newsletter
Diálogos da Transição
APRESENTADA POR
Editada por Nayara Machado
[email protected]
Presidida pelo Japão, a cúpula do G7 este ano terminou no domingo (21/5) com um pedido para que todos os governos – “especialmente as principais economias” – se comprometam com emissões líquidas zero até 2050, o mais tardar, e estabeleçam metas alinhadas com a limitação do aquecimento global a 1,5°C.
No mesmo documento, no entanto, deixa claras as predisposições dos membros a continuar investindo em combustíveis fósseis, em nome da segurança energética em tempos de guerra.
O comunicado final da cúpula (.pdf), divulgado na tarde de sábado em Hiroshima, no Japão, expressa a concordância do grupo dos sete em substituir os combustíveis fósseis por novas fontes de energia o mais rápido possível.
Mas a linguagem adotada deixa espaço para investimentos em usinas a carvão que o governo japonês está ajudando a financiar, assim como novos investimentos em infraestrutura de gás natural, modificando pouca coisa em relação ao documento do ano passado.
A defesa dos novos investimentos em gás se apoia nos efeitos da invasão da Ucrânia pela Rússia sobre a oferta global de energia, com impactos inflacionários.
“Na circunstância excepcional de acelerar a eliminação gradual de nossa dependência da energia russa, investimentos com apoio público no setor de gás podem ser apropriados como resposta temporária, sujeito às circunstâncias nacionais claramente definidas”, diz um trecho do comunicado.
O texto também argumenta que “se implementado de maneira coerente com nossos objetivos climáticos” os projetos poderão, no futuro próximo, integrar as estratégias nacionais para o mercado de hidrogênio de baixo carbono.
E reflete esforços do Japão e da Alemanha para emplacar o gás natural como um combustível de transição do óleo para as renováveis.
A estratégia da Alemanha encara os novos investimentos em infraestrutura de gás como fundamentais para sua independência energética em relação ao fornecimento russo.
“A batalha nos bastidores destacou os desafios políticos, econômicos e práticos que muitas nações do Grupo dos 7 enfrentaram ao tentar acelerar uma transição energética global com trilhões de dólares em incentivos governamentais”, relata o New York Times.
Por que o G7 importa?
ormado por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Reino Unido e União Europeia, as decisões do grupo têm grande peso na agenda climática global.
Os membros representam uma parcela significativa do PIB e das emissões históricas – Estados Unidos e União Europeia estão, ao lado da China, entre os três maiores emissores de gases de efeito estufa.
De acordo com dados do Global Carbon Project, entre 1850 e 2020, os EUA emitiram 24,6% de todo o carbono que chegou à atmosfera. Em seguida vem a Alemanha (5,5%), Reino Unido (4,4%) e Japão (3,9%).
Isso significa que, ao expandir os compromissos climáticos, cortar subsídios aos combustíveis fósseis e investir em energia renovável, o G7 tem o poder de causar mudanças radicais no clima e na economia mundial.
Basta ver a repercussão da Lei de Redução da Inflação (IRA, em inglês), sancionada por Joe Biden no ano passado, cujos incentivos à indústria de baixo carbono prometem mudar a configuração de investimentos ao redor do globo.
Mas vale dizer, nenhum país do G7 tem metas ou políticas alinhadas com a meta 1.5°C. O Reino Unido é o único “quase suficiente”, segundo a plataforma Climate Action Tracker.
ONU pede ‘redefinição global’
Em mensagem aos líderes do G7, o secretário-geral General António Guterres, disse que o sistema financeiro criado após a Segunda Guerra Mundial simplesmente “falhou em cumprir sua função principal como uma rede de segurança global”, diante dos choques econômicos da pandemia de Covid-19 e da invasão russa da Ucrânia.
“Enquanto o quadro econômico é incerto em todos os lugares, os países ricos não podem ignorar o fato de que mais da metade do mundo – a grande maioria dos países – está sofrendo com uma profunda crise financeira”.
Na transição ecológica justa, Guterres apontou o bloco dos países mais ricos do mundo como central para a ação climática que começa a mostrar resultados, mas ainda está “claramente fora do caminho”.
Um Pacto de Solidariedade Climática pede que o G7 mobilize recursos para apoiar economias menos abastadas na aceleração da descarbonização, para ficar dentro do limite de 1,5°C.
No entanto, o financiamento a países pobres está muito aquém da demanda.
Em meio a várias crises que afetam o mundo em desenvolvimento — clima, alimentos e dívida — o FMI calcula que serão necessários de US$ 3 trilhões a US$ 6 trilhões por ano até 2050 em investimentos para enfrentar o desafio climático.
Mas, até o final do ano passado, só US$ 630 bilhões desse total foram aplicados — e uma parte pequena foi destinada aos países emergentes.
Lula quer Brasil protagonista
O presidente brasileiro foi ao G7 como convidado e a missão de recuperar o protagonismo nas negociações relacionadas a clima e meio ambiente.
Em conversa com jornalistas após o encerramento da cúpula no domingo, Lula (PT) voltou a dizer que o Brasil vai ajudar o mundo a cumprir as metas do Acordo de Paris, para cortar emissões.
A lista de compromissos inclui desmatamento zero até 2030 e uma “transição energética profunda”. Em contrapartida, cobra os aportes e doações de países ricos para medidas de reversão da crise climática.
Citando a predominância de renováveis na matriz elétrica e energética e sua vantagem em relação ao resto do mundo, Lula disse que o Brasil tem autoridade moral e política para discutir transição ecológica internacionalmente.
“Nós não queremos transformar a Amazônia em um santuário da humanidade. O que nós queremos é entender que na Amazônia moram 28 milhões de pessoas e essas pessoas têm o direito de comer, trabalhar e ter acesso aos bens materiais que todos nós temos”, disse.
“Por isso nós precisamos explorar, não desmatando, explorar a riqueza da biodiversidade para saber, inclusive, se a gente pode extrair, desenvolver uma indústria de fármacos, de cosméticos, para gerar empregos limpos”, completou.
Um debate que tem esquentado nas últimas semanas é a campanha exploratória da Petrobras na Foz do Amazonas.
E ainda…
Gás versus hidrogênio verde
A contratação compulsória das térmicas (UTEs), previstas pela lei de privatização da Eletrobras, pode tirar a competitividade do hidrogênio verde brasileiro produzido com eletrolisadores a partir da energia fornecida pelo SIN, segundo estudo feito pela PSR.
Segundo a PSR, as térmicas na base podem prejudicar a certificação de projetos baseados na energia fornecida pelo grid, a partir de 2027, o que demandará a contratação adicional de energia renovável.