BRASÍLIA — Lançada na última quarta (16/11) na COP27, a Coalizão Energia Limpa promoveu debate sobre uma transição justa e limpa no cenário energético brasileiro. A aliança tem como objetivo excluir o gás natural como fonte de energia para a geração de eletricidade no Brasil até 2050.
Formado por organizações da sociedade civil, o grupo discutiu soluções energéticas mais ambiciosas e menos poluentes do que o gás natural, um dos responsáveis pelas emissões de gases do efeito estufa (GEE).
Durante o painel no Brazil Climate Action Hub, Ricardo Baitelo, gerente de projetos do Iema, apresentou um mapa da expansão do gás no Brasil. O país possui atualmente 196 termelétricas a gás em operação, com previsão de instalação de mais 55 projetos.
O levantamento também prevê nove novos projetos de terminais de gás natural liquefeito (GNL), representando um aumento de 380% no número de terminais.
Vale destacar que o Plano Decenal de Expansão de Energia 2030 prevê o crescimento da produção de gás natural no país, que deve aumentar de 130 milhões para 276 milhões de metros cúbicos por dia até 2030.
Para Baitelo, a expansão é controversa já que o Brasil possui possibilidades de investir na integração de fontes de energia viáveis, como a eólica e a solar. Um dos principais problemas do uso do gás natural são os impactos ambientais gerados pelas substâncias poluentes liberadas através da queima.
“A gente quer intensificar a comunicação de que o gás natural não é mais um combustível para a transição. Não podemos contratar térmicas que vão operar até depois de 2040, pois obviamente estaremos aumentando as emissões climáticas”, disse.
Cássio Carvalho, representante do Inesc, exemplificou os diversos incentivos que o país proporciona para a expansão do gás natural. São eles: os projetos de infraestrutura, as termelétricas, a redução de impostos fiscais para o setor, além de financiamentos e subsídios de produção.
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Ofensiva contra térmicas
A coalizão é formada pelo Instituto Internacional Arayara, Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Instituto Pólis e o ClimaInfo.
Organizações que têm lançado ofensivas contra termelétricas no Brasil.
Estudo do Iema lançado no final de setembro, às vésperas do primeiro leilão das termelétricas compulsórias previstas na lei de privatização da Eletrobras, alertou que a contratação de 2 GW nesse modelo seria responsável pela emissão de 5,2 milhões de toneladas de CO2 por ano.
Com contratos de 15 anos, até 2042 o Iema calcula que as novas usinas devem emitir 77,6 milhões de toneladas de CO2e na atmosfera: 38,8 milhões pela Região Norte; 27,2 milhões pelo Piauí; e 11,6 milhões pelo Maranhão.
Já a contratação total dos 8 GW pode ser responsável por 310 milhões de toneladas de CO2e até 2045.
A Coalizão Gás e Energia e a ONG Arayara chegaram a pedir à Justiça Federal a concessão de medida cautelar para suspender o leilão. Mas não foram atendidas.
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O Arayara.org também foi uma das organizações que levou à Justiça o caso do complexo termelétrico flutuante a gás da Karpowership Brasil (KPS), na Baía de Sepetiba (RJ), para impedir a instalação do empreendimento sem as licenças ambientais.
Já em novembro, a ONG entrou com uma Ação Civil Pública na Vara Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, comarca de Macaé, na tentativa de conter o plano de implementação de um complexo termelétrico no município fluminense.
Petrobras e o gás na transição
“A Petrobras talvez seja o único conglomerado brasileiro capaz de conduzir essa transição de forma justa e de forma gradual o suficiente para não traumatizar segmentos, setores e populações”, disse no mesmo evento desta quarta, na COP27, o senador Jean Paul Prates (PT/RN).
Membro da equipe de transição do governo Lula e um dos cotados para presidir a Petrobras, Prates tem defendido que a estatal entre no mercado de geração eólica offshore, a exemplo das petroleiras europeias, adequando a empresa ao novo cenário energético.
Também defende “trazer o conceito de sustentabilidade para dentro da transição com o gás natural”.
“Com o GNL [gás natural liquefeito], por exemplo, [que] é um mercado bastante inflacionado, mas nós podemos criar um GNL de cabotagem que seja mais ameno para nós e produzir GLP [o gás de cozinha], que é um substituto da lenha”, comentou.
“É melhor GLP ou lenha?”, reforçou.
O senador também defendeu o gás natural como alternativa para reduzir as emissões do transporte, deslocando o consumo de diesel, por exemplo. E como matéria-prima para petroquímica e fertilizantes.
Já Federação Única dos Petroleiros (FUP) apontou a necessidade de um estudo que identifique os tipos de empregos que serão gerados a partir da transição energética dentro das refinarias brasileiras.
“O Brasil possui uma das maiores reservas de petróleo do mundo e os trabalhadores do setor têm interesse em participar desse processo de transição energética”, afirmou Cloviomar Pereira, técnico do Dieese na FUP.
A FUP entregou algumas propostas ao governo de transição, entre elas:
A revitalização do programa de biocombustíveis da Petrobrás, com a preservação da PBio (Petrobras Biocombustíveis) e a retomada de suas plantas de produção de biocombustíveis.
O retorno da atividade da Petrobrás na geração de energia por meio de usinas eólicas e solares, assim como o investimento em pesquisas para o desenvolvimento do hidrogênio verde.
A produção de energia elétrica por meio de termelétricas a gás natural será uma necessidade do país nos próximos anos, inclusive como preparação para uma transição energética efetiva, com o fechamento das termelétricas movidas a carvão e óleo diesel. A perspectiva de barateamento do gás natural no curto/médio prazo amplia essa oportunidade.