hidrogênio, a combinação de diferentes rotas pode ajudar no ganho de escala

Planta piloto de hidrogênio verde da Petrobras será instalada na usina solar Alto Rodrigues, no Rio Grande do Norte (Foto Luiz Fernando Fontenele/Agência Petrobras)
Planta piloto de hidrogênio verde da Petrobras será instalada na usina solar Alto Rodrigues, no Rio Grande do Norte (Foto Luiz Fernando Fontenele/Agência Petrobras)

A adoção de múltiplas rotas de produção de hidrogênio de baixo carbono e sua mistura pode aumentar a viabilidade econômica e operacional, e destravar a nova economia do hidrogênio. 

A estratégia de formar um blend é defendida pela Associação Brasileira do Hidrogênio (ABH2), que vê na mistura de hidrogênios de diferentes cores — ou seja, de diferentes rotas tecnológicas e pegadas de carbono — a possibilidade de ganhos relevantes de escala, flexibilidade de oferta e competitividade de custos.

Principalmente quando se pensa em desenvolver uma economia global do energético. 

Desta forma, apostar em múltiplas rotas — como verde (eletrólise com renováveis), azul (reforma de gás natural com captura de carbono, CCS), turquesa (pirólise de metano), rosa (eletrólise com nuclear), entre outras — reduziria riscos associados à dependência de uma única tecnologia ou insumo. 

“Permitir não apenas todas as rotas que entreguem baixa emissão, como a mistura dessas rotas, possibilita aumentar a escala, ter sinergia de infraestrutura e uma diversidade de produção no território nacional mais ampla”, disse Giovani Machado, presidente do Conselho Consultivo da ABH2, em entrevista à agência eixos. 

Machado esteve à frente das discussões sobre a política brasileira para o hidrogênio na Empresa de Pesquisa Energética (EPE), que optou pelo caminho da neutralidade tecnológica, seguindo caminhos adotados pelo Reino Unidos e pelos Estados Unidos. 

Ao contrário da União Europeia que decidiu pelo trancamento tecnológico em volta do hidrogênio verde, e que agora está sendo pressionada a flexibilizar suas regras, diante da estagnação de projetos capazes de atender aos anseios da descarbonização. 

Vocações regionais 

Cada região do planeta, cada país e estado poderia adotar uma rota em que tivesse vantagens comparativas específicas. 

O Brasil, por exemplo, tem enorme potencial de produção de hidrogênio a partir do etanol, biomassa e renováveis, aproveitando sua enorme produção agropecuária e excedente de geração de energia solar e eólica. 

Já regiões com gás barato e potencial de investimento em infraestrutura de CCS, como os EUA, teriam mais aptidão para o hidrogênio azul.

Mas, juntos, seriam capazes de dar escala a um mercado global e dar segurança aos possíveis consumidores.

Guardados os devidos desafios logísticos, seria possível obter um custo marginal menor ao compor um mix. 

Hoje, o hidrogênio verde tende a ser mais caro em locais onde a eletricidade renovável é limitada ou cara, mas tende a ser mais competitivo no Brasil. 

Já o hidrogênio azul pode ser mais competitivo em curto/médio prazo, embora tenha pegada de carbono superior ao verde.

A Alemanha, talvez o país que mais se restringiu ao hidrogênio verde, aprovou a importação de hidrogênio azul num primeiro momento, justamente para estimular o mercado.

Infraestrutura compartilhada e sinais aos consumidores

Outra vantagem é que ao combinar diferentes rotas e aumentar a escala é possível viabilizar investimentos em infraestrutura compartilhada, como dutos, hubs de exportação, armazenamento, e até a demanda industrial — que requer grandes volumes para ser economicamente mais viável. 

A oferta diversificada e competitiva pode ajudar a criar os sinais de mercado necessários para destravar demanda inicial em setores como siderurgia, fertilizantes, transporte pesado e química.

Certificação e padronização

Para Machado, é possível a adoção do blend sem que isso comprometa metas de descarbonização, desde que haja regras claras de rastreamento e certificação.

“O blend é uma média ponderada. Você certifica cada rota isoladamente. Simples assim. Você tem a certificação original de cada rota e depois você faz um blend”, explica.

Para que esse blend seja aceito em mercados exigentes, como a UE, será necessário um sistema robusto de certificação e rastreabilidade do carbono de cada lote de hidrogênio.

Isso exigiria uma padronização internacional para metodologia de contabilidade das emissões de carbono no ciclo produtivo de cada rota, o que implica grandes desafios, a exemplo do intenso debate que o Brasil já trava sobre as emissões dos seus biocombustíveis. 

Entretanto, a harmonização global de padrões e processos de certificação abriria espaço para instrumentos como contratos de compra com base na intensidade de carbono, e não apenas na cor, bem como fontes de financiamento para projetos de produção hidrogênio de múltiplas rotas.

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