O retorno de Donald Trump à Casa Branca, em 2025, deve significar a retomada das licenças para novos projetos de exportação de gás natural liquefeito (GNL) nos Estados Unidos.
A vitória republicana nas urnas, porém, não será suficiente para dissipar por completo as incertezas que pairam sobre o futuro da indústria de GNL dos EUA – líder nas exportações da commodity no mercado global e a principal fonte de gás da Europa desde que o continente restringiu as importações da Rússia.
A pressão de ambientalistas, a judicialização do tema e os desdobramentos da eleição de Trump sobre a guerra comercial com a China são alguns dos fatores que devem manter a névoa sobre o GNL nos EUA.
O assunto diz respeito ao Brasil: os EUA são a principal fonte de GNL do mercado brasileiro. Além disso, tem crescido o uso do Henry Hub, preço de referência do mercado estadunidense, como indexador nos preços do gás doméstico, no Brasil.
O que Trump deve significar para o futuro do GNL?
A revisão da moratória temporária anunciada este ano pelo governo Joe Biden (entenda) era uma das promessas de campanha republicana.
Em análise feita em outubro, antes portanto da eleição de Trump, o vice-presidente sênior da Wood Mackenzie para as Américas, Ed Crooks, escreveu que, embora Democratas e Republicanos apresentem visões totalmente diferentes para o futuro da indústria de óleo e gás, a importância da política federal para o setor energético é frequentemente superestimada.
Ele destacou, contudo, que a indústria do GNL é uma área sensível a mudanças imediatas de rumo, já que Trump se comprometeu, na campanha, a reiniciar as aprovações de novos projetos imediatamente ao assumir o cargo.
A expectativa é que os projetos de exportação sejam assumidos como de interesse público na administração republicana.
No caso de uma vitória de Kamala Harris, a probabilidade de suspensão da pausa também era alta, mas, nesse caso, a expectativa é que novos requisitos fossem impostos pelos Democratas – tornando o processo de autorização mais lento e complexo. A visão é compartilhada pela S&P Global Commodity Insights.
Um exemplo prático: em agosto, o governo Biden deu permissão de exportação para o projeto Altamira FLNG, da New Fortress, que embora esteja situado no México usa o gás dos EUA. A autorização foi concedida, no entanto, por apenas cinco anos.
O outro lado da moeda: a S&P Global Commodity Insights ressalva que uma revisão das políticas de redução das emissões de metano, do governo Biden, pode prejudicar os exportadores americanos – já que a indústria de gás local enfrenta crescentes exigências no mercado europeu para melhor rastrear e controlar as emissões de metano na cadeia de valor do GNL.
Relembre
Para que um projeto de liquefação possa exportar GNL dos EUA para países com os quais os Estados Unidos não têm um Acordo de Livre Comércio (ALC), o agente precisa da aprovação do Departamento de Energia (DoE).
O mesmo vale para projetos no México e Canadá que usem gás americano como matéria-prima.
No início do ano, sob a pressão de ambientalistas, o governo Biden emitiu uma ordem executiva determinando uma pausa temporária na aprovação de novos projetos de exportação – sob a alegação de que a medida permitiria atualizar os critérios ambientais de análises das autorizações
A interrupção vale, justamente, para o envio de gás a países com os quais os EUA não possuem ALC – no caso, a maioria dos principais importadores da Europa e a China.
A pausa desacelerou o progresso em projetos, ao lançar dúvidas sobre o momento das decisões finais de investimento.
A Wood Mackenzie estima que há, nos EUA, projetos de GNL com uma capacidade total de quase 90 milhões de toneladas/ano com autorizações de exportação pendentes. O número é equivalente a toda a capacidade operacional de exportação atual do país.
A judicialização dos projetos de gás nos EUA
Fora do Poder Executivo, há outros fatores que podem afetar a expansão da indústria de GNL nos Estados Unidos.
Litígios na Justiça, como aqueles envolvendo os projetos Rio Grande LNG e Texas LNG, segundo a Wood Mackenzie, “podem ser a maneira mais eficaz para os ativistas desacelerarem o crescimento da indústria”.
Em 2021, a Corte de Apelações para o Circuito do Distrito de Columbia determinou que a Comissão Federal de Regulamentação de Energia (FERC) refizesse a análise ambiental que embasou as decisões de autorizar os dois projetos.
Em agosto deste ano, um painel de juízes do tribunal rejeitou a nova análise da FERC, alegando que a comissão ainda não havia investigado adequadamente os impactos ambientais dos empreendimentos.
Guerra comercial com a China também pode afetar
A S&P Global Commodity Insights pontua que, mesmo que Trump encerre a pausa rapidamente, a indústria de gás dos EUA carregará o risco de disputas comerciais no novo governo republicano.
No primeiro mandato de Trump, os EUA impuseram tarifas sobre uma série de importações chinesas – o que desencadeou tarifas retaliatórias pela China, incluindo sobre o GNL dos EUA.
Isso resultou na queda das exportações de GNL para a China em 2019 antes de se recuperar um ano depois, após os dois países chegarem a um acordo comercial preliminar.
A promessa de Trump de impor tarifas sobre importações, particularmente contra a China, pode desencadear o risco de retaliação que pode afetar os fluxos de GNL das instalações existentes.