RIO — Dos 80 GW de eólica offshore em licenciamento em mares brasileiros, 7 GW são desenvolvidos por braços de investimento do fundo de pensão dinamarquês PensionDanmark e têm aportes estimados em, no mínimo, US$ 6 bilhões.
Na agenda dos investidores, está o marco regulatório, que precisa definir as regras de acesso às áreas offshore e, eventualmente, a inserção da energia no mercado.
“Quanto mais a gente demora para definir essas regras e a definição do leilão, os outros países vão correndo na frente. O governo está fazendo a parte dele e nós já estamos aqui, com o dinheiro para investir”, afirma Diogo Nóbrega.
O executivo comanda as operações do Copenhagen Infrastructure Partners (CIP) e Copenhagen Offshore Partners (COP), no Brasil, braços de investimento em infraestrutura do fundo dinamarquês.
Entenda: eólicas offshore no Brasil
- O interesse por eólicas offshore no Brasil disparou de dois anos para cá e empresas nacionais e estrangeiras demonstram que a fonte, antes algo distante no planejamento energético, é agora uma alternativa promissora para mercados futuros de baixo carbono.
- O Ministério de Minas e Energia (MME) publicou um decreto para regulamentar a contratação das áreas.
- O Congresso Nacional também discute o tema — o principal PL foi proposto por Jean Paul Prates (PT/RN) e é relatado pelo líder do PL, Carlos Portinho (RJ), no Senado, que falou à agência epbr o que pensa sobre o marco legal.
No Brasil, os parques do fundo totalizam 7,2 GW em licenciamento no Ibama, por meio da Bosford Participações.
São parques offshore no Piauí (Palmas do Mar, de 1,4 GW), Rio Grande do Norte (Alísios Potiguares, de 1,8 GW), Rio de Janeiro (Ventos Fluminenses, de 2,8 GW) e Rio Grande do Sul (Ventos Litorâneos, 1,2 GW).
Cada projeto possui um ticket mínimo para investimento de US$ 1,5 bilhão.
Por que o marco regulatório é importante para as eólicas offshore?
O decreto do MME prevê o rito para contratação das áreas offshore, mas agentes do mercado entendem que ainda há lacunas na regulação.
Sem falar, na possibilidade de o marco ser alterado pelos parlamentares.
“Definir as regras do espelho d’água: esse é o ponto número um fundamental. O segundo ponto é a questão de como conseguir comercializar [a energia]”, resume Diogo Nóbrega.
“Essa é a proposta que levamos ao governo, discutimos diretamente com o ministro Bento Albuquerque e Marcelo Cabral [secretário do MME]. E eles entenderam isso”.
“Não tem outra solução: leilões. No mercado livre, ninguém vai comprar. Então esses são dois fatores: a concessão do espelho d’água e a garantia de leilões”, reforça o CEO.
A experiência internacional demonstra que a escala dos projetos no mar é fundamental para elevar a economicidade dos parques e, por isso, são parques com capacidades muito superiores aos projetos típicos em terra.
E como a eólica offshore não é uma energia barata, vai demorar alguns anos para ser, de fato, competitiva.
“Dizer que ela vai ser mais barata do que a onshore é um pouco difícil (…) os governos de alguns países têm dado incentivos, subsidiado as tarifas para offshore, para que a indústria se estabeleça em desenvolvimento. Ela sozinha não consegue entrar puramente no mercado livre, não seria competitiva”, explica.
Competição por acesso às áreas
Além da indefinição sobre o modelo de comercialização da energia offshore, um dos grandes entraves para o desenvolvimento do novo mercado são as sobreposições dos projetos em licenciamento.
Em janeiro deste ano, o Ibama atualizou os dados, indicando 37 projetos sob sua análise, com potência instalada total superior a 80 GW e ao menos 25 áreas com algum nível de sobreposição.
Os quatro projetos da CIP possuem algum tipo de sobreposição com pedidos de licenciamento de outras empresas.
O caso mais complexo é no Rio Grande do Norte, onde a área de exploração delimitada pela companhia tem sobreposições de outros três projetos.
Nóbrega faz uma analogia ao setor da construção. “Você não vai comprar um terreno e construir uma casa se você não tiver cem por cento de certeza que aquele terreno é seu”.
“A gente vai depender que o governo realmente defina as regras, o banco imobiliário, onde é que a gente vai botar nossas pecinhas”, completa.
Uma das propostas do decreto governamental é a cessão independente, em que o governo delega ao mercado um acordo na disputa sobre as áreas exploradas.
“Acho totalmente viável, mas tem que ter regras claras para que o mercado se entenda (…) É muito indefinido ainda. Então, não dá para a gente iniciar nenhum tipo de negociação se não tem nenhuma regra”, diz o executivo.
“Óbvio que eu posso tentar engajar em alguma conversa agora com algumas dessas empresas e tentar uma solução amigável, mas eu acho difícil sair um cachorro desse mato”, sublinha.
Brasil pode perder janela de oportunidade
Nóbrega chama a atenção para a necessidade de se agilizar o marco, para que o Brasil não perca a janela de oportunidades e os investimentos acabem migrando para outros países.
“Quanto mais a gente demora para definir essas regras e a definição do leilão, os outros países vão correndo na frente”.
“Por isso é importante ter essa celeridade agora, porque senão o Brasil perde essa janela de oportunidade”, destaca.
O CEO explica que além do Brasil, a COP também espera desenvolver outros projetos de eólicas offshore na América Latina, em países como Chile e Colômbia.
O mais avançado está na cidade colombiana de Barranquilla, com 350MW.
Segundo o executivo, o país vizinho saiu na frente do Brasil na questão regulatória.
“Estamos atrasados. Mas a vantagem do Brasil é ser um país grande com uma economia com demanda de energia muito alta. Esse projeto de Barranquilla é de grande potencial, mas nada comparado ao nosso potencial brasileiro para eólicas no mar”.
Por lá, ele espera que o projeto comece a operar entre 2025 e 2026. Já o primeiro projeto no Brasil, considerando o marco regulatório ponto ainda em 2022, deve operar apenas em 2027.
Requisitos para evitar aventureiros
Nóbrega também defende que dentro do marco regulatório deve existir algum mecanismo para evitar a entrada de empresas “aventureiras”, que não possuem capacidade de captação de recursos no mercado, e que estejam apostando na venda de outorgas de maneira especulativa.
“A gente quer eliminar isso e o governo federal já aceitou essa ideia, de eliminar o risco de aparecer os aventureiros inspirados”.
“Não é só pelo dinheiro e nem é só pra quem chegar primeiro e pegar. Tem que incluir a expertise. É isso que a gente defende”.
O decreto fala na possibilidade de o governo descartar projetos especulativos.
“Se essas empresas fazem um projeto pequeno sem expertise de nada, sem dinheiro nenhum no bolso e diz isso ‘aqui agora é meu’, depois vão querer vender esse projeto por quinhentos milhões ou um bilhão de reais”.
Segundo o executivo, é salutar evitar a concentração de projetos em grandes empresas, com grande estrutura financeira, como as de óleo e gás.
“Isso só vai onerar os projetos e vai eliminar todo mundo que é pequeno e médio e criar um mercado para os deep pockets, analisa Nóbrega.
Para ele, um dos requisitos de corte poderia ser os investimentos iniciais nos estudos de viabilidade de projetos offshore, uma vez que demandam altas cifras e indicariam o real interesse dessas empresas em investir no negócio.
Segundo o executivo, o tempo de desenvolvimento de um projeto offshore é em média de dois anos e varia entre US$ 50 milhões e US$ 100 milhões.
“É um tempo e um dinheiro bem considerável. Então a gente não quer colocar cinquenta milhões de dólares sem ter regras claras”.
Se a companhia tem o intuito meramente especulativo, porque não tem cinquenta milhões de dólares, ela não vai ter um bilhão e meio de reais para comprar as turbinas”, afirma.