O Brasil vive um momento decisivo na transição energética, e o gás natural surge como peça-chave nesse processo.
Enquanto estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais vêm consolidando redes de distribuição de gás canalizado robustas, com milhares de quilômetros de malha e milhões de consumidores, o Espírito Santo se depara com um momento único de oportunidades para seguir o mesmo caminho.
Com apenas 593 quilômetros de rede (ante quase 26 mil quilômetros em São Paulo), e atendimento em 14 de seus 78 municípios, o Espírito Santo tem diante de si uma janela de oportunidade para se transformar em um hub energético.
E poderá impulsionar a competitividade industrial gerando benefícios públicos até agora não plenamente explorados.
O Plano de Negócios da ES Gás (2025-2030) revela contrastes históricos gritantes para um estado onde 67% do PIB vinculado ao comércio exterior, com commodities respondendo por 92% das exportações, mas que ainda possui uma infraestrutura defasada de gás canalizado, beneficiando poucos usuários.
Isso não permite maior avanço do estado e, consequentemente, levou a um desenvolvimento ainda incipiente da infraestrutura de gás canalizado, frente a outros estados.
A demanda ainda é extremamente concentrada, com aproximadamente 80% do consumo total da concessionária destinado a apenas 11 indústrias que usufruem dos benefícios do gás natural, expondo a concessão a uma grande volatilidade externa.
A infraestrutura conta com apenas 41 postos de combustíveis com oferta de gás natural veicular (ante mais de 730 no estado do Rio de Janeiro) e 86 mil unidades residenciais/comerciais atendidas (ante mais de 2,8 milhões em São Paulo).
A fragilidade trazida por uma infraestrutura aquém do perfil do Espírito Santo é um paradoxo, dado o dinamismo da economia capixaba, que abriga clusters estratégicos em diversos setores econômicos.
No entanto, alguns fatores importantes estão colocados para o momento favorável ao estado.
A privatização da ES Gás — adquirida pelo grupo Energisa, cuja expertise no setor elétrico é amplamente conhecida — já apresenta resultados positivos. Em apenas 18 meses, a concessionária expandiu a rede em 100 quilômetros e conectou 11 mil novas unidades.
E o programa ES Mais+Gás da Secretaria de Desenvolvimento do Governo do Espírito Santo, que trata de uma política energética com metas de descarbonização, segurança e competitividade — colocando as redes de gás natural e sua integração com o biometano (gás 100% renovável) como fator primordial da injeção, até 2034, de R$ 20 bilhões de investimentos, com vistas à redução de emissões de CO2.
Cabe ressalvar neste olhar do futuro a importância do gás natural para a competitividade industrial.
Estados que utilizam o gás como alavanca energética demonstram maior atratividade para investimentos de diversos setores, como indústria automobilística, siderurgia, cerâmica, além da disposição do energético para uso em termelétricas, essenciais para a garantia da segurança energética.
Assim, o plano da ES Gás para os próximos anos prevê ações transformadoras, como:
- a interiorização energética, levando gás a cinco novos municípios;
- a conexão de quatro plantas de biometano; o atendimento do Parklog em Aracruz;
- a substituição de combustíveis, com meta de converter 50 mil veículos para gás natural veicular, o GNV;
- e a substituição de outros combustíveis com níveis elevados de emissão de carbono (diesel, por exemplo), contribuindo com a descarbonização.
O potencial de geração de bem-estar social pela ES Gás é grande. Limitado pela baixa capilaridade das redes atuais, o consumo residencial detém apenas 0,89% de participação no volume distribuído. Essa parcela é inferior à observada em concessionárias do Rio de Janeiro e de São Paulo.
Portanto, a expansão projetada de atingir o número de 270 mil consumidores até 2030 trará benefícios para a população capixaba, que poderá usufruir de um energético mais limpo, seguro e com conveniências de uso diferenciadas em relação aos concorrentes. Ademais, a estimativa é de geração de 500 empregos diretos na construção de redes.
O plano de R$ 1 bilhão em investimentos (2025-2030) revela um futuro de desenvolvimento para o Espírito Santo, com projeção de expandir a rede para uma extensão superior a mil quilômetros e interiorizar o acesso ao energético.
O projeto visa a atrair indústrias de valor agregado e permitirá a integração de corredores logísticos sustentáveis com o oferecimento do biometano e do GNV.
Marcos Lopomo é diretor Econômico e Regulatório da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás). É mestre em Energia e Sustentabilidade pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Possui 25 anos de experiência nos setores de Energia e Gás Natural, com atuação em empresas de Distribuição, Consultorias e Agência Reguladora.