Diálogos da Transição

Captura de carbono para hidrogênio eleva consumo de água

Irena recomenda priorizar projetos de hidrogênio verde, especialmente em áreas onde água já é escassa

Captura e uso de carbono (CCUS) na produção de hidrogênio eleva consumo de água, mostra estudo da Irena. Na imagem: Tecnologia para produção de hidrogênio via eletrólise, em alto mar, com turbinas eólicas ao fundo (Foto: Divulgação IEA)
Tecnologia para produção offshore de hidrogênio via eletrólise com energia eólica (Foto: Divulgação IEA)

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Editada por Nayara Machado
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A integração da tecnologia de captura, armazenamento e utilização de carbono (CCUS, em inglês) a projetos de hidrogênio a partir de combustíveis fósseis aumenta o consumo de água e é menos eficiente energeticamente do que a eletrólise com renováveis (hidrogênio verde), mostra um estudo da Agência Internacional de Energia Renovável (Irena), publicado este mês.

A agência recomenda que governos e investidores priorizem projetos de hidrogênio verde, inclusive quando forem aposentar as usinas a combustíveis fósseis em áreas onde a água já é escassa.

Como parte da estratégia de descarbonização visando de limitar o aquecimento do planeta a 1,5°C até o fim do século, governos de diversos países estão apoiando a meta de dobrar a produção de hidrogênio até 2030 – tema que ganhou bastante relevância na COP28, prevista para encerrar hoje (12/12) em Dubai.

Pelas estimativas da Irena, a produção global de hidrogênio atingiu cerca de 86 milhões de toneladas em 2021, dos quais 68 Mt eram cinza (a partir do gás natural) e 18 Mt eram marrom (carvão).

Nos cenários da agência em que as economias globais se alinham ao objetivo de 1,5°C, seria necessário produzir globalmente 247 Mt de hidrogênio a cada ano, até 2040, sendo 166 Mt verde 81 Mt azul (gás natural com CCUS). Em 2050, a produção global anual de hidrogênio atingiria 523 Mt, com a rota da eletrólise representando quase 94%.

Para atender essa demanda, as retiradas de água doce podem mais do que triplicar até 2040 e aumentar seis vezes até 2050, em relação aos atuais 2,2 bilhões de metros cúbicos (m³) retirados anualmente.

  • Para dar uma dimensão: a produção atual de H2 responde por 0,6% do total de retirada de água do setor de energia; até 2040, pode chegar a 2,4%.

Intensivas em água

Todas as rotas de produção de hidrogênio precisam de água. Ela é utilizada não apenas durante a produção (eletrólise, reforma de combustíveis fósseis, gaseificação), mas também para resfriamento.

No caso do H2 azul, a demanda de água de resfriamento é significativamente maior do que no cinza, porque os sistemas CCUS requerem resfriamento durante a captura e compressão de carbono.

Como o interesse por essa indústria está crescendo vertiginosamente, o impacto no consumo de água é um ponto que precisa entrar no radar dos agentes envolvidos com a tecnologia, alerta a agência.

A gaseificação do carvão é, de longe, a tecnologia mais intensiva em água disponível, e ela fica cerca de 60% mais intensiva se equipada com CCUS.

Pelos cálculos da agência, a gaseificação do carvão precisa retirar cerca de 50 litros de água por kg e consome 31 l/kg, em média – aproximadamente o dobro do volume usado nos eletrolisadores com membrana de troca de prótons (PEM).

Equipada com CCUS, os requisitos de retirada e consumo da gaseificação do carvão poderiam aumentar ainda mais para 80,2 e 49,4 l/kg, respectivamente.

“Uma planta de hidrogênio por gaseificação de carvão que produza 237 quilotoneladas (kt) de hidrogênio por ano e seja equipada com CCUS retiraria cerca de 19 milhões de m³ de água anualmente; esse volume de água poderia atender à metade da demanda da cidade de Londres por um ano inteiro”, diz o relatório (.pdf).

Já a eletrólise – que poderíamos imaginar ter um alto consumo porque a tecnologia consiste em separar o H2 da água – tem a segunda menor intensidade de retirada, cerca de 25,7 l/kg produzido, e utiliza 17,5 l/kg quando o eletrolisador é do tipo PEM.

Gráfico da Irena compara a intensidade média de retirada e consumo de água. Os volumes de retirada e consumo são diferentes porque a água precisa passar por tratamentos, o que também impacta na demanda pelo recurso
Gráfico da Irena compara a intensidade média de retirada e consumo de água. Os volumes de retirada e consumo são diferentes porque a água precisa passar por tratamentos, o que também impacta na demanda pelo recurso (clique na imagem para ampliar)

Atenção ao estresse hídrico

Mais de 35% da capacidade global de produção de hidrogênio verde e azul em operação e planejada está localizada em regiões altamente afetadas pela disputa por recursos hídricos, aponta a Irena.

Destaque para a Índia, que provavelmente terá 99% de sua capacidade de hidrogênio nessas áreas até 2040, enquanto China e a União Europeia também enfrentam desafios nesse aspecto.

“Embora a água consumida na produção de hidrogênio não tenha um impacto significativo globalmente, a importância de considerar os contextos locais da água ao planejar o desenvolvimento do hidrogênio não pode ser subestimada, especialmente os riscos crônicos, como o estresse hídrico”, recomenda a agência.

Cobrimos por aqui:

Curtas

Até 03:00 am

A presidência da COP28 comunicou nesta terça (12/12) que as discussões para chegar ao texto final da cúpula climática se estenderão até 03:00 am de quarta, em Dubai (aqui no Brasil ainda será 20h de terça).

Até o fechamento desta edição, os únicos acordos alcançados na conferência climática das Nações Unidas são sobre os fundos para perdas e danos e para adaptação, além do texto sobre gênero e clima.

Questões espinhosas como eliminar combustíveis fósseisfinanciamento de longo prazo e regulamentação do Artigo 6 do Acordo de Paris, que trata do comércio de emissões, seguem sem acordo.

Crédito de carbono na B3

A bolsa brasileira anunciou na última sexta (8/12) a criação de uma plataforma para negociação de créditos de carbono em parceria com a ACX Group. O acordo prevê desembolsos por parte da B3 de até R$10 milhões.

Com lançamento planejado para o primeiro trimestre de 2024, a plataforma funcionará como um ambiente de negociação entre os emissores dos títulos e empresas que compensam emissões de gases de efeito estufa por meio da aquisição dos ativos no mercado voluntário.

Brasil taxa módulos solares e turbinas eólicas importadas

A justificativa é que já existe produção similar no Brasil, tanto para os módulos montados quanto para os aerogeradores. Módulos fotovoltaicos montados e turbinas eólicas de até 7,5 MW passarão a pagar tarifa de importação de 10,8% a partir de janeiro de 2024, decidiu nesta terça-feira (12/12) o Gecex-Camex, ligado ao MDIC.

Subsídios para SAF de etanol de milho

O Tesouro dos Estados Unidos deve divulgar, até o final desta semana, orientações sobre a qualificação do etanol de milho para receber subsídios destinados à produção de combustível sustentável de aviação (SAF, em inglês). A pressão para facilitar a qualificação desta rota de SAF vem do Cinturão Agrícola dos EUA, uma importante base política antes das eleições presidenciais do próximo ano, informa a Reuters.