A regulação é um elemento essencial para o desenvolvimento da infraestrutura de um país. Ela não é um entrave, mas um instrumento de progresso, amparando um ambiente de negócios atrativo para novos investimentos.
No setor de gás natural, o verdadeiro risco não está na regulação, e sim na instabilidade normativa, que desorganiza expectativas, impacta planos de investimento e reduz a confiança dos agentes econômicos.
A previsibilidade regulatória é o que dá forma concreta à segurança jurídica — e, sem ela, não há expansão sustentável da infraestrutura nem segurança para o crescimento do mercado de gás natural.
O Brasil vive um momento decisivo na consolidação do novo marco legal do setor. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) conduz processos públicos de atualização regulatória, como a modernização da RANP nº 15/2014 (metodologia tarifária do transporte), a revisão tarifária das transportadoras, a classificação de gasodutos e o acesso a terminais de gás natural liquefeito (GNL).
Em paralelo, prosseguem as discussões do Leilão de Reserva de Capacidade (LRCAP), que também tratam da integração entre gás e eletricidade. Esses debates formam um conjunto de medidas estruturantes, indispensáveis para a clareza, a competitividade e a resiliência do mercado de energia.
Sobre a revisão tarifária, a ATGás reforça que o processo deve se basear em fundamentos técnicos. A tentativa de alterar metodologias de valoração para desqualificar ativos ignora investimentos cruciais ainda não depreciados e compromete a segurança jurídica, afastando investidores de longo prazo.
É preciso lembrar que o custo do transporte representa apenas 8% a 10% do preço final do gás natural para indústrias e uma proporção ainda menor para o uso doméstico e gás natural veicular (GNV). Os ganhos de eficiência e de competição entre fornecedores pela conexão ao Sistema de Transporte de Gás Natural (STGN) superam amplamente esse custo.
Nesse contexto, a RANP 15/2014 desempenha papel central. Sua atualização é fundamental para alinhar o modelo tarifário à nova realidade da indústria, incluindo a alteração do regime de outorga e o fim progressivo de contratos legados.
É imperativo que a metodologia de cálculo da remuneração do capital investido (WACC) seja tecnicamente sólida, aderente às melhores práticas e compatível com o risco da atividade. Essa é a base que viabiliza investimentos planejados, a modernização da malha de gasodutos e a eficiência em benefício do mercado.
Cabe à ANP, de maneira técnica e tempestiva, definir as condições que assegurem equilíbrio entre modicidade tarifária, segurança do serviço, eficiência e atratividade para novos investimentos. A previsibilidade promove esse equilíbrio, reduz o custo de capital, estimula novos projetos e viabiliza a expansão da malha.
A ATGás também destaca a importância da classificação de gasodutos, tema de recente debate público, que permitirá definir de forma transparente quais ativos devem ser enquadrados como infraestrutura de transporte.
Essa definição, baseada em critérios técnicos, é essencial para garantir coerência regulatória, expansão ordenada da malha nacional e previsibilidade ao mercado, evitando sobreposições de competência.
O Brasil tem agora a oportunidade de consolidar, no setor de gás natural, um modelo regulatório moderno, transparente e estável — capaz de equilibrar eficiência, modicidade tarifária e retorno justo — e de sustentar a ampliação da infraestrutura necessária para o desenvolvimento de seus recursos naturais, em sintonia com a transição energética. Avançar com regulação previsível e juridicamente estável é o caminho para fortalecer toda a cadeia de valor do setor energético nacional.
Marina Cyrino é gerente regulatória da Associação de Empresas de Transporte de Gás Natural por Gasoduto (ATGás).
