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Diálogos da Transição
eixos.com.br | 26/10/21
Apresentada por
Editada por Nayara Machado
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A uma semana da COP26, o governo brasileiro lançou o Programa Nacional de Crescimento Verde para oferecer financiamentos e subsídios a projetos e atividades econômicas sustentáveis.
Sem explicar como, o governo diz que a iniciativa vai priorizar a concessão de licenças ambientais e gerar os chamados “empregos verdes”, com objetivo de neutralizar a emissão de carbono pelo país até 2050.
Na prática, a única medida efetiva do programa foi a renomeação do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima, que agora passa a se chamar Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima e Crescimento Verde (CIMV) e terá como atribuição facilitar “o planejamento, a execução e o monitoramento de resultados”.
Além de ser responsável pela “criação e consolidação de critérios verdes, levando em consideração as características de cada região do Brasil em todos os seus biomas”. Veja o decreto na íntegra
A CIMV terá até 30 de setembro de 2022 para publicar resolução com procedimentos, indicadores, metas e ações necessárias para implementação do programa.
É uma iniciativa do Meio Ambiente com a Economia. Segundo o ministro Paulo Guedes, o programa seguirá o modelo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que coordena investimentos na economia convencional. O novo comitê fará integração de ministérios e bancos públicos para investimentos na economia verde.
“Estamos levando [para a COP26] um programa que mostra tudo que fazemos, e vamos ter essa plataforma para monitoramento disso da mesma forma que fazemos com o PPI”, resumiu.
Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima, avalia o anúncio como um “grande vazio”.
“O que ficou claro é que o governo não tem nada para oferecer, nem nada para dizer na Conferência do Clima. Não falou de desmatamento, emissões, crime ambiental, o problema de queimadas no Brasil, sobre invasões de áreas públicas, grilagens, nada. Foi um grande vazio onde o governo, basicamente, só assinou um decreto renomeando um grupo de trabalho”, comenta.
- Cobrimos por aqui: políticas da gestão Bolsonaro vão na contramão da economia de baixo carbono
Além do comitê, o governo falou ainda em R$ 400 bilhões para projetos sustentáveis.
De acordo com comunicado oficial, esses recursos podem ser nacionais e internacionais, públicos ou privados, reembolsáveis e não reembolsáveis, fundos de impacto e investimentos de risco.
Também não houve detalhamento sobre a origem desse valor, mas durante coletiva nesta segunda (25) foram citados programas de financiamento já existentes no BNDES, Banco do Brasil e Caixa, por exemplo.
“O lançamento é para deixar claro como o Brasil tem R$ 400 bilhões na direção verde, investimentos e financiamentos bastante robustos se compararmos com os outros países do mundo. Temos número bastante relevante de recursos”, disse o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite.
Mas a única coisa que ficou clara é a ausência de novidade.
“Foi uma juntada de dezenas de programas, projetos, qualquer coisa no orçamento do governo que passasse perto de meio ambiente para poder fazer essa conta”, avalia Márcio Astrini.
“Não tem nada de novo. O próprio ministro não conseguiu explicar o que compunha esses R$ 400 bilhões. Se é que toda essa conta tem a ver com meio ambiente — o que a gente não sabe, porque o próprio governo que deveria ter apresentado isso não apresentou”, diz à epbr.
Questionados, os ministérios da Economia e Meio Ambiente não responderam, até o fechamento desta edição, como chegaram à cifra de R$ 400 bilhões.
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Enquanto isso, no Senado, foi aprovado em tempo recorde, na última quarta (20), um projeto de lei que condiciona a NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) brasileira a uma projeção de emissões que será definida em decreto de Jair Bolsonaro (sem partido).
O texto aprovado some com um projeto anterior, mais avançado, que havia sido apresentado em abril.
A aprovação do PL 1.539/2021, de autoria da senadora Kátia Abreu (PP/TO), altera um dos artigos da lei da Política Nacional sobre Mudança do Clima, a PNMC (Lei 12.187/2009) e foi alvo de críticas ao longo da semana.
A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, movimento multissetorial composto mais de 300 empresas, avalia que o texto abre margem para que o país possa aumentar suas emissões no futuro, uma vez que propõe que a redução seja a partir de uma base incerta e passível de interpretações diversas, descrita como “redução das emissões projetadas até 2025”.
“A Coalizão julga que o novo texto deve manter, como base para os cálculos, uma linha de base existente e não projetada, tal como acontece na NDC do Brasil. É importante que o Congresso Nacional se engaje na redação de um compromisso climático mais ambicioso”, diz o grupo em nota.
Para o Observatório do Clima, o texto votado tem ao menos quatro problemas sérios:
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fala em reduzir as “emissões projetadas” do país, mas desde 2015 o Brasil não calcula metas em relação a “emissões projetadas”;
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tanto a projeção das emissões quanto o detalhamento das ações para alcançar a meta ficarão a cargo de um decreto presidencial a ser editado;
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a antecipação do desmatamento ilegal zero para 2025, que Kátia Abreu alegou ser sua grande preocupação quando propôs o projeto, saiu do texto;
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o país passa a ter duas NDCs, e, ao mesmo tempo, nenhuma. “Ficaremos com a meta atual, internacional, depositada junto à Convenção do Clima da ONU, (37% em 2025 e 43% em 2030), e a nova, nacional (43% em 2025 e 50% em 2030), ainda sem regulamentação e sequer sem uma base de cálculo, à espera da canetada de Bolsonaro”, diz o OC.
O PL de Kátia Abreu agora será analisado pela Câmara. A preocupação é que, se for aprovado a toque de caixa na Casa, a gestão Bolsonaro terá mais uma ferramenta para reduzir a ambição climática do Brasil.
Outro projeto que atualiza a PNMC está na pauta do Senado nesta terça (26). O PL 6539/2019 introduz a meta de neutralização de 100% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa até 2050. Ele chegou a ser agendado para votação no Plenário em abril, mas foi retirado de pauta a pedido da liderança do governo.
Mais sobre a COP
Entrega do financiamento do clima. O fundo climático prometido pelos países ricos no Acordo de Paris, de 2015, precisa destinar recursos para a recuperação de países e comunidades vulneráveis, levando em conta os impactos da pandemia de covid-19, na aprovação de subsídios.
A Presidência da COP26 do Reino Unido publicou ontem (25) o Plano de Entrega de Financiamento do Clima para esclarecer quando e como os países ricos cumprirão a meta de disponibilizar US$ 100 bilhões anuais para financiamento climático a países emergentes.
“De acordo com o Acordo de Paris, os países desenvolvidos reconhecem, em particular no contexto da pandemia da COVID-19, a necessidade de recursos públicos e baseados em subsídios, particularmente para os beneficiários com menor capacidade de mobilização de recursos nacionais e outros recursos”, diz o documento.
Há um reconhecimento, também, que a medida está atrasada e que precisa aceitar riscos mais elevados na aprovação de projetos para o dinheiro chegar às pessoas mais vulneráveis. A estratégia foi dividida em 10 pontos.
Nuclear em posição incômoda na COP26. Uma briga incomum estourou em agosto sobre qual papel a energia nuclear deveria desempenhar na cúpula do clima das Nações Unidas na próxima semana.
Organizadores convidaram a Agência Internacional de Energia Atômica e outros defensores do setor para se estabelecerem na Zona Azul, mais tranquila do encontro, ao invés da Zona Verde, onde as empresas têm maior visibilidade.
“Todas as solicitações de energia nuclear para a Zona Verde na próxima conferência COP26 foram rejeitadas”, reclamou a associação em uma carta ao presidente da COP, Alok Sharma. “Estamos profundamente preocupados.”
A confusão em torno das cores ressalta a posição incômoda que a energia nuclear ocupa nas discussões sobre a melhor maneira de descarbonizar a economia global.
Nações antinucleares, da Áustria à Nova Zelândia, se opuseram às tentativas de rotular a tecnologia atômica com as mesmas credenciais da energia eólica ou solar. A indústria também está excluída da ajuda financeira multilateral para energia limpa em locais como o Banco Mundial. Bloomberg
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