Eleições 2022

Gas release e a agenda do gás para o novo governo

Abrace contrata consultoria para contribuir com estudos sobre desconcentração, em avaliação pela ANP

Gas release e a agenda do gás para o novo governo. Na imagem, movimentação de jornalistas no Centro de Divulgação das Eleições, localizado no Tribunal Superior Eleitoral (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Movimentação de jornalistas no Centro de Divulgação das Eleições, localizado no Tribunal Superior Eleitoral (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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Editada por André Ramalho
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PIPELINE Gas release, investimentos em infraestrutura e harmonização das regulações estaduais na agenda do setor de gás natural para o próximo governo. Abrace contrata consultoria para contribuir com estudos sobre desconcentração, em avaliação pela ANP.

Distribuidoras do Nordeste preparam chamada conjunta para compra de gás. Raízen aposta na conversão de frota agrícola para biometano. E mais. Confira:

A agenda do gás natural

Gas release, investimentos em infraestrutura e harmonização das regulações estaduais são algumas das principais bandeiras da agenda do setor de gás natural para o próximo governo, a ser eleito no próximo domingo (30/10).

Em julho de 2019, quando o governo lançou o Novo Mercado de Gás, as indústrias pagavam cerca de R$ 2,2 por m³ de gás natural, na média.

Três anos depois, em meio ao choque de preços internacionais em razão da Guerra da Ucrânia, as indústrias pagam, hoje, 80% mais: cerca de R$ 4 o m³ em junho de 2022, segundo dados mais atualizados do Ministério de Minas e Energia (MME).

Jair Bolsonaro (PL) encerra assim o seu primeiro mandato sem entregar o choque de energia barata prometido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, em 2019.

É o que o diretor de gás da Abrace, Adrianno Lorenzon, chamou de “choque de energia menos cara”. A entrada de novos players no mercado foi essencial, este ano, para mitigar os efeitos da alta dos preços da Petrobras, o agente dominante.

“Ainda não chegamos ao objetivo almejado no Novo Mercado de Gás, mas alguns passos já foram dados”, disse ao participar do antessala, live semanal da agência epbr. Assista na íntegra: 

Mas o que ainda falta para que a abertura do mercado brasileiro se consolide e aumente a competitividade do gás no país?

Ao menos dois elos da cadeia – as distribuidoras e consumidores, ou seja, os principais compradores de gás do mercado – defendem que a desconcentração da oferta de gás natural, nas mãos da Petrobras, precisa entrar na ordem do dia do próximo governo.

Abrace (grandes consumidores) e Abegás (distribuidoras) pregam, nesse sentido, a necessidade de um programa de gas release.

Abrace contrata consultoria para gas release

A associação contratou uma consultoria para contribuir com estudos sobre as práticas internacionais de um programa do tipo. O trabalho deve ser entregue no início de novembro.

Segundo Lorenzon, a Abrace vem se articulando com ao menos outras dez entidades do setor, na defesa do gas release. “Está tudo na Lei do Gás, ela só tem que sair do papel e ser implementada”.

Além do programa de desconcentração da oferta, a Abrace também defende que a agenda do gás no próximo governo passa pela necessidade de uma harmonização nas regulações estaduais.

Natália Seyko, analista de energia da associação, destaca que existem hoje muitas discrepâncias entre os diferentes marcos regulatórios dos estados. E que alguns deles colocam barreiras à migração de consumidores do ambiente cativo para o livre.

Ela cita, por exemplo, a assimetria nas regras de penalidades impostas aos clientes livres em relação aos usuários cativos; a cobrança de taxas de fiscalização; e a questão da verticalização, ante a falta da separação da figura da distribuição e comercialização, em alguns estados.

O gas release

A nova Lei do Gás estabelece que a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) tem competência para adotar mecanismos de redução da concentração na oferta de gás.

A resolução 3/2022 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) reforçou, este ano, o gas release como uma das diretrizes da transição para um mercado concorrencial.

E recomendou que a ANP, em articulação com o MME, o Ministério da Economia e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), elaborasse, num prazo de 180 dias (encerrado este mês), um diagnóstico sobre as condições concorrenciais do mercado e apresentasse uma proposta de programa de gas release.

As autoridades têm mantido, desde o início do mês, alguns encontros para tratar do assunto.

Para Abegás, falta infraestrutura

O diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, Marcelo Mendonça, reforça a defesa do gas release, mas destaca que, além de um programa para desconcentração do mercado, a agenda do setor precisa passar, necessariamente, pelo estímulo ao aumento dos investimentos em infraestrutura – sobretudo de escoamento do gás.

Segundo ele, a abertura do mercado acumula cases de sucesso, sobretudo entre as distribuidoras do Nordeste, mas ainda “é muito pouco”.

“O principal gargalo [para a abertura] não é a questão da regulação estadual. A questão é que não tem molécula a ser contratada… O choque de preços vem do choque de oferta, mas com infraestrutura. Só vamos ter redução dos preços com infraestrutura depreciada que tenha escala para reduzir o custo unitário [do sistema]… Primeiro ponto é investimento, trazer nova infra para aumentar a oferta”, comentou, no antessala desta quinta (27/10).

Mendonça acredita que a construção da infraestrutura reduziria a reinjeção de gás e aumentaria a oferta ao mercado – o que seria essencial para reduzir a exposição do mercado brasileiro aos preços internacionais do GNL, hoje altamente pressionados.

O diretor da Abegás explica que o aumento dos preços do gás da Petrobras, este ano, reflete uma mudança na base da indexação – que passou a incorporar mais os efeitos da exposição da estatal ao GNL, pressionado desde 2021, antes mesmo da Guerra da Ucrânia.

Em meio à corrida presidencial, a Abegás encaminhou aos presidenciáveis um pacote com 11 propostas para desenvolvimento do mercado.

Dentre as sugestões está o gas release; incentivar a construção de novos gasodutos de transporte; fixar limites para a reinjeção de gás; regulamentar o acesso obrigatório às infraestruturas essenciais; acelerar a agenda regulatória da ANP.

E políticas públicas para incentivo do uso do gás natural (e biometano) em veículos pesados.

“A substituição do diesel em veículos pesados é agenda positiva para a redução das emissões e da dependência do diesel importado. Estamos falando em 30 milhões de m3/dia [em demanda potencial]. Só isso representaria o consumo do segmento industrial. Existe mercado de substituição, sim, para ser trabalhado, mas precisamos de políticas públicas para acelerar isso”, disse.

O status da diversificação hoje

A abertura deu passos importantes em 2022, com a entrada de novos fornecedores. O mercado brasileiro tem, hoje, ao menos doze novos supridores com contratos assinados com as distribuidoras e clientes industriais livres no país.

Essa abertura, contudo, não se deu via aumento da oferta, e sim por meio do gás de terceiros que antes era vendido pelos produtores à Petrobras — e que, agora, passou a ser comercializado diretamente pelas petroleiras no mercado.

Falta, contudo, perspectivas de entrada de gás novo, em volumes abundantes, no mercado, nos próximos anos. A entrada em operação do gasoduto offshore Rota 3, prevista para 2024, após atrasos, escoará, sobretudo, gás da Petrobras.

“Hoje vemos que produtores alternativos já comercializaram quase tudo da sua produção. Não enxergamos, nos próximos três a quatro anos, o aumento desses produtores alternativos. Pelo contrário, enxergamos que a Petrobras será o grande propulsor da oferta nacional, o que tende a piorar a concentração da oferta”, afirmou Lorenzon.

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A agenda dos produtores e transportadores

Representados pelo Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP) e Abpip (produtores independentes), os fornecedores de gás natural também apresentaram suas agendas regulatórias este ano. Dentre as principais propostas estão:

IBP

Acelerar a agenda regulatória na ANP e nos estados; promover a harmonização entre as regulamentações estaduais e federais, evitando as “ilhas de gás”.

Além de defender a desverticalização do setor de gás e, consequentemente, a separação (unbundling) entre atividades reguladas e atividades competitivas. E a tributação, para adaptá-la à nova estrutura de mercado, evitando onerar desnecessariamente as transações;

Abpip

Cita prioridades em linha com o IBP, mas acrescenta o interesse nos recursos não-convencionais. Defende o fomento a estudos técnicos, pesquisas de campo e desenvolvimento de parcerias entre governo e setor privado para aumentar a atratividade dessa alternativa de produção;

ATGás

Já a representante das transportadoras definiu, como prioridades da agenda do setor para o próximo governo aprimorar as regras do mercado cativo para otimizar a integração gás-energia; e acelerar a conexão das fontes de suprimento ao sistema de transporte.

  • O diretor-presidente da associação, Rogério Manso, também destaca a necessidade de manutenção do rumo do processo de abertura do mercado, “evitando-se tentativas de desvirtuar a Nova Lei do Gás”. Ele cita a preocupação do setor com a questão do livre acesso aos gasodutos.

  • Pela legislação federal, cabe à ANP disciplinar a cessão de capacidade mediante a fixação de condições e critérios para sua liberação e contratação. A agência, por lei, poderá estabelecer, para novos gasodutos que não integrem o sistema de transporte de gás natural, período no qual o acesso não será obrigatório.

Reveja nossa conversa com Rogério Manso no epbr entrevista

O GÁS NA SEMANA

Distribuidoras do Nordeste preparam chamada conjunta

Objetivo é contratar volumes para fornecimento a partir do segundo semestre do ano que vem. Algás (AL), Bahiagás (BA), Cegás (CE), Copergás (PE), PBGás (PB), Potigás (RN) e Sergas (SE) ainda estão avaliando o volume que cada uma vai comprar, além dos prazos de contrato e os pontos de entrega do gás.

Compagas recebe propostas de sete fornecedores de gás

A concessionária recebeu 15 propostas de suprimento, com início em 2023. Participam da chamada tanto produtores de gás nacional quanto importadores de gás boliviano e GNL.

Agepar prepara 1ª revisão tarifária da Compagas

A Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Paraná prevê abrir em novembro uma licitação para contratar consultoria para a Revisão Tarifária Periódica do serviço de gás canalizado do estado.

SCGás abre nova chamada

Distribuidora catarinense quer comprar até 350 mil m3/dia de gás natural para 2023 e 2024 na modalidade interruptível.

Raízen prepara terreno para biometano em frotas agrícolas

Empresa desenvolve dois projetos-piloto nas usinas de Araraquara e Paraíso (SP), para uso do combustível renovável no transporte de cana-de-açúcar, em substituição ao diesel. Companhia fechou, também, contrato com a fabricante de caminhões Scania para fornecimento médio de 7,8 mil m3/dia de biometano a partir de 2024, para abastecer a fábrica da Scania em São Bernardo do Campo (SP).

Renováveis mais baratas desafiam gás na Europa

A geração a gás natural terá dificuldades para se manter competitiva a longo prazo na Europa, aponta a Rystad Energy. A consultoria estima que a participação do gás na matriz elétrica do continente pode cair dos atuais 19% para 3% antes de 2050. O cenário vem da combinação entre a alta dos preços do combustível e o declínio dos custos das renováveis, dentre outros fatores. A geração eólica e solar, que hoje responde por 22% da matriz, pode atingir uma fatia de 77% da geração do continente europeu.

Europa afasta risco de falta de gás natural, por enquanto

O continente inicia o período de queda nas temperaturas com excesso de oferta do combustível, o que derrubou preços e alivia temores de escassez e racionamento no inverno, enquanto se afasta da Rússia como fornecedora de energia. Dow Jones