A Potigás entrou em 2020 com uma redução de quase 10% na tarifa do gás natural distribuído no Rio Grande do Norte, após a renegociação do contrato com a Petrobras. Mesmo com a tentativa frustrada de pulverizar a compra de gás no estado, a presidente da Potigás, Larissa Dantas Gentile, está otimista que com o acesso de novos produtores à infraestrutura da Petrobras, em 2020.
“A expectativa de redução futura se dá principalmente por essa entrada de novos fornecedores nos campos produtores, nos campos maduros, que foram desinvestidos pela Petrobras, como por exemplo o Riacho da Forquilha, adquirido pela Petrorecôncavo [Potiguar E&P] e a área de Macau, adquirira pela 3R [Petroleum]”, explica a executiva.
Em 2019, a companhia conseguiu, por meio de renegociações com a Petrobras e com a chamada pública aberta para contratar gás natural, dua reduções consecutivas de 2,8% e 7%, entrando em 2020 com quase 10% de desconto no combustível.
Essa negociação envolveu a redução do despacho, dada a queda na demanda por gás natural no estado – em 2018, a Potigás consumiu, em média, 318 mil m³/dia, caindo para 295 mil m³/dia até outubro de 2019, uma redução de 6,8%. A companhia não tem demanda termoelétrica.
“Conseguimos ir na Petrobras, conversar e habilitar nosso contrato para que a gente não pagasse a multa e os consumidores não pagassem esse pato. Foi engenharia financeira, com um trabalho de equipe alinhada, em o que estamos chamando aqui de uma “guerra contra o preço do gás”, afirma.
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Sem plano de privatização
Em relação à privatização da distribuidora, Larissa Gentile nega que haja planos e entende que o caminho natural do estado para ter acesso aos benefícios do governo federal previstos no Plano Mansueto, de recuperação fiscal dos estados, é aderir aos outros pontos do Novo Mercado de Gás. “Cada caso é um caso, mas aqui não tem ambiente para privatização”.
Mesmo assim, Larissa Gentile defende que haja concorrência no estado e abertura para o mercado livre de gás natural. Na visão da executiva, a Potigás deve ser um vetor de desenvolvimento do Rio Grande do Norte, o que implica, o que implica na defesa da redução de barreiras.
“Eu não sou a favor da privatização da Potigás, porque estou dentro e vejo o trabalho, como um vetor de desenvolvimento, e, modéstia à parte, a equipe é muito boa. Mas não podemos deixar o mercado só pra gente ou querer passar um projeto de lei estipulando mercado livre com 500 mil metros cúbicos, isso não existe”.
Leia a entrevista completa
Como a Potigás conseguiu reduzir o preço do gás no Rio Grande do Norte?
No início do ano [2019] todas as concessionárias se juntaram para fazer uma chamada pública. Aqui no Rio Grande do Norte, tivemos o maior número de ofertante do produto, o que surpreendeu. Foi a Shell, a própria Petrobras, Petrorecôncavo e até mesmo algumas que não foram habilitadas, por falta de documentação. Mas no final, quatro empresas foram habilitadas para fornecer o produto.
Mas a Petrobras ainda tem o domínio do transporte. Não tem como a Petrorecôncavo, por exemplo, que já criou uma empresa, está funcionando, a Potiguar E&P, fornecer gás. Então ela vende para a Petrobras, porque ainda não tem acesso aos gasodutos.
A expectativa de redução futura se dá principalmente por essa entrada de novos fornecedores nos campos produtores, nos campos maduros, que foram desinvestidos pela Petrobras, como por exemplo o Riacho da Forquilha, adquirido pela Petrorecôncavo [Potiguar E&P] e a área de Macau, adquirira pela 3R [Petroleum].
O movimento de desinvestimento da Petrobras no Nordeste, o desinteresse dela continuar no gás ficaram muito claros nas reuniões que eu tive na estatal, ano passado. Eles querem facilitar a nossa vida para o Novo Mercado de Gás, porque é o que está no plano da empresa.
Essa oferta do produto, pela lei natural do mercado, vai diminuir o preço. Escutei uma frase da Simone [Araújo], diretora do Ministério de Minas e Energia, que não existe gás mais barato do que o onshore. O custo é apenas do tratamento, quase não tem custo de transporte.
Para esse [preço] atual, foi realmente uma confluência de fatores. O país já pedia essa diminuição do preço do gás, e quando houve o lançamento do Novo Mercado de Gás, as chamadas públicas já estavam em curso. Parte do preço da Potigás veio diretamente da redução de 10% na molécula pela Petrobras. Acaba sendo realmente a única fornecedora, não tem mistério. Pra gente foi bom, uma boa notícia.
Então a redução foi mesmo por parte da estatal…
Sim. Esse valor mais baixo ficou em 7% no preço final aqui na nossa empresa. No último trimestre de 2019, tivemos aqui uma saída da indústria e do consumo, mas já tínhamos contratado um volume com a Petrobras.
Conseguimos ir na Petrobras, conversar e habilitar nosso contrato para que a gente não pagasse a multa e os consumidores não pagassem esse pato.
Foi engenharia financeira, com um trabalho de equipe alinhada, em o que estamos chamando aqui de uma “guerra contra o preço do gás”. Juntou o [corte] de 2,8%, que a gente conseguiu no último trimestre, com os 7% e ficou 9,8% menor neste ano [2020].
Para o GNV, entregamos na bomba com 16 centavos a menos… É um preço bem significativo. O GNV tem um impacto social bem bacana, principalmente para o motorista de aplicativo. Mas isso tudo com o objetivo de atrair mais indústria para o Rio Grande do Norte, porque uma das missões da Potigás é ser também um vetor de desenvolvimento.
Tem alguma previsão de quando será possível contratar com outras empresas?
Olha, a reunião que tivemos na Petrobras foi que a previsão seria novembro, para que os novos exploradores da molécula possam acessar os gasodutos. Mas está meio desalinhado a questão do modelo de entrada e saída, que está sendo elaborado pela ANP.
Por exemplo, a Potiguar E&P contrata com a transportadora a entrada da molécula e a Potigás contrata na saída e esse preço do transporte vai vir embutido no preço da Potiguar E&P, que eu vou retirar no meu citygate, para a distribuição na minha rede.
Estamos esperando a Petrobras alinhar com a ANP e as transportadoras para que isso funcione. A Potiguar E&P já está funcionando e, se não for a primeira, deve ser a segunda no Rio Grande do Norte. Temos muita pressa. Vai ser um preço muito melhor do que a gente compra da Petrobras.
Existe alguma estimativa dessa desconto?
Tem, mas eu não posso adiantar porque temos um termo de compromisso sigiloso. É muito bom. Se tiver aumento com essa conflito entre EUA e Irã, pode ser meio ofuscado, mas mesmo assim vai ser bom. Hoje, a gente compra da Petrobras por cerca de US$ 12 por milhão de BTU e a gente consegue um valor bem menor. Eles vendem isso para a Petrobras já porque não tem onde colocar, mas a Petrobras nos vende mais caro.
Podemos dizer, então, que mesmo com a possível variação de preço internacional, o cenário é de redução nos preços?
Sim. Temos Sergipe, que é concorrente, por exemplo, mas é outro tipo de gás. Temos muita oferta de óleo e gás onshore e isso tem nos acalentado. Temos acompanhado novos empresários na expectativa de que esse gás chegue no downstream. Quanto maior a oferta, mais baixo ficará o preço. Com isso, a tendência é aumento do consumo.
O Rio Grande do Norte vai aderir ao Novo Mercado de Gás? Alguns estados já estão…
Sim, fizemos o dever de casa. Das premissas do Novo Mercado de Gás, estamos tentando concluir algumas. Toda a parte de regulação, não tinha na legislação estadual. Preparamos um projeto de lei, já pronto, mas não deu tempo aprovar no fim do ano passado. Deve ser avaliado pelos deputados na volta agora em fevereiro. Já temos também órgão regulador estadual funcionando.
Um dos pontos é a privatização das distribuidoras.
Acho que a Potigás não deve ser privatizada. Até porque, como o estado está desaparelhado e sem estrutura, acaba que a Potigás tem mais agilidade para atuar nessa missão, como vetor de desenvolvimento. Cada caso é um caso, têm estados onde faz sentido, talvez, a privatização.
Claro que estou falando com um pouco de parcialidade, mas não vemos sentido nisso. Vamos preencher as outras premissas do Plano Mansueto, para que a gente possa aderir. Eu não sou política, sou técnica e meu convite foi técnico, mas a governadora [Fátima Bezerra (PT)] tem dado muito apoio ao trabalho da gente. Acho que aqui não tem ambiente para a privatização.
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Qual mercado pode ser desenvolvido no estado com a abertura para o consumidor livre de gás?
De imediato, a questão de haver uma regulação para que exista o consumidor livre já é muito simpático para os investidores. Dez mil m³ por dia não é um consumo muito alto, mas pode ser o de uma fábrica, por exemplo. Já vi caso no Ceará de uma usina de geração de biogás, em que eles tinham como consumidor único uma fábrica de cerâmica.
A princípio fica parecendo que é um tiro no pé da concessionária não é? Mas eu sou muito a favor que o mercado se autorregule. Se há uma empresa que pode fornecer direto para o consumidor, por um preço melhor, por que não?
A Potigás que dê seus pulos para atender melhor o cliente, que não teve preço competitivo para vencer aquela concorrência. Como Potigás, estamos preparando equipe nesse sentido para o real mercado. Não podemos ter a hipocrisia de criticar a Petrobras por ser monopolista e, por outro lado, querer que a gente fique sozinho.
Eu não sou a favor da privatização da Potigás, porque estou dentro e vejo o trabalho, como um vetor de desenvolvimento, e, modéstia à parte, a equipe é muito boa. Mas não podemos deixar o mercado só pra gente ou querer passar um projeto de lei estipulando mercado livre com 500 mil metros cúbicos, isso não existe.
Esse valor não é nem o consumo da Potigás por mês hoje em dia. Nosso projeto é um que vá propiciar realmente abertura de mercado. E esse pensamento já era nosso independentemente do projeto do Ministério de Minas e Energia.
A Potigás vai ter que rebolar nos próximos anos e eu acho isso muito bom, a gente sai da zona de conforto, com a vida como ela é, o real mercado.
[Nota: controlada pelo governo estadual, a Potigás tem como sócia a Gaspetro, subsidiária 51% da Petrobras e 49% da Mitsui. A Petrobras pretende vender toda as suas participações nas distribuidoras de gás]
E é viável fazer transição de indústrias para gás, com essa abertura?
O Rio Grande do Norte desponta como grande produtor de petróleo e gás onshore. Com essa oferta do produto, o consumidor livre vai ter preço competitivo e as indústrias, que tem na matriz energética o gás, vão ter uma competitividade diferenciada. Isso, pra mim, é o x da questão para o desenvolvimento do estado. Precisamos ter gás competitivo para que as indústrias fiquem e gerem riqueza aqui.
Vou te dar um exemplo: tem uma indústria têxtil, que desde do ano passado vem conversado com a gente sobre deixar de consumir. Recebemos eles para uma conversa técnica e eles vão mudar para biomassa. O processo deles é sujo, no sentido de que na hora que eles usam a biomassa, precisam limpar os equipamentos.
Mesmo assim, um equipamento que eles usam, necessariamente, precisa do gás natural, então não vão mudar totalmente a matriz energética. O gás natural é uma energia limpa e ela tem diferencial não só pelo uso como também na questão da descarbonização.
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