RIO — Estudo do Agora Industry e do Instituto E+ divulgado nesta quinta (6/11) calcula que o Brasil tem potencial para produzir dez milhões de toneladas de ferro verde até 2040, evitando 12,8 milhões de toneladas de emissões de CO2 e criando cerca de 35 mil empregos.
Essa produção é equivalente a três vezes as atuais exportações de ferro-gusa e poderia mais que dobrar a receita dos embarques em comparação com o minério de ferro bruto, até 2050, saltando de US$ 2,9 bilhões para US$ 6,6 bilhões.
“O comércio de ferro verde permitiria ao Brasil agregar valor às exportações de minério, subir na cadeia produtiva e avançar as metas climáticas globais, ao mesmo tempo em que promove o desenvolvimento socioeconômico nacional”, afirma Rosana Santos, diretora-executiva do Instituto E+.
O ferro verde pode ser produzido tanto por meio da utilização de fornos elétricos com energia renovável, como pela redução direta do minério de ferro (DRI) com hidrogênio verde, substituindo o carvão e o gás natural usados nas rotas tradicionais.
O produto resultante do processo, o HBI (hot-briquetted iron), pode ser exportado como um insumo intermediário de alto valor, sendo capaz de eliminar até 100% das emissões de carbono do processo siderúrgico, dependendo da fonte de energia utilizada.
“O aço sustenta a economia global, mas o setor ainda é um dos maiores poluidores industriais. Com as políticas certas, pode se tornar um símbolo da transformação verde”, aponta Julia Metz, diretora do Agora Industry.
Descarbonização da cadeia global de aço
No Brasil, uma iniciativa neste sentido é o projeto da Vale com a Green Energy Park (GEP), que prevê a instalação de uma planta de hidrogênio verde no Brasil para abastecer um mega hub de produção de HBI.
O empreendimento é listado como um projeto prioritário no programa Global Gateway da União Europeia.
O Global Gateway, que mobiliza até 300 bilhões de euros entre 2021 e 2027, tem como objetivo fortalecer cadeias produtivas globais em energia, transporte e digitalização.
No caso do aço, a estratégia da UE busca proteger a indústria local da realocação produtiva, importando ferro verde de baixo carbono em vez de transferir suas plantas siderúrgicas para o exterior.
Segundo o estudo, para Alemanha, Japão e Coreia do Sul, importar “HBI verde” do Brasil pode reduzir de 12% a 15% os custos de produção de aço até 2040.
Isso permitiria manter empregos e parques industriais estratégicos nesses países, ao mesmo tempo em que cumprem metas climáticas.
“A produção em larga escala poderia servir de referência para o desenvolvimento de polos industriais verdes em toda a América Latina, com efeitos positivos em logística, energia e emprego”, ressalta a diretora do E+.
Vantagens competitivas do Brasil
O relatório aponta que o Brasil reúne condições naturais e industriais únicas para liderar o mercado global de ferro verde. É potência mundial em energia renovável, com matriz elétrica composta por mais de 90% de fontes limpas — especialmente solar, eólica e hidrelétrica.
Além disso, destaca que o país o segundo maior exportador de minério de ferro do mundo, com 378 milhões de toneladas exportadas em 2023.
O documento cita que as reservas de alto teor de ferro em Carajás e Minas Gerais, somadas à infraestrutura logística e à experiência industrial do setor siderúrgico brasileiro, reforçam o potencial do país para produzir DRI e HBI em larga escala e a custos competitivos.
“Investir na cadeia de valor do ferro verde no Brasil poderia gerar um período de retorno do investimento de 8 anos com uma taxa interna de retorno de 15%”, diz o estudo.
Políticas e estratégias necessárias
O relatório enfatiza que coordenação política e financeira será essencial para destravar o potencial do ferro verde brasileiro.
O alto custo de capital continua sendo uma das principais barreiras, o que exige mecanismos de financiamento concessionário, garantias de risco e contratos de diferença de longo prazo, inclusive de carbono.
“Governos podem impulsionar essa mudança construindo parcerias de comércio de ferro verde entre polos siderúrgicos tradicionais e países do Sul Global ricos em renováveis e minério de ferro”, sugere a diretora do Agora Industry.
O estudo também recomenda a criação de uma estratégia nacional de hidrogênio e ferro verde — apoiada por regulação estável, licenciamento ágil, financiamento de baixo custo e um sistema de certificação compatível com padrões internacionais.
Isso também permitiria ao Brasil acessar mercados sob regras como o Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM) da União Europeia.
A cooperação internacional também é apontada como essencial para viabilizar o comércio global de ferro verde. Parcerias como a Energética Brasil-Alemanha e as Clean Transition Investment Partnerships (CTIPs) da União Europeia podem incorporar o ferro verde às cadeias industriais limpas, garantindo padrões e certificações alinhados.
