Opinião

O que a cadeia de gás natural espera da COP30?

A busca por soluções que conciliem desenvolvimento socioeconômico e preservação ambiental deve nortear esse diálogo, escrevem Sylvie D'Apote e Daniela Santos

Sylvie D’Apote, diretora de Gás Natural do IBP, durante entrevista ao estúdio eixos na OTC Brasil 2025, no Rio, em 30 de outubro (Foto Juliana Rezende/agência eixos)
Sylvie D’Apote, diretora de Gás Natural do IBP, fala ao estúdio eixos na OTC Brasil 2025, em 30 de outubro (Foto Juliana Rezende/agência eixos)

À primeira vista, o título deste artigo poderia ser invertido — afinal, é na COP30 que o mundo dirá o que espera do gás natural. No entanto, na véspera do evento, vale refletir sobre o que a cadeia de gás natural espera da COP30, especialmente diante do papel que o Brasil pode exercer nesse debate global.

A Conferência das Partes acontecerá em Belém (Pará), entre 10 e 21 de novembro, com o objetivo de avançar na implementação das metas do Acordo de Paris, em especial o compromisso de limitar o aumento da temperatura média global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.

Também serão apresentadas e debatidas as segundas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e discutidos os mecanismos de financiamento climático, com foco em permitir que países em desenvolvimento implementem ações sustentáveis.

Assim, antes do início da COP30 é importante pensarmos nas nossas expectativas em relação aos sinais que essa conferência poderá oferecer sobre o papel do gás natural em uma transição energética justa, segura e eficaz, tanto no Brasil quanto no mundo.

Esperamos que, mais do que narrativas abstratas ou irrealizáveis que pregam a eliminação completa dos combustíveis fósseis, sejam debatidos, de forma serena e objetiva, temas relevantes como a descarbonização da demanda (em paralelo à diversificação e descarbonização da oferta), a necessidade de garantir a segurança energética e o direito de todos os povos a ter suas necessidades energéticas atendidas.

Tudo isso considerando as especificidades regionais e nacionais, níveis de desenvolvimento, acesso a recursos naturais, infraestrutura e capacidade financeira.

A busca por soluções que conciliem desenvolvimento socioeconômico e preservação ambiental deve nortear esse diálogo.

A troca de experiências nas negociações climáticas — que reúnem quase 200 países com perfis e interesses distintos — é uma oportunidade única. Discutir soluções que possam ajudar o planeta é um marco fundamental, independentemente das origens ou realidades de cada nação.

Por outro lado, tais soluções precisam ser sustentáveis também sob a ótica da inclusão social, geração de empregos e redução das desigualdades, sem comprometer os compromissos ambientais assumidos.

Ao longo da história das conferências do clima, tem se tornado cada vez mais evidente a necessidade de uma avaliação climática justa — que considere o desenvolvimento socioeconômico, a responsabilidade ambiental e os diferentes graus de maturidade dos mercados.

O papel do gás natural no Brasil

O Brasil possui uma dupla vantagem: por um lado, uma matriz energética já altamente descarbonizada, com ampla participação de fontes renováveis e biocombustíveis[1], e por outro lado reservas significativas de petróleo e gás natural.

Neste contexto, o setor de gás natural brasileiro, nos últimos anos, deixou de ser um mero coadjuvante, ou subproduto, da produção de petróleo, para assumir papel de protagonista, justamente pela sua importância na transição energética.

No Brasil, o gás natural tem papel essencial na geração elétrica, complementando as fontes renováveis que apresentam variabilidade sazonal e intermitência diária, trazendo segurança ao abastecimento elétrico.

À medida que a demanda de energia cresce com a eletrificação da economia e que a geração renovável se expande, também deverá crescer significativamente a geração termelétrica movida a gás natural. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a geração a partir de gás natural deverá mais que quadruplicar nos próximos dez anos[2].

Além disso, o gás natural pode contribuir para descarbonizar os setores industrial e de transporte, substituindo combustíveis fósseis mais poluentes, menos eficientes e com maior pegada de carbono.

Em outras palavras, o gás natural representa a opção tecnológica mais rápida e acessível no curto e médio prazo (um low hanging fruit, como se diz em inglês) para impulsionar a descarbonização da nossa economia, ao mesmo tempo em que viabiliza o avanço contínuo das fontes renováveis.

Esse papel foi reconhecido pelo Plano Clima, cujo objetivo é orientar a política climática nacional até 2035, com a meta de reduzir entre 59% e 67% das emissões de gases de efeito estufa até esse ano.

O Plano Setorial de Energia, cuja versão final ainda não foi publicada, enfatiza a redução da intensidade das emissões sem, no entanto, prever o abandono completo dos combustíveis fósseis. Em outras palavras, o gás natural permanece como componente relevante do futuro energético brasileiro, ainda que com atenção crescente à mitigação das emissões associadas.

Em paralelo, nos últimos anos, o setor de gás vem passando por processo de abertura de mercado, com diversificação de agentes, modernização do arcabouço legal e regulatório, estímulo à concorrência, expansão da infraestrutura, aumento da transparência e do diálogo, entre outros.

Os avanços são inequívocos, atraindo investimentos, gerando empregos e consolidando a importância do setor. Ainda assim, há um caminho de amadurecimento a ser percorrido.

Expectativas para a COP30

É nesse cenário que devemos refletir sobre o que a COP30 pode representar para o gás natural no Brasil.

Mais do que um evento diplomático, a conferência pode sinalizar oportunidades de investimento e reconhecer o papel estratégico do gás na transição energética — especialmente em países em desenvolvimento.

O setor de gás natural espera que sejam dadas sinalizações claras e coerentes, que reconheçam e reforcem o papel protagonista do gás natural na transição energética, tanto no Brasil como no mundo.

Isso é fundamental para assegurar a continuidade dos avanços conquistados e dar segurança aos investimentos planejados em toda a cadeia produtiva — os quais resultam em renda, empregos e desenvolvimento sustentável.

Em suma, a expectativa é de que a COP30 confirme o gás natural como aliado na construção de uma transição energética justa, segura e economicamente viável, capaz de conciliar crescimento econômico, responsabilidade ambiental e inclusão social.


Sylvie D’Apote é a diretora executiva de gás natural do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP)

Daniela Santos é consultora do IBP e advogada especialista no setor de gás natural


Referências

[1] Segundo o Balanço Energético Nacional (BEN) 2025, que consolida os dados de 2024, as fontes renováveis totalizam cerca de 50% da matriz energética, o que inclui hidráulica, biomassa, eólica e solar. Isso coloca o Brasil entre os países com maior participação de renováveis no mundo.

[2] Plano Decenal de Expansão de Energia 2034, publicado em nov. 2024.

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