Geopolítica

Como guerra no Oriente Médio impacta o mercado global de GNL e o Brasil

Eventual fechamento do Estreito de Ormuz pelo Irã pode levar a um novo choque de preços no mercado global, a exemplo daquele vivido em 2022, no contexto da guerra da Ucrânia, estima Instituto Oxford de Estudos de Energia

Navio-tanque Golar Mazo atracado em terminal de GNL (Foto: Cortesia)
Navio Golar Mazo atracado em terminal de GNL (Foto: Cortesia)

RIO — Um eventual fechamento do Estreito de Ormuz pelo Irã, em resposta aos bombardeios dos Estados Unidos contra instalações nucleares iranianas, pode levar a um novo choque de preços no mercado global de gás natural liquefeito (GNL) – a exemplo daquele vivido em 2022, no contexto da eclosão da guerra da Ucrânia.

A conclusão é do Instituto Oxford de Estudos de Energia (OIES, na sigla em inglês), que estima que os preços do GNL no mercado de curto prazo (spot) podem voltar aos patamares de US$ 30 o milhão de BTU nos hubs da Europa e da Ásia. (leia o relatório na íntegra, em .pdf)

Isso é mais do que o dobro dos preços do TTF (referência do gás na Europa) antes do bombardeio americano, no fim de semana – de US$ 13 a US$ 14 o milhão de BTU.

O instituto britânico considera improvável, no entanto, um fechamento prolongado do estreito, localizado entre o Irã e o Omã. Nesta segunda-feira (23/6), o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou que Israel e Irã chegaram a um acordo para um cessar-fogo e que o conflito será encerrado.

Os contratos futuros de petróleo tombaram perto de 7%, refletindo, justamente, interpretações de que as primeiras reações militares do Irã tiveram alcance limitado.

A seguir, a agência eixos explica qual o impacto da paralisação do Estreito de Ormuz sobre o mercado global – e sobre o Brasil, que depende da importação de GNL para suprir sua demanda interna, sobretudo das termelétricas.

Como Ormuz impacta o comércio global de GNL

O OIES modelou o impacto do fechamento prolongado do Estreito de Ormuz, a fim de avaliar adequadamente os fundamentos do mercado, e concluiu que, numa eventual interrupção do fluxo do comércio de GNL que passa pela região:

  • o fornecimento de GNL do Oriente Médio seria 110 bcm (bilhões de metros cúbicos) menor, anualmente;
  • essa queda seria parcialmente compensada por volumes maiores da Austrália e América do Norte, mas resultaria num declínio geral de 86 bcm do comércio global – o que equivale a 15% do fornecimento global de GNL;
  • Para efeitos de comparação, o declínio nas exportações de gasodutos da Rússia para a Europa entre 2021-2023 foi de 135 bcm em base anual

Ormuz recebe boa parte da produção do Oriente Médio, incluindo GNL de grandes exportadores como o Catar e os Emirados Árabes Unidos (EAU).

Segundo o OIES, outro choque de preços, semelhante ao de 2022, teria “consequências terríveis para os orçamentos governamentais na Europa e na Ásia”.

O destino das exportações da região é, sobretudo, a Ásia. Os principais destinos são China, Índia, Coreia do Sul, Taiwan e Paquistão. Na Europa, os principais mercados são Itália, Bélgica e Polônia.

A Europa seria desproporcionalmente afetada em termos de volume, perdendo GNL para os mercados asiáticos, pontua o OIES.

Como o Brasil pode ser afetado?

O Brasil não é dependente das importações de GNL do Oriente Médio.

Em 2024, Catar e EAU responderam por cerca de 10% das importações brasileiras, de acordo com dados da ComexStat.

O mercado brasileiro é mais impactado pela dinâmica do mercado da Bacia do Atlântico. Os Estados Unidos representaram, no ano passado, 75% das importações brasileiras.

Uma crise no mercado asiático e europeu, contudo, tem efeitos indiretos sobre o Brasil: se a oferta do Oriente Médio for reduzida, os compradores asiáticos poderão recorrer a outros fornecedores de GNL, como os EUA – o que pode estimular a volatilidade no mercado spot.

É verdade que o Brasil não é uma ilha: as termelétricas são as principais consumidoras do GNL importado no Brasil e é comum que os contratos de suprimento dessas térmicas sejam vinculados ao índice JKM, referência no mercado asiático, por exemplo.

Oxford vê diferenças em relação à guerra da Ucrânia

O instituto britânico pondera que a potencial perda de volume do Catar e dos Emirados Árabes Unidos, com um eventual fechamento de Ormuz, é de uma “magnitude semelhante” em relação à interrupção do fluxo de gás russo para a Europa, em 2022.

Mas a redistribuição dos fluxos do comércio global tende a ser diferente.

Em 2022, a Europa, para compensar a redução das importações da Rússia, atraiu para si as cargas de GNL das plantas de liquefação dos Estados Unidos. 

Com uma interrupção de parte das exportações do Oriente Médio, num eventual fechamento do Estreito de Ormuz, a Ásia é que desviaria da Europa parte do GNL americano.

A OIES também destaca que o choque de preços, dessa vez, seria menor que aquele vivenciado no mercado europeu. Na ocasião, o TTF chegou a US$ 47 o milhão de BTU, mas parte dessa inflação refletiu o congestionamento da infraestrutura de importação no continente. 

No Japão e no Reino Unido, para efeitos de comparação, os preços spot atingiram os US$ 33 e US$ 34 o milhão de BTU – e, na visão do instituto britânico, um possível fechamento do Estreito de Ormuz teria impacto mais próximo desses dois casos.

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