BRASÍLIA — A agenda para a redução do custo do gás natural para o consumidor final deveria concentrar o olhar sobre a dinâmica concorrencial da oferta, defende o vice-presidente de Mercado de Gás para América Latina da Rystad Energy, Vinícius Romano.
“Existe essa interpretação de que o preço do Brasil hoje está caríssimo, que ele está errado porque cada um desses entes da infraestrutura estão colocando preços abusivos. Mas, mesmo ‘corrigindo’ ou mudando essa precificação, o que deveria definir o preço negociado no Brasil deveria ser esse ponto de concorrência”.
“A minha visão do que seria um preço correto ou um preço justo é uma tradução das fontes de gás que o país tem”, afirmou ele, ao participar de live do estúdio eixos durante a gas week 2025. Assista a entrevista na íntegra acima.
Romano pontua que o custo final do gás reflete aspectos como a dinâmica da competição e fontes de suprimento, por exemplo, e não só o custo de acesso à infraestrutura. E faz ressalvas ao debate sobre a remuneração justa dos ativos de escoamento e processamento, pautado pelo governo.
“Muitas vezes são criadas ações desmembradas e se acredita que elas vão trazer uma redução de preço ao mercado, mas não necessariamente”.
Menos imposição, mais negociação
Ele acredita que a discussão sobre a remuneração dos ativos de escoamento e processamento deveria seguir a lógica da negociação, para aprimorar o modelo de compartilhamento das infraestruturas no Brasil.
“A gente tem que entender que esses ativos, eles foram feitos pensados por quem tomou a decisão, o risco e o investimento. Então, eu acredito que o caminho para chegar num consenso não seja algo impositivo, não seja uma regulação sendo imposta a esses agentes, até porque na Lei do Gás menciona que esses ativos não seriam regulados”
Essa discussão, acrescenta Romano, reforça a importância do planejamento integrado da infraestrutura.
“Porque aí você garante que os objetivos das diferentes empresas vão ser atendidos com informação, com o consenso do mercado”.
Estabilidade de regras para novos projetos
Ele também cita o debate sobre a reinjeção. Acredita que a premissa de aumentar a oferta é uma “premissa interessante” para ajudar a baratear o gás.
“Mas talvez os caminhos para se fazer isso é que estão sendo discutidos de uma maneira um pouco mais agressiva”, ressalvou, em referência aos dispositivos do novo decreto da Lei do Gás que abrem caminho para revisão dos índices de reinjeção dos projetos de óleo e gás.
Segundo Romano, os agentes do setor de upstream fazem uma avaliação de risco e retorno baseadas nas regras vigentes no momento da decisão de investimento.
Um modelo saudável, de acordo com o vice-presidente da Rystad, seria garantir a estabilidade e condições de mercado claras para que mais empreendimentos, como o projeto Raia, por exemplo, possam ser aprovados.
“Recentemente, a gente teve a decisão de Gato do Mato postergando a decisão do gás, e eu não tenho dúvidas de que os conflitos que estão se passando agora influenciaram na decisão da Shell. Ao mesmo tempo que a gente está discutindo nós queremos mais investimento no país, a gente também está colocando que esses investimentos podem ter a regra mudando depois que você já tomou a decisão”, considerou.
Gás da União
Romano comentou também sobre as perspectivas em torno do primeiro leilão de gás da União, pela Pré-Sal Petróleo (PPSA).
Ele não acredita que, segundo a lógica dos leilões de petróleo da União, esse gás chegará ao mercado a um patamar disruptivo de preços.
‘Por que a União venderia esse gás a US$ 2 o milhão de BTU [preço negociado na boca do poço] se o mercado hoje está pagando algo entre US$ 9 e US$ 10? Seria também uma destruição de valor para o gás da União”, avaliou.
A não ser, ressalva, que a opção do governo seja criar uma política de venda de gás a preços diferenciados para setores estratégicos específicos, como o de fertilizantes.
“Seria também uma destruição de valor para o gás da União. Seria uma forma de beneficiar alguns poucos agentes que teriam acesso ao gás, enquanto outros ficam de fora simplesmente porque o volume é limitado”, comentou.